FLOR-DE-CERA
Lembro-me daquele tempo
em que a vida passava tão cheia de desejos
e a expectativa do amanhã era tudo
Eu vivia cada dia pelo amanhã
que não chegava
e os sonhos, ansiedades e incertezas
se acotovelavam num redemoinho
absorto de coisas tão inúteis
e tão boas
Hoje estranhamente o futuro se faz presente
e era tão bom o passado
aquela alegria ingênua que brotava do quase nada
meus olhos vagueando pelo depois
se encantava com a possibilidade
de que delírios infantis se metamorfoseassem
em uma penca de flores-de-cera
enfeitando a vida que acontecia
sem que eu pudesse perceber
Não tive tempo de olhar para o hoje
saborear o jeito doce e meigo do agora
acariciá-lo e senti-lo
num cafuné risonho de quem brinca
como um siamês entre novelos de lã.
(Anna Jacinta)
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