A Garganta da Serpente
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Ninhos

(Silas Corrêa Leite)

(Para a Memória de Vladimir Herzog - Vlado)

"É preciso pagar nossa Taxa de Trevas"
(José Roberto Nool)

A estátua do Marechal Goiaba estava viva?

Bem esculpida em pedra-sabão, parecia mesmo obra de gênio palacial, tal a qualidade estético-formal do desenho, do acabamento e da vaidade do acerto garboso (e cheio de pompa) da arte final.

Só os pombos tinham medo dela, as chuvas tropicais desviavam de seu destino pétreo, e as crianças ainda não desmamadas tinham vergonha do nojo oficial que ela provocava.

Mas, no Parque de Confinamento Redentor, as pessoas insensíveis como ovelhas tosquiadas até a cumprimentavam, dando certo que era autoridade ilegal posando de gente. Ou seria medo do Redil 3l de Março, um simbólico esgoto a céu aberto?

O pior foi quando a estátua começou a responder. Correu boataria por atacado.

No entanto, um político gagá, achando que aquilo tudo era obra de comunista provocador contra a ordem militar do Ditador Lesma Três, mandou retirar a estátua doada pelas Moralistas de Santana, e guardou aquele ícone sem controle num almoxarifado brechó (chamado Bordel Excelência) do governo de exceção, com tudo aquilo de ruim que do regime de arbítrio a estátua acintosamente representava, como corrupção endêmica institucionalizada em todos os níveis, miséria absoluta, prostituição política e violência secreta (e censurada) de ninhos de escorpiões.

De lá nunca mais foi vista a obra com seu oliva dolmã-de-tala. Somente estranharam o que encontraram no lugar dela, quase trinta anos depois um monturo de sal cuja origem comprovadamente seriam lágrimas equestres.

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