OBITUÁRIO
(para Mário de Sá Carneiro)
Atiraste do Penhasco
só por causa de
um fracasso
mal soubeste
cabra da peste
que tudo
foi
em vão
Então, por que
se apoiasse na razão?
Ao invés de sentir
tua intuição?
Não pensastes em ter
ima outra opinião
Não buscaste ser
dono do seu coração?
Além das noites
e dos dias
e da agonia
mais Sombria
Sempre haverá uma poesia
Mas atropelaste a necessidade
de viver para se criar
Em nome da efemeridade
e se deixar morrer
e se levar
Por uma angústia
que nem era sua
Por uma culpa
que não era sua
Mas a morte
que beijou
era realmente
a tua
Triste e inevitável fim
Não precisava ser assim
Poderia ser uma orquídea
Ou mesmo um jasmim
ou quem sabe
a mais bela
entre todas as flores
do jardim
Mas precipitou-se
no precipício
Talvez fosse melhor
que o hospício
Por que não esperou
pelo solstício
ou tentou lutar
contra o vício
deste seu amargo
suplício?
Quem saberia
não mais saberá
Pois pela tristeza
se deixou levar
Talvez acerte as contas
com o carcará
O certo é que agora tens
Toda a eternidade para se lamentar
Mas era mesmo preciso
pelo penhasco se atirar?
Do alto do despenhadeiro
para abaixo do chão
Além do inferno,
das Trevas
e da escuridão?
Colheste o desespero
semeado pela consternação
Tamanha a sordidez
do seu ato
diante do desfecho
de sua aflição
Mesmo sorumbático e macambúzio
Não me deixo mais levar
é bem verdade que até já tentei
Em algumas ocasiões
Mas um não
veio me salvar
E que só fui entender
uma década mais tarde
que não precisava
ser covarde
Mas bastaria seguir
e fazer cumprir
o sonho que foi
Concedido
E quando a derradeira
Hora chegar
saber que mesmo
abatido, ferido
Haveria de ter vivido
e sentido
Cada momento,
Tormento
e se emocionado
com o sopro do vento
que assobia
uma melodia,
uma música
feita por palavras
conhecida
como poesia
(Carlos Pompeu)
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