A Garganta da Serpente

Carlos Pompeu

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OBITUÁRIO

(para Mário de Sá Carneiro)

Atiraste do Penhasco
só por causa de
um fracasso
mal soubeste
cabra da peste
que tudo
foi
em vão

Então, por que
se apoiasse na razão?
Ao invés de sentir
tua intuição?

Não pensastes em ter
ima outra opinião
Não buscaste ser
dono do seu coração?

Além das noites
e dos dias
e da agonia
mais Sombria

Sempre haverá uma poesia

Mas atropelaste a necessidade
de viver para se criar
Em nome da efemeridade
e se deixar morrer
e se levar

Por uma angústia
que nem era sua
Por uma culpa
que não era sua

Mas a morte
que beijou
era realmente
a tua

Triste e inevitável fim
Não precisava ser assim
Poderia ser uma orquídea
Ou mesmo um jasmim

ou quem sabe
a mais bela
entre todas as flores
do jardim

Mas precipitou-se
no precipício
Talvez fosse melhor
que o hospício

Por que não esperou
pelo solstício
ou tentou lutar
contra o vício
deste seu amargo
suplício?

Quem saberia
não mais saberá
Pois pela tristeza
se deixou levar

Talvez acerte as contas
com o carcará
O certo é que agora tens
Toda a eternidade para se lamentar

Mas era mesmo preciso
pelo penhasco se atirar?
Do alto do despenhadeiro
para abaixo do chão

Além do inferno,
das Trevas
e da escuridão?

Colheste o desespero
semeado pela consternação
Tamanha a sordidez
do seu ato
diante do desfecho
de sua aflição

Mesmo sorumbático e macambúzio
Não me deixo mais levar
é bem verdade que até já tentei
Em algumas ocasiões
Mas um não
veio me salvar

E que só fui entender
uma década mais tarde
que não precisava
ser covarde

Mas bastaria seguir
e fazer cumprir
o sonho que foi
Concedido

E quando a derradeira
Hora chegar
saber que mesmo
abatido, ferido
Haveria de ter vivido
e sentido

Cada momento,
Tormento
e se emocionado
com o sopro do vento

que assobia
uma melodia,
uma música
feita por palavras
conhecida
como poesia


(Carlos Pompeu)


voltar última atualização: 07/10/2010
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