A Garganta da Serpente

Eric Ponty

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Interlúdio da Consumição das almas penadas
(motivo sobre foto de Sebastião Salgado)

Não sonham com a terra. Nada na terra.
Não sonham com nada.
As crianças aladas e pobres dos êxodos.
Sonham em ter asas, e as trazem consigo
quando nascem às seis da manhã de parto
por sorte, mas desnutridas no corpo,
neste corpo roí e corrói unicórnios
criatura talhada com a face da virgem lua
brilhante iluminada no final da tarde
quando partem a cavalgar horizontes.
Não sonham com a terra. Nada na terra.
Não sonham com nada.
As crianças aladas e pobres dos êxodos.
São anjos não tem batismo ao certo
nem conhecem o que seja pessimismo
são santas apostólicas sem qualquer altar
seguindo enfileiradas pelas estradas
sussurram consigo quem sabe orações
não lhe apercebem o cânone do sentido,
apenas murmuram folha quando
de levem cai sobre a paisagem de outono.
Não sonham com a terra. Nada na terra.
Não sonham com nada.
As crianças aladas e pobres dos êxodos.
Não sonham construções ou mesmo casas,
não possuem na alma um eu profundo latente
desconhecem os milagres da bolsa de valores
desconhecem as lições de Heráclito e Platão,
porém aladas não se esquecem de nada, e,
ainda ontem desenterram o menino, porque ainda
este chorava lembrando-se do sol, logo silenciou,
e retornou ao silêncio da noite de sua habitação.
Não sonham com a terra. Nada na terra.
Não sonham com nada.
As crianças aladas e pobres dos êxodos
apenas sorriem ao olvido.


(Eric Ponty)


voltar última atualização: 10/08/2007
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