A Garganta da Serpente

Nietzsche

Friedrich Wilhelm Nietzsche
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O andarilho

Um andarilho vai pela noite
A passos largos;
Só curvo vale e longo desdém
São seus encargos.
A noite é linda -
Mas ele avança e não se detém.
Aonde vai seu caminho ainda?
Nem sabe bem.

Um passarinho canta na noite:
"Ai, minha ave, que me fizeste!
Que meu sentido e pé retiveste,
E escorres mágoa de coração
Tão docemente no meu ouvido,
Que ainda paro E presto atenção? -
Por que me lanças teu chamariz?" -

A boa ave se cala e diz:
"Não, andarilho! Não é a ti, não,
Que chamo aqui
Com a canção -
Chamo uma fêmea de seu desdém -
Que importa isso, a ti também?
Sozinho, a noite não está linda
Que importa a ti? Deves ainda
Seguir, andar,
E nunca, nunca, nunca parar!
Ficas ainda?
O que te fez minha flauta mansa,
Homem da andança?"

A boa ave se cala e pensa:
"O que lhe fez minha flauta mansa,
Que fica ainda?
O pobre, pobre homem da andança!"


(Nietzsche)


voltar última atualização: 11/09/2005
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