Seria uma história preciosa , caso o jornalista pudesse contá-la,
mas ele comportara-se estupidamente, e, estando preso àquela promessa,
não poderia fazê-lo. Zezinha estava vingada.
Conto-lhes em rápidas palavras o sucedido:
Zezinha, a poetisa, sofrera de paralisia infantil e desejava conhecer pessoalmente
o Dr. Sabin, que visitava o Brasil.
- Sendo a senhora quem é, isto é facílimo! - retrucou o
Campos.
Zezinha ficou a especular se o 'sendo a senhora quem é' referia-se a
suas poesias ou ao fato de ter ela sido acometida pela doença.. Havia
um outro porém: ela não falava inglês.
O Campos tranquilizou-a:
- Nem precisa. O doutor fala fluentemente o português. Ele é casado
com uma brasileira, não sabia?
Acertada a visita, um amigo jornalista resolveu 'pegar carona' na entrevista
e ofereceu-lhe o carro. Zezinha bem que percebeu a marotice, mas o amigo parecia
um menininho em visita a Papai Noel e ela não teve coragem de negar:
- Mas olhe lá! Não vá transformar a visita em assunto de
reportagem! Proíbo-lhe!
Ora, esta era justamente a intenção do jornalista, mas ele cedeu:
contentava-se com a glória de ver de perto a celebridade.
Zezinha e Sabin estavam a comentar a grande sorte das gerações
atuais, pois há oito anos não se registrava sequer um caso de
poliomielite no Brasil, quando o nosso jornalista, não conseguindo segurar
a língua, sai-se com esta 'pérola':
- O senhor, evidentemente, enriqueceu, não foi?
Zezinha sentiu o rosto quente de indignação e vergonha.
Sabin exclamou, veemente:
- Meu senhor, certamente os laboratórios que comercializaram a vacina
enriqueceram. Quanto a mim... as descobertas dos cientistas pertencem à
Humanidade!
Seguiu-se um silêncio constrangedor.
O jornalista interessara-se subitamente pelo intrincado desenho do tapete persa
sob seus pés. A amiga o encarava, muito digna.
O cientista levantou-se e, em voz pausada, contou-lhes :
-Estive recentemente na Inglaterra... Fui recebido na corte... Vocês sabem,
o protocolo inglês é severo... Quando a rainha entra, todos se
levantam e a reverenciam... Pois lá estava eu, em meio a todos aqueles
lordes... E a rainha inclinou-se e beijou-me as mãos... Isto me basta.