Elegia do medíocre
Vem Musa
Tocar-me ao de leve
Nem que seja por um segundo
Pois sei que fugirás de seguida
Enojada com a pequenez
Dos meus devaneios
Que como foguetes
Sobem até a um baixo céu
Explodem
E deixam apenas
Um rasto de fumo e pólvora no ar.
Aqui
Na noite que inspira
Na noite que revela
Apenas vejo a evidência
De não conseguir soltar
Senão gritos ocos
Onde o eco dos grandes hinos por nascer
Se perde na mediocridade do meu ser.
Felizes aqueles que possuídos por ti
Ó Musa da agonia
Jorraram mundos de inesgotável angústia
Onde todos os demónios da dor universal
Se conjugaram nas linhas negras que deixaram!
Felizes aqueles que possuídos por ti
Ó Musa da febre
Foram espasmos da natureza
Histeria epiléptica do sentimento
Ditirambos compostos pelo próprio Baco
E cantaram embriagados em vermelho
A euforia e orgia da vida.
Felizes aqueles que possuídos por ti
Ó Musa da harmonia
Criaram cenários de puro equilíbrio
Onde todos os sentidos se exprimiram
Onde todos os elementos participaram
Naquelas linhas de azul
Que cristalizaram mundos para os absorver.
E felizes todos aqueles
Que cantaram o sonho
As palavras
O amor
Porque dentro deles havia esplendor
Incêndios de chamas intermináveis
De sentidos e grandeza
Porque dentro deles estavas tu, Musa
E isso justifica uma existência.
Aqui
No meu marasmo pessoal
Eu me confesso
A lua e todo o seu pesar
Revelam a aridez do meu deserto interior.
E lentamente
A dor vai descendo
E vou sucumbindo
Ao bálsamo do sono e da desistência.
(Pedro Malta)
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