GRADIVA
Sem precisar estar em Pompéia
na cálida e sagrada hora dos espíritos
vemos seu espectro
(eu e um lagarto imaginário
que foge assustado
interrompendo o banho de sol
na escadaria)
Breve aparição
borboletas-mensageiras do Hades
logo lhe chamam
Resto só, diante de ruínas
(externas e as minhas)
a ouvir o pio sardônico de um corvo
(não mais trinados de canários na gaiola)
e um fiapo de razão me faz pensar:
alucinação
fantasma do meio-dia
ou você em carne e osso? (uma terceira via)
Chamo meu próprio nome
tentando acordar
desse sonho
sempre o amor como mosca
a zunir na cabeça da gente
Gradiva sou eu, agora
a jovem que avança
ainda que em direção ao passado:
arqueóloga da mente
Passo em revista as lembranças
na esperança
de assim continuarmos vivos
inútil paisagem
a visão real de um ramo de flores
fúnebres
logo interpreto como mau augúrio
(Um poema cut-up do estudo psicanalítico de Freud sobre
a Gradiva de Jensen)
(Ana Guimarães)
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