A Garganta da Serpente
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Saída por Baixo

(Jacaré K)

"- Porra, é foda..."

A esse pensamento aliava-se o ato mecânico de fazer passar, rolando por entre os dedos, a moeda de R$ 0,50 que sobrara do pagamento da última cerveja. Agora não restava mais nada. Nada. Apenas preocupações e um indescritível torpor, certamente, resultante das doze horas de álcool, pó, fumo e pasta.

Assim tinham se passado as últimas semanas. Uma total agressão a si próprio. Talvez, pareceu-lhe, ver as coisas desse modo seria apenas um sintoma de autocomiseração. Ou não? As dúvidas escorriam-lhe pelos poros. A única vontade que o assomava sempre, subitamente, era a ânsia por penetrar uma vagina ou fumar um "mel". O trabalho e a faculdade eram-lhe apenas uma enfadonha regularidade: "- o fim..."

- Me arranja esse cinquenta, aí, tio?... A voz do moleque, do qual já havia visto a aproximação, somente o fez sentir mais intensamente a miséria onde há dias vinha se enfiando.

- Vai tomar no cu, porra. Levantou-se, colocou a mão esquerda dentre do cós da calça, por trás, e pôs-se a caminhar pela margem da Manaus Moderna que dá para o Rio Negro. Não conseguia nem ao menos um pensamento claro. Tudo lhe era solidão. Nem mesmo havia algum "remédio" para devolver-lhe a euforia ou fazê-lo mergulhar no sono. Nada. Só o monótono alarido e o vai-e-vem incessante da escória ao seu redor.

Dali a alguns minutos, chegou ao Caixa 24 horas da Sete. Enfiou o cartão na máquina e sacou trinta. Foi na Esquina. Tomou um copo de suco de maracujá e comeu uma esfirra de frango.

"- Há, Há... Vou já comer aquela putinha." Tratava-se de uma prostituta com seus trinta e poucos. Tinha peitos grandes, pele morena e uma bunda redondinha, mas não muito. Tinha-a visto quando passara pela Matriz e, de fato, parecera-lhe interessante a ponto de fazê-lo olhar pra trás só pra checar a pele e a expressão facial. A vadia tinha os pêlos do corpo descoloridos e possuía um riso, sem dúvida, descarado no rosto. A mulher ideal para aquele momento. Isso o havia motivado a sacar grana e tomar um lanche. Havia diversão à vista.

- Julia... e você? É casado? Ela tinha uma mão forte, mas delicada e perfumada. Foi gostoso sentir a boca quente e úmida. Macia. Masturbou a pomba com a língua, a boca e a mão. Delícia. Virou de costas e segurou a pica, enfiando-a na buceta. Parecia uma égua rebolando.

- Come minha bunda. Ficou de lado e foi sugando o pênis com o cuzinho macio. A pica dura entrou fundo, gostoso, roçando na pele lisa do canal. A gala saiu gostoso do pênis, inundando cu da vaquinha, que não parou de rebolar.

- Aaaii! Amor! Gemeu a putinha, enquanto virava o pescoço e olhava, de costas, sobre o ombro, oferecendo-lhe a boca entreaberta.

"- Que foda!", pensava. Sentia um leve um leve cansaço, enquanto, no banheiro apertado e sujo, a água caía-lhe sobre a cabeça e escorria pelo corpo, permitindo-lhe ensaboar repetidamente a cabeça do pênis. - Thau, amor. Aparece. Eu vou sentir saudades dessa pombona. Não pode discernir se ela estava sorrindo ou moldando a boca para o batom. Simulou um beijo e com um olhar cínico guardou os dez paus na bolsa. Desapareceu.

- Me dá um real, amor? Eu sei que tu tem dá logo, vai?

...

"- Cadê os caras??"

- Quanto é, man? Dez?

- Dez...? Tô duro, mano: só cinco.

- Cinco? Toma aqui. Eu faço.

- Ei, se manque, se manque. O cara ta fazendo jogo comigo. Pegue esse plástico aí, broder.

- E aqueles cara ali? Qualé?

- É os homi. Tão só tomando conta do movimento. Vai logo. Pegaí. Valeu.

No som do carro parado, Renato Russo cantava...

"Andando nas ruas, pensei que podia ouvir alguém me chamando, dizendo meu nooome. Já estou cheio de me sentir vazio. Meu corpo é quente, estou sentindo frio. Todo mundo sabe. Ninguém quer mais saber. Afinal, amar ao próximo é tão démodé."

A leve dorzinha no canal do pênis e o contato do papel de pasta entre os dedos produziam uma prazerosa vontade de deitar o corpo sobre uma cama e dormir. Havia ainda algum "qualquer" e o "pagode" estaria saindo dali a dois dias. A regularidade tornara-se suportável. Dos dois elementos envolvidos na efêmera anestesia em que se afogava, qual conteria sua cura definitiva?

(19.6.2003)

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