A Garganta da Serpente

Luis Melo

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Ao longe

Abro a janela.

Ainda a noite,
ou serão, talvez,
os olhos fechados,
a minha cegueira
ou um véu
de negrume
de não querer mais
a luz do dia.
Esse tirano galante
até que poderia
ser tão feminino
como o é a manhã.
No fundo,
não importa;
é indiferente

como as nuvens
que correm, frívolas
ao longo do horizonte
e tão casualmente
parecem brincar
na imensa amplitude
daquele faz de conta
de carrossel,

... ao longe,
e mais que longe
a revolver-se
o contrapeso da fúria
em campos lavrados
pelas garras
das mãos crispadas
do camponês.

Além, na lonjura
a perfilarem-se
as cercaduras
mais lógicas
que ecológicas,
facetadas e
talhadas do pinho
como que por
tesoura de manicura.

Bem ao longe
muito, muito longe,
na clausura bonitinha
dos canteiros do jardim
as flores frescas
e disciplinadas
a entreterem-se
denunciando as ervas
daninhas e embirrantes
às autoridades.

Ao longe,
mesmo a roçar
o meu horizonte,
fecho os olhos
no fim da noite
adormeço com ela
e ouço a manhã
espreguiçar-se.


(Luis Melo)


voltar última atualização: 14/09/2004
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