A Garganta da Serpente
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O beijo

(Thaty Marcondes)

De seus lábios de menina jamais alguém sugara o mel. Porém, depois que o conheceu começou a sentir um frio que subindo pelo estômago, as pernas bambendo, as mãos suando frio; engasgava-se com as próprias palavras, os olhos passeavam por todos os cantos tentando disfarçar, em vão, aquele sentimento esquisito que experimentava pela primeira vez.

Toda vez que ele chegava era igual. Aquilo não passava e ela não sabia mais como fazer para que seus pais não percebessem.

Nos dias que se seguiram, sua mãe notou que algo estranho acontecia.

- Daniela, o que você tem? Está abatida, não tem fome, dorme pouco. O que há minha filha? Não me diga que está apaixonada?

Pronto: aquela frase foi suficiente para fazê-la corar. Sentiu um fogo ardente em suas faces. E agora? Não podia deixar que ninguém percebesse por quem ela nutria esse sentimento novo. Inventou uma desculpa:

- Ah, mãezinha! É um carinha da escola, bem mais velho!

- Mais velho? Você está no primeiro colegial! Algum repetente? Se for, não há de ser coisa boa! Se afaste dele, Dani. Você sempre foi ótima aluna. Não se
apaixone por quem não a merece.

- Não, mãe, nenhum repetente!

- Já sei: amor platônico pelo professor! Isso é normal na sua idade! Mas não vá nutrir esperanças: passa logo, você vai ver. Basta você arrumar um namoradinho e esquece rápido. Falando nisso, cadê o Fernando? Pensei que fossem acabar namorando!

- Não sei, mãe. Sumiu. Boa ideia: vou ligar pra ele.

- Isso, ligue. Fernando é um ótimo rapaz.

Encaminhou-se ao telefone no escritório do pai, para ficar mais à vontade. Tirou o fone da base e viu o número dele no cartão de visitas. Não se conteve e ligou.

- Alô.

Daniela manteve-se quieta.

- É você, Eduardo?

Ela desligou imediatamente. Ele devia ter "Bina"! E agora?

O telefone interrompeu seus pensamentos.

- Alô.

- É você, Dani?

Era ele.

- Ssssssim. - balbuciou.

- O seu pai está em casa?

- Nnnnão.

- Estranho, recebi uma ligação agorinha mesmo vinda daí!

Ela não sabia o que dizer.

- Alô. Dani, você ainda está aí?

- Sssim.

- Está tudo bem em casa? Você precisa de alguma coisa?

- Nnnnão.

- Está bem. Se algo acontecer pode me ligar, certo? Agora vou voltar ao
trabalho.

- TTTtá bom.

"Que vergonha! Que vontade de sumir!" - pensava nervosa, enquanto roia as unhas.

Subiu, colocou pijama e disse à mãe que ia deitar-se, pois não estava se sentido bem.

- Deve ser gripe, não se preocupe.

Ele nunca mais foi à sua casa. Ela queria saber o motivo mas não ousava perguntar aos pais.

Certa noite, na saída do curso de inglês, ele a esperava.

- Briguei com seu pai por sua causa. Aquele dia, quando você telefonou, me deu o sinal que eu esperava. Eu amo você.

Beijou-a profundamente. Continuou beijando-a em todos os lugares, até chegar ao pescoço.


Ontem seus pais receberam um cartão da Transilvânia:

"Estou feliz! Nós nos amamos. Beijos."

(16/04/04)

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