Um dia Deus olhou para um determinado lugar do espaço infinital de sua
visão angélica, e perguntou: - Que qué isso, Anjo Gabriel?
O anjo escriba, saindo de sua pose de garbo, explicou: -É a passagem
de ano, Senhor. Festa mais maior de grande. Então Deus, em sua santa
pose, de presto comentou: -Que desperdício de energia, de bebidas, de
comidas e de belezas despossuídas de propósito. Deus estava com
o pavio curto a cismar toleimas. Tempos depois, o Criador sondou de novo o lugar,
e indagou curioso para o Anjo de gabinete: -Que forfé é esse,
Gabriel. -Carnaval, Senhor. É o tal do entrudo tropical lá deles,
respondeu o anjo de gadelha lilás. Deus ficou encafifado.
Onde já se viu aquilo de infernal? Era muita Sodoma e Gomorra para um
canto continental só. Ali havia risco diluvial, soberba, pensou. Mas
não disse. E assim Deus foi indagando, de propósito, data após
data, os guaiús todos, feriados, Copa do Mundo, Eleições,
barulhanças e contentezas, daquele povo que se dizia cristão de
meia pataca, mas também, num sincretismo dolente se cercava de velas,
imagens, venerações idólatras e patuás hipócritas.
Até que chegou um dezembro qualquer, no lumiar de uma nova aurora celeste,
e Deus cobrou sobre a bagunça telúrica: -Que qué isso,
companheiro? Então o Anjo Gabriel, mais por cortesia do que qualquer
coisa, deitou falatório: -Ora, Chefe. Será o impossível?
Tão comemorando de novo o seu "niver". Sabe como é,
Natal é pressas coisas mesmo. Deus não perdeu tempo: - Mas isso
é que é o Natal agora? Só por Deus, quero dizer, só
por Mim. Porres homéricos, gula exacerbada, amigos secretos...sandices...consumismos...grifes...isso
foi tudo o que restou da data magna do Cristianismo? Gabriel sondou Deus. O
Número Um tava realmente beiçudo, de tromba. Frustrado. Onde já
se viu aquilo? Então Gabriel, iluminado, soltou o verbo:
-Perdoa, Pai. Eles não sabem o que fazem!
Deus, olhando um berçário de estrelas num ponto infinito qualquer
do espaço sideral, pensou a ideia de um milagre. Um novo milagre.
Um novo José. Uma nova Maria. Talvez uma nova Belém e uma outra
manjedoura. Um novo céu e uma nova terra. Estava escrito.