A Garganta da Serpente

Anibal Beça

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FOLHAS DA SELVA

Girassol na tarde
se curva em reverência:
o sol se vai.

Abre o camponês
sulcos de arado na terra.
Em seu rosto rugas.

Seis hora da tarde:
sons de cigarras prolongam
os sinos do templo.

Cochicho de folhas.
Varre o vento na calçada
secas lembranças.

Bem que me agasalho.
Galhos sem folhas lá fora
parecem ter frio.

Noitinha na várzea:
com a lua na garupa
búfalos regressam.

Ao sol na vereda
o ventre inchado em rodilha
jibóia a jibóia

No alto a lua fria;
no prato a sobra da janta:
beiju desprezado.

Canto e contracanto:
o pica-pau reclamando
do som do machado.

Na soleira do sítio
a negra graúna canta
ao silêncio do sol.

Broca no bambu
deixa furos vazados:
O vento faz música.

Céu de primavera.
Nas açucenas floridas
dura mais o orvalho.

Jogando a tarrafa
caboclo desfaz a lua.
Pesca estrelas de escamas.

Abro o armário e vejo
nos sapatos meus caminhos.
Qual virá comigo?

Vento de verão
vem com bafo de mormaço —
garoa ameniza.

Coruja na cumeeira
arrepia no seu canto —
a viúva reza.

Folha no rio
vai para o mar sem volta —
chorão se renova.

A cigarra canta
o anúncio de sua morte —
formigas na contra-dança.

Sobe a piracema —
ano que vem outros peixes
nadarão de novo.

Apenas um gesto
e o homem é capaz de vida —
reparto o caqui.


(Anibal Beça)


voltar última atualização: 01/09/2009
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