A Garganta da Serpente

Adriano Menezes

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NO MEU CASO

1

Lembrar você no meio do dia
é lembrar a carne e um espírito
meu fazendo raso o peito.
Desvio teimoso, alma
assoreada despejada curta
no encontro arenoso da lida
real mista no dia fantasma.
Ouvir a voz de deus melando
os quadris como um terceiro
lábio propondo a fala em braile
diante da porta de ferro e a farpa
delirante, fenda pingando
entre estranhos ares: o corpo
da mulher de deus estendido
no silêncio negro do amor
sem mim, condicionando
o gancho podre dos encontros
à outro beiço, que beija a lua.

2

O corpo caluniado
com que buscas contato
é raso e de peso circunstante,
anda sem luz
dentro da noite
e jamais encontra o tom
da música de equívocos
que o vento mistura
na reserva dos sentidos.
Agora é idéia
à tremer na pele
improvisando
inexplicável saudade.

3

A crosta que permeia
a cidade,
lisa e postiça
cessa no calçadão, ali
espera um oceano, em linha,
onde estendo
o sem entendimento,
desperdiçando a tarde
e o primeiro ímpeto de mergulho.
Vieses e trote em
falsete na areia.
Horizonte liso
sobre crácas.

4

               Na madorna
o som distante do jogo
no radinho repõe em mim tudo
que existe. É uma hora
crédula arrancada do peito.
em pinceladas dominicais,
facadas na rede, no tempo.
Minha carne amarrota
a fina membrana
que emenda o corpo no dia.

5

Vigia tua mão senhora sempre
visto os olhos incontinentes
e o sucesso de estarmos sós.

Por trás das cordas o corpo
derruba no sol
e no cimento da data
uma gota bêbada que só
merecia mesmo ser vapor,
que veio só dizer: calor, acaso.

6

Sê a hora derrubada
               dos limpos,
o contágio no vapor
da fala. Recupera
a marca humana,
ilustração do lucro
no vento forte
dos corações horizontais
pelos sumidouros
           de ilusões.
Só o longevo embaçamento
das vidraças te encaminhará
para a sucessão de guichês
que trama tuas esperas.
Anda com teus sonhos
até que a repetição
dos gozos te ensine o corpo
             ao te ignorar o oco
                           do tronco.
Sê a assepsia branca
que te passará a limpo
tão logo acordes.


(Adriano Menezes)


voltar última atualização: 05/01/2010
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