Grande parte das poesias que integram este meu pequeno Inventário da Noite foram escritas na fase da adolescência. Muitos anos depois, já casado e com um filho - acaso não plantei, decerto salvei algumas árvores - me veio a idéia de reuni-las em um livro. Inicialmente, sem uma maior reflexão crítica, pensei publicá-las todas. Após, mais criterioso, exclui muitas; refiz algumas e retoquei outras tantas - atualizando a linguagem, diga-se, mas preservando a essência."Há um momento/em que o mundo é sem tempo.../e tudo é por demais irreal/para que se cogite dos sonhos..." Que mundo é esse?
O mundo é isso aí - o que os jornais mostram dele sem precisar dizer nada. Mas mesmo pessimista, ouso crer que amanhã será outro dia...Ser neto de José Lins do Rego é ter mais facilidades ou dificuldades?
Ser neto dele nunca me trouxe cobranças ou pretensões de qualquer espécie. E, no que diz respeito à publicação do Inventário da Noite, não trouxe facilidades - Muito embora também publicado pela José Olympio - a mesma Editora que cuida dos livros dele, tive que financiar o meu - o que em se tratando de poesia não foge a normalidade - ainda que contasse com toda a atenção e desvelo em sua bela edição.O que o poeta deve ter de menino?
O Poeta deve ter do menino a naturalidade de ficar olhando para o céu vigiando a pipa como se tomasse conta do mundo sem se preocupar com ele.No poema CLONE você nos diz: "sou levado pelo passado/que o tempo não plagiou!". Errar é humano?
Como digo em outro verso: "cheiro a pecado e posso pecar".Qual a sua relação com a noite? É noctívago?
Hoje, homem casado, decerto com menos freqüência exerço meus pendores noturnos. No entanto, minha relação com a noite sempre foi de total entrega e paixão. Acredito que nela estamos desnudos - somos mais autênticos - E como são ricos seus personagens - os andarilhos e as putas; os loucos e os poetas, perambulando pelas ruas em busca de um sentido no destino de seus passos.Quais os escritores fazem a sua cabeça?
A bem da verdade, não sei se algum escritor ou poeta fez ou faz minha cabeça. Meu gosto é eclético. Augusto dos Anjos, Fernando Pessoa, Drumond, Thiago de Mello, Ferreira Gullar, Affonso Romano, Vinícius, Cecília Meireles, Bandeira... Não me filio a nenhum movimento ou vertente; não sou adepto de formas fixas ou eruditas; tampouco me distingo pela perícia técnica - seus recursos e efeitos. Minha poesia é essencialmente lírica, sem preocupações de se ater a qualquer parâmetro ou conceito.Quem é o escrito brasileiro?
Escritor brasileiro é Machado de Assis, mas adoro outros tantos. Sobre meu avô sou suspeito...Tem algum mote que o acompanhe?
Amar, sobre todas as coisas..."Em branco/eu e meu papel/no mundo" é o final do poema EM BRANCO. Há algum papel para o poeta na sociedade?
O papel do poeta na sociedade é fazer crer que a poesia existe. É mostrar que todos, sem exceção, somos capazes de cometer atos poéticos.
(2002)