A Garganta da Serpente

José Luongo da Silveira

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VENTO MINUANO

"Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
"
(Fernando Pessoa).

Minuano, que invade estas coxilhas,
quanto do teu assobio magoado
são ecos distantes de um passado,
de patas de cavalos e tilintar de lanças,
ou brados de guerreiros que tombaram,
e errantes ainda galopam na voz do vento,
enfeitiçando assim estas paragens?

Onde a Província de São Pedro encontra
o solo castelhano, bem no sul do sul,
o vento teima em cavalgar a noite inteira,
junto a pampa dos heróis de tempo idos
as mesmas vozes se mesclam ao som do vento
miragens que assombram o quero-quero
e denuncia o viajor errante com seu grito.

Hirtas ermidas plantadas nas estradas,
cruzes perdidas em meio ao capinzal,
são vestígios obscurecidos pelo tempo
de tantas esfregas, guerras e revoluções.
Agora, em doce calma adormecem em terra nua
maragatos e chimangos descansam em solo amigo
e o minuano, este teimoso, quer trazer de volta
o vozerio encarniçado das peleias.

Minuano, quanto dos teus gemidos são o choro
abafado das mulheres, dos pais e filhos
de quem partiu para a guerra e não voltou?
Quantos homens e mulheres rezaram
mirando ao longe em cansativa espera?
Seus olhos se perderam nas distâncias,
e só tu continuas galopando campo a fora
varrendo o pranto dos que em vão confiaram,
viajando sempre em direção ao nunca mais.


(José Luongo da Silveira)


voltar última atualização: 06/02/2007
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