NÃO ÉS TU
Era assim tímido êsse olhar,
A mesma graça, o mesmo ar;
Corava da mesma côr,
Aquela visão que eu vi
Quando eu sonhava de amor,
Quando em sonhos me perdi.
Tôda assim; o porte altivo,
O semblante pensativo,
E uma suave tristeza
Que por tôda ela descia
Como um véu que lhe envolvia,
Que lhe adoçava a beleza.
Era assim; e seu falar,
Ingênuo e quase vulgar,
Tinha o poder da razão
Que penetra, não seduz;
Não era fogo, era luz
Que mandava ao coração.
Nos olhos tinha êsse lume,
No seio o mesmo perfume,
Um cheiro a rosas celestes,
Rosas brancas, puras, finas,
Viçosas como boninas,
Singelas sem ser agrestes.
Mas não és tu... ai! não és:
Tôda a ilusão se desfez.
Não és aquela que eu vi,
Não és a mesma visão,
Que essa tinha coração,
Tinha, que eu bem lho senti.
(Almeida Garrett)
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