A Garganta da Serpente

Hugo Araújo

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A Hora de Clara

Nem pouco encantada a poeira
a quina entupia, encantoada
sim, e que margem? Que vista?
Acha-se acaso na sala uma beira?

No canto, portanto, chorava
A doce e um tanto amarga
larga e um tanto encolhida
Clara que o escuro manto cobria.

Sofria tanto de um nada, vazia
cavada, fossem ainda mãos brutas
mas nada! Uma pá sem senhoria
por si humanamente cravada.

Clara, na escuridão imiscuída
que se achava no menor espaço
a esperar de mísero amparo
um abraço quente da parede fria.

O que faria uma sala, no entanto?
Esvaziada senão porque guardava
em cada aresta peles de sujeira
e Clara na disputa reles pelo canto.

Rasteira, aos pés de um muro
Terminava de viver desta maneira
Sob fogo vão que mal clareia
De um lampião que o escuro amava.

Morte à vista, risca a veia
Clara em pranto, mas que vista?
Desde quando, seja sala ou peito
vazio impõe a alguém um corte?

Morria, porém, de um forte jeito
Cortada por si mesma enquanto
A meia-luz fraquejava o mesmo tanto
Que na poeira suspirando Clara se apagava.

(09/12/2003)


(Hugo Araújo)


voltar última atualização: 18/06/2004
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