A Garganta da Serpente
Entrevista com Cobra entrevista com nossos autores
Entrevista com:

Michel Laub

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- Michel Laub -

Entrevista concedida a Rodrigo de Souza Leão nosso habitante para o Balacobaco


Meu currículo é breve: nasci em Porto Alegre (1973), formei-me em direito (UFRGS) e estudei jornalismo (não completei o curso: um dia completo). Fui advogado durante um curto período e me mudei para São Paulo para ser editor de livros e cinema da Bravo. Antes, no jornalismo, escrevi por dois anos para as revistas Carta Capital e República, além de outras publicações.

No conto FíSICA E FILOSOFIA você fala de si e de sua geração. Os escritores contemporâneos têm qualidade ou só as gerações passadas sabem o que é literatura? A geração que está para além dos cinqüenta é a gora da intelectualidade brasileira de todos os tempos?
Claro que os escritores contemporâneos têm qualidade. Só que, na literatura, as coisas demoram um pouco para acontecer - tanto em termos de maturidade artística quanto de reconhecimento -, o que dá essa impressão de marasmo geral.

De qualquer forma, há ótimos nomes na faixa dos 25 anos aos 50, digamos assim, o que seria uma geração mais ou menos "nova".
"(...)interpretação é o sangue do vocalista, a jugular visível a distância". O estilo é o sangue do escritor? Existe alguma correspondência?
O estilo pode ser o sangue, os músculos, os ossos, qualquer metáfora do gênero serve. Obviamente que é algo imprescindível, mas não é tudo na literatura. Aliás, o que mais há são escritores com estilo que não têm o que dizer.
"passei a agradecer aos céus por não ter publicado nada." Não é meio difícil saber o que publicar e quando? Como diz um amigo, quem publica é vaidosa e quem não publica é mais vaidoso ainda. Concorda?
Até posso concordar, mas essa não é a principal questão. Saber quando publicar é difícil, mas o pior é conseguir publicar. Ninguém quer financiar iniciantes - caso do personagem - hoje em dia.
O fenômeno Paulo Coelho tem alguma explicação racional?
Claro: o fato de as pessoas gostarem de ler Paulo Coelho. Por que você gosta de um autor? Há motivos psicológicos, históricos, sociológicos etc., etc. - o que há no caso dele, evidentemente. Todos esses motivos já foram repetidamente analisados por jornalistas e intelectuais. De minha parte, acho ótimo que um autor venda tanto, pois aquece o mercado e ajuda a difundir, de alguma maneira, o hábito da leitura. Em tempo: não li Paulo Coelho e não poderia entrar no mérito se é "bom" ou "ruim".
Alguma das características da arte moderna viraram uma bengala. Na literatura, a utilização do fluxo de consciência não é uma destas bengalas?
É, mas não a única. Nada é novo em literatura, então tudo é "bengala", inclusive o diálogo, o monólogo interior, o discurso direto etc., etc. A questão é como saber usar essas bengalas.
"Pessoas que cantam pela manhã, informo-o, são como passarinhos: difícil de serem aprisionadas." O homem não busca uma prisão, um alçapão estético, filosófico que o defina?
Talvez... O trecho em questão, do conto "Morando Longe", não é nada filosófico ou metafísico: é apenas uma pista sobre a identidade do narrador.
Qual personagem merece nome em seu conto?
Alguns têm nome: Denizard, Salim e outros. Os nomes não têm importância para mim: não sou um adepto desse recurso, aliás muito comum hoje em dia (referências bíblicas, literárias etc.).
Faltou algum contista no livro do professor Italo Moriconi OS CEM MELHORES CONTOS BRASILEIROS DO SÉCULO XX?
Faltou o Guimarães Rosa, evidentemente, mas por questões de direitos autorais. Em termos de nomes, foi uma boa seleção. Discordo, mas isso é puramente pessoal, da escolha de alguns contos e do espaço demasiado ou mínimo dado a alguns deles.
Quais são as dores e as delicias de trabalhar na revista Bravo?
As dores, além do fato de trabalhar, o que eu não faria se tivesse como viver de rendas, são algumas inimizades devidas ao "estrito cumprimento do dever", como diria o Código Penal. Não dar espaço a um livro ou a um filme, por exemplo, mesmo quando não é uma decisão do editor, acarreta esse tipo de reação. Uma crítica negativa, mesmo assinada por alguém reconhecido, é, na visão do criticado, responsabilidade "da revista" (conseqüentemente, do editor). Mas não há o que fazer, isso é parte do jogo.

A delícia é fazer um produto caprichado, que tem falhas, claro, mas jamais é concebido com desleixo ou sob pressão de quem quer que seja.
Como utiliza a internet?
Como fonte de pesquisa, leitura e comunicação, basicamente.
Tem alguma epígrafe que o acompanhe?
Não que eu lembre. Aliás, não uso epígrafes no livro. No romance que estou escrevendo, vou usar uma do Raduan Nassar.
Qual o papel do escritor na sociedade?
Escrever. Não acredito, sinceramente, que a arte mude a vida de ninguém. Parafraseando um amigo sábio - e contestando o igualmente sábio Harlod Bloon -, a oscilação de um ponto no índice Dow Jones tem mais relevância que toda a obra de Shakespeare...

(2002)

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