Acho que no começo eu estava mais perto da história e agora tenho usado mais a imaginação. No Chalaça, uns 70% dos fatos aconteceram, no Terra Papagalli esse número foi para uns 30% e agora, com o Ira, deve ter baixado para uns 10%. O Pequeno Dicionário Amoroso não é exatamente um livro, ou pelo menos, certamente não é literatura, e o "Santos, um time dos Céus" é um caso à parte."Terra Papagalli" é uma criação a quatro mãos. É o seu livro mais maduro, equilibrado?
Não sei se o mais equilibrado, mas é o meu favorito. Ele possui um humor mais sutil -às vezes até invisível, como no caso de um falso dicionário de tupi que há lá dentro- e seu personagem principal, o Bacharel da Cananéia, é mais complexo que o Chalaça, Brás Cubas dos Santos (de "Santos, um time dos céus") ou o Soldado (de "Ira-Xadrez, truco e outras guerras").Como é o seu processo de criação?
Eu escolho o assunto, por exemplo, descobrimento, e começo a ler sobre ele. Durante essa leitura vou montando a história e, antes de começar o livro já sei, ou penso que sei, como ele será. Então faço uma escaleta, uma espécie de roteiro com o resumo de cada capítulo ou parte do livro, e só aí começo a escrever (é claro que essa escaleta não deve ser uma camisa de força, mas sim um mapa muito útil). Depois reescrevo tudo algumas vezes, passo o texto para leitores-amigos, escuto as sugestões e faço a versão final.Quais as sensações que tem quando escreve?
Acho divertido. Principalmente refazer os textos.O filão do romance histórico não está se tornando algo pernóstico à literatura brasileira?
Acho que ainda não. Talvez daqui a dois anos sim, haja uma overdose de títulos sobre o descobrimento.Você prefere escrever sobre encomenda?
Não, é claro que prefiro escrever livremente. Porém, se a encomenda for interessante, como por exemplo, escrever sobre as Copas do Mundo para a revista Placar ou sobre o Santos F.C., não vejo problema nenhum, é até bem divertido. O caso do "Ira" também foi interessante, porque pude escolher o pecado e qual a forma de falar sobre ele. Assim a encomenda quase não foi uma encomenda, mas a sugestão de um tema.Como vê a internet? O livro vai acabar?
Acho bacana mas não sou um deslumbrado. Leio pouco no computador e sou um tanto preguiçoso para navegar. Talvez, para mim, a internet seja mais um bom correio. Quanto ao livro, talvez acabe, mas não por causa da internet, e sim pela falta de leitores. No Brasil, hoje, acho que não há mais de um milhão de leitores. E se pensarmos numa literatura um pouco mais alta, nem cem mil.O que leu e lê? Do ponto de vista estilístico, qual o autor que mais influenciou a sua forma de escrever?
Li muito gibi na infância e histórias juvenis na puberdade. Hoje, meu favorito é Machado de Assis. Também gosto do Saramago, dos Veríssimos (pai e filho), do Kurt Vonnegut e do Guimarães Rosa. Quanto às influências, acho que são Machado de Assis, Luís Fernando Veríssimo, Lawrence Sterne e Xavier de Maistre.Você é jovem e bem sucedido. Não seria melhor ter escrito sobre a inveja?
O Zuenir Ventura, que foi o primeiro a escolher o pecado sobre qual escreveria, já tinha escolhido este pecado. Como isso provocou-me ira, fiquei com ela. Além disso, com 35 anos não sou exatamente um jovem e o termo "bem sucedido" é um certo exagero. Lisonjeiro e educado, mas exagero.Qual o papel do escritor na sociedade?
O meu é A-4.
(2002)