A Garganta da Serpente

Luiz Alberto Cavalcanti Filho

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ESTROFES DE UM INSONE

Madrugada. Sem sono e solitário,
Vou pela noite escura caminhando.
E passo a passo os grilos escutando,
A esmo sigo no lúbrico cenário.

Rosas vão, no meu triste itinerário,
de aromas o caminho perfumando;
malditas que me vão rememorando
teu cheiro no meu fúnebre calvário.

No negro firmamento, cintilantes,
milhões de estrelas, todas a luzir...
desgraçadas que a dor vêm me impingir
ao vê-las com teus risos semelhantes.

Dourada lua vejo neste instante,
na amplidão que nem ouro a reluzir;
infeliz que meu peito vem ferir
ao parecer teus olhos fulgurantes.

Meu rosto pelas lágrimas tomado,
na treva vem o zéfiro beijar.
tirano que me faz muito lembrar,
os teus beijos em mim outrora dados!

Sobre um telhado pássaro da noite
em busca de seu bem ouço cantar;
Que chamas o meu nome venho achar,
mísero que no som tem um açoite!

Por que lá no teu ser petrificado
de outrora aquele vasto e doce mar
de amor tu permitiste evaporar,
no teu peito fazendo-me finado?

Decretar o meu triste passamento
por que vieste no fundo de teu ser?
por que dentro de ti quiseste erguer
estandarte do duro esquecimento?

Não pode ter no mundo mais tormento
nem pode haver mais áspero sofrer,
do que dentro do nosso bem-querer
sofrermos o fatal falecimento.

Morrer, mas não morrer fisicamente,
morrer lá na lembrança, lá no fundo,
na vida ser proscrito de um mundo
em que antes era nosso unicamente.

Que morte se afigura mais ferina,
quando somos na vida relegados,
e pelo falso amor somos jogados,
na masmorra da dor que desatina?

Por isto sigo só nas altas horas,
da noite a respirar sutil frescor,
vou caminhando até que um novo amor,
no meu ser nascer faça a doce aurora.


(Luiz Alberto Cavalcanti Filho)


voltar última atualização: 05/11/2004
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