Ana sentou-se para ver o pôr do sol como normalmente fazia. Era um momento
só seu, eram essas poucas horas do dia que ela tinha para pensar em si,
em sua vida, em seus sonhos. Nestes momentos ela sentia-se mais perto dos Deuses.
Já estava começando a escurecer, ela resolveu levantar-se e ir
para casa, mas notou uma presença bem atrás dela. Olhou com o
canto do olho e notou que era um rapaz, alto, cabelos escuros, pele clara, observava
o mar. Ela levantou-se e tentou passar por ele, mas ele falou com ela:
- Sabe estou indo caminhar um pouco pela praia, essa é a melhor hora,
nem muito quente nem muito frio. Gostaria de me acompanhar?
- Bem eu poderia até acompanhar, mas não lhe conheço e,
portanto, não tenho motivos para caminhar com você.
- Você simplesmente não me conhece porque sou seu novo vizinho e
estou tentando fazer uma amiga. Isso é crime? Não se preocupe
não vou fazer nada com você.
Ana começou a ri, mas conseguiu perguntar:
- Qual o seu nome então, meu novo vizinho?
- Marcos e o seu?
- Ana, é, vamos lá! Caminhar um pouco, o tempo hoje está
agradável, se bem que acho que vai chover.
- Concordo, com você. A tempestade fará bem limpará o ar,
mostrará caminhos. -Respondeu ele.
- De onde você veio?
- Eu vim de longe, sinto falta ainda, tinha muitos amigos por lá. Todo
dia quando o sol ia se pôr, íamos andando pela praia conversando,
rindo, e tudo isso me fazia muito bem.
- Já faz tempo que você está por aqui? Eu nunca vi você
andando pela praia.
- É porque andar sozinho não faz meu estilo. E hoje eu estava conversando
com um rapaz que conheci agora a pouco, o Rafael, conhece? Pois bem, ele me
disse que iria andar hoje e me chamou.
- Hum... Quer dizer que você e o Rafinha já se conhecem? - Ela riu
e fez um ar de mistério, e mudou de assunto rapidamente. - Qual sua idade?
- Hei, espere aí! Rafinha? Você o conhece? Não faça
isso. Diga-me, por favor, o que tem ele? 17 e a sua?
- 16.
- E o Rafa?
- Hum... O Rafinha? O que tem o Rafinha?
- Não inverta a pergunta, sua danadinha, vamos me diga. -
Ela deu uma gargalhada estridente e respondeu:
- Você ficou curioso... Hum... Gostei de sua carinha de curioso. Acho que
não vou contar.
- Isso é malvadeza. - Eles estavam rindo como loucos. - Por favor.
- Você não sabe onde ele mora, não é?- Ele fez que
não com a cabeça.- Eu sou a irmã dele.
- Irmã? Você e o Rafael são irmãos? Minha nossa, faz
quase uma semana que eu convivo com ele, e não sabia disso. É
difícil acreditar que aquele rapaz feio tem uma irmã tão
bela. - Ela ficou vermelha, ele notou e olhou pro horizonte, deixou ela recuperar-se.
Mas ela não deixou barato.
- Você também é bonito, obrigada. Mas meu irmão não
é feio, ele é bonito, as garotas do colégio acham ele bonito.
Mas você é mais bonito do que ele.
- Hum... Obrigado. Eu estava brincando quanto ao seu irmão.
E eles foram andando pela praia com o mar indo e vindo, contando e levando historias,
o vento levava as risadas e os risos dos jovens que estavam começando
a se conhecer. Voltaram pra casa um pouco tarde, mas o começo da noite
havia sido bem interessante e Ana não conseguiu esquecer o rosto, o riso,
do rapaz com quem conversará por metade da noite. Já era tarde,
mas ela não resistiu e telefonou para ele.
Era uma hora da manhã quando o telefone tocou no quarto de Marcos, ele
estava sentado na janela observando a lua que surgia no céu estrelado.
Estranhou e perguntou quem seria, resolveu atender, pois poderia ser Maysa sua
namorada que deixou em algum lugar de uma vida passada.
- Alô! Quem é?
- Sou eu, Ana. Você tava dormindo?
- Não, aninha, você não me acordou não, estava deitado
vendo a lua.
- Deitado? Vendo a lua? Como consegue?
- Bem, no meu quarto a uma janela enorme de frente pro mar e a lua nasceu faz
poucas horas.É lua cheia e ela está belíssima. Você
já parou pra vê-la?
- Mas é claro, tenho uma lua cheia e um céu estrelado desenhado
nas paredes do meu quarto.
- Bem o que você queria? Por que ligou pra mim?
- Bem... Ham... Sabe, eu esqueci de perguntar em que colégio você
vai estudar? -Ouviu-se uma sonora gargalhada do outro lado.
- Você não podia esperar até amanhã? O colégio
é tão importante assim? - Marcos não pode ver, mas Ana
ficou vermelha do outro lado da linha e sem saber o quê responder o silencio
se instalou. - Alô... Ana ainda tá na linha?
- Ah sim... Claro que estou. É o colégio é importante. Quem
sabe estudemos na mesma sala?
- AHHH, está certo... Eu ainda não procurei o colégio. Tem
alguma ideia?
- Mas claro que tenho você podia ficar no Coração de Dragão.
Lá é super legal, o pessoal é legal e os professores melhores
ainda.Poderíamos fazer uma visita lá amanhã. Você
topa?
- Mas claro que topo. Com você vou até o inferno. Você gosta
de musica?
- Lógico! Quem não gosta de musica?
- É, quem não gosta? Eu sei cantar e tocar guitarra e violão.
Onde eu morava tinha uma banda, nós nos divertíamos à beça.
Todo fim de semana a galera tava lá em casa. Pena que tive que me mudar.
- Olha, Marcos, mas mudanças são necessárias para qualquer
vida. Sorria e tudo ficará mais fácil.
- É Ana, pra você é fácil falar, você não
se mudou, você não perdeu os seus amigos, não perdeu a sua
vida. Então se torna fácil falar, queria ver você no meu
lugar.
- Tenta ver o lado bom da coisa.
- O lado bom da coisa? Não vejo nada de bom por aqui, não tenho
ninguém pra conversar, com quem caminhar, com quem cantar ou brincar.
Entende?
- Olha, eu tenho que ir, boa noite, ok?
A linha ficou muda e nem deu tempo dele despedir-se ou falar qualquer coisa.
"Essa garota é maluca, ela me liga a altas horas da noite e de repente
desliga. Será que eu falei algo errado?". Enquanto isso Ana, tornou-se
a sentar e ficou pensando: "Pobre Marcos, tão bonito, tão
legal, mas tão irracional. Garotos, quem vai entender?". Os dois
pegaram no sono perdidos em seus pensamentos.
O dia raiou belo e forte. Marcos levantou-se, ajeitou-se, beijou sua mãe,
e saiu para correr. Adorava o começo da manhã, a água ainda
gelada da noite, a brisa, batendo em seus cabelos a tranquilidade que o
mar lhe transmitia. Tornou a pensar no telefonema da garota com quem ele próprio
foi falar, bem achar a casa dela não seria difícil, afinal, eles
ficaram na porta da casa dela na outra noite, ele resolveu ir lá. Quase
que não reconhecia a casa, afinal já estava bem tarde quando terminaram
a caminhada, mas Eros estava do seu lado e ele conseguiu reconhecer. Tocou a
campainha.
- Já vai, um minuto. - Respondeu a voz lá de dentro. - A porta
se abriu, e uma moça melada de tinta apareceu. - Olá rapaz, você
é bonito, hein? Acho que a Ana acertou dessa vez. Mas não está
muito cedo não, querido?
Ana vinha descendo a escada e ouviu o que a mãe dizia e gritou lá
de dentro:
- Mamãe, o que é isso? - Desceu as escadas correndo e puxou a porta,
viu Marcos, deu um sorriso - Ah! Marcos é você? Não ligue
pra minha mãe. - Virando-se pra Dona Clara. - Tudo bem mamãe pode
deixar, volte pros seus quadros. Entra, eu estava indo tomar café quer
me acompanhar?
- Hum... Se não se importar adoraria, sai para uma caminhada à
beira-mar e ainda não tomei café da manhã. Acho que fui
meio grosso ontem no telefone, andei pensando, o porquê de você
ter desligado daquele jeito.
- Vem, por aqui. - Ana fechou a porta e foi para cozinha. - E então o
que veio fazer aqui?
- Pensei que tínhamos marcado de ir ver o colégio?
- Marcamos, mas não a essa hora! - Ela riu.
- Tudo bem... O verdadeiro motivo é para saber o por quê de ter
desligado o telefone daquele jeito hoje cedo. Vai dizer?
- Hum... Por nada. Eu tive que desligar, só isso. - Ela ficou vermelha
e ele notou.
- Bem... Eu digo que não é a verdade. Mas se não quer dizer.
Espero um dia saber.- Deu um meio sorriso e perguntou.- E então? Dormiu
direito?
- Dormi sim e você? - Enquanto conversavam, comiam uns sanduíches
que Dona Clara havia preparado.
- Também.
- Olha, eu vou lá dentro botar uma roupa e me ajeitar pra gente ir ao
colégio, ok?
- Tudo bem. Espero aqui? - Ela fez que sim com a cabeça e subiu as escadas.
"Ela é maluca, estou convencido disso. Hum... Mas bem que ela é
engraçada. Acho que arrumei uma amiga...", seus pensamentos foram
interrompidos pela voz de seu amigo Rafael.
- E ae, chapa? Tudo legal? Que tas fazendo aqui uma hora dessa? Ainda é
de madrugada.
- Olá, Rafael. Eu vou com sua irmã ao colégio, ela ficou
de levar-me até lá.
- Ah! Você já conhece a Ana, então? Que legal!- Nesse momento
ela vinha descendo a escada, colocou um vestido colorido, com flores em detalhes.
Marcos saiu um pouco de órbita, pois ainda não tinha notado a
beleza da garota, seus olhos brilharam e Rafael notou, fazendo uma pequena brincadeirinha.
- Oi, maninha! Tudo bom? Cara, eu acho que você levou o Marco aos céus
com esse vestido. - Ela ficou vermelha e baixou a cabeça.
- O que é isso, Rafa? Ta maluco. - Marcos tentou concerta rapidamente.
- Desculpa, eu acho que seu irmão pirou.
- Liga não, ele é louco para me ver com algum amigo dele. E então
vamos?
- Claro, quando você quiser.
Marcos e Ana passaram a manhã juntos, Marcos adorou o colégio
e resolveu estudar lá mesmo. Ele pediu para que ela mostrasse a cidade
e apresentasse algumas pessoas, caso encontre-as. O tempo foi passando e Marcos
e Ana viviam juntos, os amigos faziam brincadeiras no colégio dizendo
que a amizade deles daria em casamento, todos riam das histórias.
- Ana, acho que precisamos conversar. Uma conversa mais séria do que de
costume.- Marcos e Ana estavam vendo o pôr do sol, como normalmente faziam,
Marcos já não aguentava mais o clima de amizade colorida
e resolveu terminar com o assunto de uma vez por todas.
- Conversa séria? Você? Está brincando com minha cara? Isso
é praticamente impossível.- Ana morria de ri, mas resolveu parar
quando notou que Marcos estava falando sério mesmo. - Ok! E então,
o que é tão sério que não pode esperar o fim do
pôr do sol?
- Primeiro: quem nunca fala sério é você. Segundo antes do
pôr do sol seria ideal. - Ana já estava ficando curiosa.
- E então o que é?
- Antes, uma pergunta. Lembra do dia em que nos conhecemos? Lembra do telefonema
de madrugada?
- Lembro de tudo. O que tem? Por que essa história depois de tanto tempo?
- Por que você ligou? - Ana saiu do passo, ficou branca feito farinha.
Marcos notou e essa reação comprovou sua analise.
- Bem... Eu acho que liguei porque... Francamente! Não tenho para quê
responder. Eu até já esqueci.
- Eu já sabia que você, não iria dizer. Mas vamos lá...
Acho você uma pessoa super legal e bem divertida. Você é
muito bonita. - Ana começou a ficar vermelha e a desviar o olhar. Tremia
dos pés a cabeça, mas não estava mais nervosa do que Marcos.-
E esse seu jeito acabou por me conquistar. Acho que trocando em miúdos
e fazendo uma piadinha feito você: Eu estou bobamente apaixonado por você.
E estou pedindo-te em namoro, tendo o céu e as trevas como testemunhas.
Você aceita namorar comigo?
- Caramba! Agora você me pegou de surpresa. - Ana estava nas nuvens com
certeza, mas estava mais tímida do que nunca, nem suas piadas tinham
graça. Ela sabia no fundo do coração o que queria dizer,
mas estava com medo.- É você agora botou para lascar. Só
que não sei o por quê dessa pergunta. Acho que você já
sabe a resposta. Não tem para que perguntar.
- Uau! Você me deixou nervoso agora.
Eles beijaram-se e passaram o resto do pôr do sol bem juntinhos, completamente
diferente do que vinham passando há seis meses. A vida agora tinha outro
ritmo, principalmente para Marcos.
Tudo estava indo bem, mas parecia que uma maré de azar estava caindo
sobre a casa de Ana, primeiro sua mãe e seu irmão haviam brigado,
ocasionando a saída deste ultimo de casa. Logo depois Dona Clara caiu
de cama, com uma doença que os médicos não sabiam explicar.
Marcos via a mágica fascinante de Ana murchando como uma bela rosa que
um dia deixa de existir.
- Ana, você não pode ficar assim. Sua mãe precisa de você
forte, sorrindo, e além do mais tenho quase certeza de que se seu irmão
voltasse ela melhorava.
- Como você pode dizer que eu tenho que ficar sorrindo? Meu irmão
está vagando por algum lugar, minha mãe está doente. Você
quer que eu vá procurar o Rafael? Ele foi um incessível, espero
que suma. Não quero saber dele.
- Ana, não é assim. Poxa! Você sabe porquê eles brigaram?
Você sabe o que se passou na cabeça deles? Não, você
não sabe. Então, não julgue. Você mesmo dizia isso.
O que houve com a garota que eu conheci?
- Está apenas na sua cabeça. Marcos, eu acho melhor você
ir para casa, aqui não está dando muito certo, vamos acabar brigando.
Eu não quero isso. - Ana estava completamente transtornada, não
sabia também onde estaria o seu verdadeiro eu. Estava perdida, e não
tinha a quem recorrer. Marcos concordou e foi para casa.
Às 23 horas quando o telefone tocou, Marcos correu para atender achando
que fosse Ana, mas para sua surpresa:
- Alô?
- Alô? Marcos? É você?
- Sim, é ele... Essa voz... Maysa! É você?
- Claro, né? Quem mais poderia ser? Lógico que é sua namorada!
Ou esqueceu disso?
- Não, claro que não esqueci. - Marcos ficou completamente intimidado,
nunca imaginou que depois de seis meses Maysa ainda lembra-se dele.- E então,
onde você está?
- Ave! Depois de tanto tempo é assim que me recebes? Onde você imagina?
- Você está aqui?
- Claro, bobinho, vim te ver.
- Minha nossa! Onde exatamente?
- Estou na frente de uma lanchonete chamada "Pôr do Sol".
- Estou indo para aí. Espere-me. - Marcos desligou o telefone atordoado.
Não sabia se ligava para Ana e avisava, mas avisar o quê? Que sua
namorada estava na cidade? Nem pensar, o que ela diria? Resolveu ir sem avisar.
Pegou o carro e saiu.
Ana estava sentindo-se só, sentia falta de Marcos ao seu lado, sua mãe
havia dormido finalmente, quem sabe assim ela descansasse um pouco. Ligou para
ele. O telefone tocou e tocou, mas nada do Marcos. Ela pensou que talvez pudesse
ter ocorrido algo. Ligou para Laura, sua amiga, e perguntou se ela tinha notícia
de Marcos.
- Alô? Laura?
- Oi, Ana?
- Sim, escuta o Marcos, você tem notícia dele?
- Claro que tenho. Ele está aqui no Pôr do Sol, Ele e uma garota
que eu nunca vi.
- Uma garota?
- É.
- Ta bom, obrigada. Te vejo amanhã.
Ana não sabia o que pensar. Será que Marcos havia se cansado dela?
Pensou em ir até lá, mas não podia deixar dona Clara só.
Maysa resolveu relembrar os velhos tempos depois de colocar o papo em dia, e
de dar notícias de todos.
- E então, Marquito, vamos andar na praia como fazíamos antigamente?
- Você acha? Está tarde, quer ir assim mesmo?
- Claro, a noite está linda e a lua mais bonita ainda. Será legal
vamos... - Maysa puxou marcos para fora do bar, andaram a esmo pela praia, o
mar batia em suas pernas e voltava fazendo um pequeno murmúrio junto
com o vento parecendo com uma canção que os dois conheceram ainda
pequenos.
"O mar levou minhas alegrias
Deixando-me apenas tristezas para cantar
Mas as ondas do infinito também
Trouxeram novas alegrias pro meu pobre coração a chorar
Havia um senhor que me dizia que tudo que vai ao mar
Para sempre na memória ficará
Havia um senhor que me dizia que tudo que traz o mar
Para sempre na memória ficará
Ouvia-se nas ondas que um grande amor ali nascera
E que um dia os enamorados juraram o amor eterno
E em um dia de começo de primavera eles se reencontraram
Para amarem eternamente...
À beira mar."
Os dois pararam de cantar e se entre olharam, o vento passou entre eles, como
se sussurrasse palavras de além vidas, estavam bem juntos, pois Maysa
havia sentido frio durante a caminhada, sorriram e se sentaram na areia.
- Bom! Aqui estamos nos como antigamente, satisfeita? - Marcos estava como há
sete meses atrás, feliz e de bem com a vida, esqueceu de tudo que viverá
nos últimos tempos, até de Ana.
- Não totalmente. Sabe o que está faltando? - Ela perguntou enquanto
ele olhava-a e acariciava o seu cabelo.
- Não, sei não, o que é?
- Isso. - Ela levantou sua cabeça e agora eles podiam sentir o hálito
um do outro, ela aproximou-se e o beijou, ele reagiu puxando-a mais para perto,
deitaram na areia e ficaram assim por longas horas, relembrando os velhos tempos.
- Bom dia, mamãe. Tudo bem? -Perguntou Ana.
- Tudo, minha querida. Já está indo para o colégio?
- Sim, passei aqui pra saber se precisa de algo.
- Não, querida, estou bem. Acordei bem melhor hoje. Acho que vou até
pintar.
- Então, está ótimo. - Beijou a mãe e foi para o
colégio, pensando em como estaria Marcos e quem era a garota que estava
com ele na noite passada.
- Olá, Ana! Tudo bom? - Ele aproximou-a e tentou beijá-la, mas
ela em um gesto simples e discreto virou o rosto. - O que houve?
- Nada.
- Nada? Sua mãe não está bem?
- Ela está muito bem, essa manhã, Marcos, não se preocupe
com ela. Alguma novidade?
- Novidade! Não, nenhuma.
- Que pena! Eu tenho uma ótima.
- Hum... Qual?
- Acabou. - Ela acelerou o passo, deixando Marcos com cara de bobo no pátio
do colégio, ele não entendeu. Correu para alcançá-la.
- Hei, Ana, peraí... O que acabou?
- Nosso namoro.
- Mas... - Ele ficou atônito. - O que houve? Por quê?
- Bem, se você não tem novidades e ontem à noite estava com
uma garota, então você tem algo com ela e se tem algo com ela,
é melhor me deixar em paz.
- Hei, não é assim, poxa! Será que você não
vai me dar uma chance para me explicar?
- Eu dei, você que não soube usar.
- Ana, ela era uma ex-namorada só veio me visitar.
- E por quê não me contou?
- Aninha, eu não contei dela antes, por que contar dela agora?
- Deveria.- o Sino tocou e eles foram para as salas. Marcos passou a manhã
perdido em seus pensamentos, sabia que Ana estava enfrentando um problema difícil
e que não aceitaria uma explicação qualquer, no final ele
gostava dela e o que ocorrera na noite passada foi apenas instinto, e isso normalmente
ocorre. Ocorreria com ela.
Quando as aulas acabaram, Marcos procurou por Ana, mas ela já havia saído.
Resolveu ir até a casa dela, tocou, mas ninguém abriu a porta,
tocou novamente e chamou por ela, um pouco depois a porta abriu.
- Dona Clara, minha nossa! A senhora deveria estar na cama.
- Está tudo bem, Marcos, eu estava na sala de pintura. Estou um pouco
melhor hoje.
- A Ana contou-me, graças que a senhora está melhor. Ana está?
- Ana? Não, ela não está em casa, pensei que viria com você.
Vocês brigaram?
- É uma longa historia. Posso entrar?
- Mas claro, venha estou terminando um quadro.
- O que está pintando?
- Veja por você mesmo. - Eles haviam chegado a sala de pintura e apontou
para o quadro inacabado.- E então o que acha? - O quadro era uma pintura
de dois jovens sentados na praia, uma lua cheia refletida no mar totalmente
em azul marinho.
- Quando ele ficar pronto estará perfeito.
- Obrigada. Mas e então o que houve?
- É o seguinte, Dona Clara, antes de vim pra cá eu estava namorando,
mas quando cheguei aqui e o telefone lá de casa foi instalado, liguei
para essa minha namorada e o irmão dela me contou que ela havia saído
com um rapaz. Fiquei na minha, ela estava no direito dela, pois eu não
estava mais lá.Conheci a Ana, me apaixonei por ela e esqueci da Maysa.
Ontem à noite eu e a Clara discutimos, por causa da sua briga com o Rafa,
e eu fui para casa, ela pediu para ficar só, quando foi um pouco mais
tarde a Maysa ligou dizendo que estava aqui, então eu fui vê-la,
porque eu sou amigo dela antes de tudo.
- E rolou algo, vocês ficaram? - Dona Clara perguntou e recebeu um silêncio
como resposta. - Olha Marcos, você é um cara super legal e você
e minha filha formam um casal lindo, só posso lhe ajudar se me contar
a verdade.
- Passamos a noite juntos na praia.
- Até onde minha filha sabe?
- Só que eu estava com ela em um bar.
- Cuidado com o que faz. Irei lhe ajudar dessa vez, mas da próxima não.
Minha filha gosta de você, desde o primeiro dia que se conheceram.
- Dona Clara, muito obrigado, muito obrigado mesmo. Prometo nunca mais fazer
mal a ela, eu só quero fazê-la feliz.
- Assim é melhor, ela deve estar andando na praia, vá dá
uma olhada.Procure-a.
- Farei o melhor possível, trago ela para casa cedo, eu prometo.
Marcos não precisou andar muito para encontrá-la. Chegou por trás
de mansinho e abraçou-a, passando a mão bem devagar sobre seus
braços, mas Ana afastou-o.
- Saia daqui, deixe-me só.
- Droga, Ana, será que nem me explicar posso?
- Tudo bem, tudo bem. O que você quer me contar, que arranjou outra depois
de uma discussão comigo? Ótimo você estava em seu direito.
- Você é uma garotinha miserável, mas não é
nada disso.
- Disseram-me que vocês dois estavam com um papo super animado, ontem à
noite e que ela era muito bonita.
- É ela é bonita. Muito bonita mesmo. - Ana o olhou com um olhar
de reprovação, Marcos passou as costas da mão no rosto
dela e continuou. - Mas o olhar dela nem se compara com o seu. A sua pele então
nunca toquei em algo tão macio, nunca vi rosto mais santificado. Tenho
até medo de estar sendo profano, pois você é um castigo
dos Deuses, uma feiticeira que me enfeitiçou com toda certeza. Poxa,
Ana, você é tudo para mim. A garota chama-se... - Eles foram interrompidos
por gritos, Ana estava amolecendo já, mas então a voz tornou-se
mais nítida e ela percebeu que a moça que vinha correndo chamava
por Marcos, afinal não havia mais ninguém ali.
- Marcos, meu amor. - Maysa chegou, abraçou e deu um beijo nele. Ana olhou
e ficou vermelha de raiva. - Falei com meus pais, vou morar aqui, com você.
Poxa! Marcos você não imagina o quanto eu sonhei com isso.
- O quê? - Marcos estava incrédulo, olhou para Ana, o olhar dela
o petrificava e implorava por uma resposta. - Ana, espere, eu posso explicar.
- Agora foi à vez de Maysa ter um crise de ciúmes, se bem que
ela não tinha muita discrição ou elegância como Ana.
- Marcos, posso saber o que você está fazendo aqui? No meio do nada
e com essa... - Olhou para Ana com um ar de desprezo e completou. - essa garotinha?
E o que você tem de explicar para ela? - Ele olhava de Maysa para Ana,
de Ana para Maysa e não sabia o que fazer. Ana virou-se e começou
a andar, Marcos tentou ir atrás dela, mas Maysa o impediu pedindo uma
explicação. - Vai me contar ou vou ter que perguntar a ela.
- Maysa, dá um tempo. Espere aí, depois eu explico. - Ele correu
para tentar alcançar Ana, pegou-a pelo braço, ela resistiu, mas
não por muito tempo, conseguiu virá-la, olhou bem nos seus olhos
e beijou-a. - Você quer parar com essa pose, droga, é você
quem eu quero, é você que eu amo. Ela é passado. Você
mudou minha vida, Ana, eu quero você e eu terei você, dá
pra entender? Não vou deixar você sair da minha vida, não
desse jeito. Entendeu?
- Não, não entendi, você viu o que ela fez e como ela me
olhou, você viu. Você me enganou.
- Perdoe-me, vamos, Ana, eu não sabia que ela ia voltar, eu pensei que
ela havia me esquecido.Não fiz por mal... Alguma vez eu... Não
fiz por mal... Não quero isso, não quero que acabe assim. Você?
Por acaso quer?
- Mas, você é um cachorro, sabia? Droga, eu também não
quero isso. - Beijaram-se novamente. Maysa via tudo de longe e resolveu lutar
pelo seu namorado, porque ele ainda era o seu namorado e ela sabia exatamente
como fazer isso.
Ana e Marcos foram para casa, ele a deixou sã e salva em casa, assim
como prometera a dona Clara. Depois foi ao apartamento de Maysa, ele precisava
explicar-se. Ela atendeu a porta e deixou-o entrar, havia acabado de sair do
banho.
- Oi, Marcos, o que veio fazer aqui?
- Vim te dar uma explicação.
- Explicação? Ora vamos, não precisa de explicação,
já sou grandinha para entender que você não queria magoar
a pobre garotinha. Você deveria ser ator é extremamente profissional.
Atua muito bem. Pensei que você só viesse mais tarde, nem me deu
chance de me arrumar direito.
- Não é isso, Maysa. Eu gosto de verdade dela, eu a amo, e é
sério. - Ela aproximou-se e deixou que o seu dedo caísse pelo
rosto dele, fazendo desenhos. Ele segurou a mão dela. - Maysa, é
sério, precisamos conversar...
Ana e Maysa encontraram-se no dia seguinte no supermercado, Ana olhou para Maysa
com cara de desprezo, mas Maysa acabou por falar com ela.
- Olá, Ana. Não é esse seu nome? Ana?
- É sim. Como você está?
- Eu estou bem. Ótima para falar a verdade, eu e Marcos passamos à
noite juntos, ontem, conversando, sabe? Ele é encantador não?
- Ah! Marcos me contou. Somos muito ligados entende? Preciso ir, até logo.
- Ana saiu irritada, mas não perdeu a pose, não podia deixar transparecer
que Marcos não havia contando para ela sobre a conversa, seria como declarar
que havia perdido. Foi para casa arrumar-se, afinal, ainda tinha que ir ver
o pôr do sol com Marcos.
Maysa caíra como boba na história de Ana, acreditou seriamente
que Marcos havia contado, mas não perdeu as esperanças, se Marcos
não deixasse Ana por bem, seria por mal.
Marcos estava na praia esperando por Ana, trazia uma rosa para ela como pedido
de desculpas.Ela vinha radiante, usava um vestido branco com alguns desenhos
de lírios em um tom azul, os cabelos estavam amarrados em um rabo de
cavalo. Ela vinha radiante demais, e Marcos só a tinha visto assim uma
vez desse modo, e ela estava bastante irritada... Um frio lhe correu a espinha.
Tentou se controlar, não seria nada, apenas, imaginação
da sua cabeça.
Ana chegou e lhe deu um beijo.
- Esta rosa é para você.- disse ele.
- Obrigada... Por que a rosa? Aconteceu algo?
- Não posso querer agradar a minha amada?- Falou ele, puxando-a para junto
de si.
- Claro que pode, mas você só faz isso quando quer pedir desculpas
e não sabe como.
- É talvez seja, eu deveria ter lhe contado sobre a Maysa, mas eu nunca
poderia ter imaginado que ela viria até aqui, e quando ela chegou...
Poxa, você estava com raiva e eu nunca havia falado sobre ela, poderia
parecer estranho, portanto, resolvi não avisar.
- Sei... E você se encontrou com ela depois?
- Ontem, depois que sai da sua casa, fui até o local onde ela está
hospedada dizer que não havia mais nada entre eu e ela. Aninha, esquece
isso, por que não aproveitamos o começo da noite e damos uma caminhada?
- E vocês conversaram até que horas?
- Ana, quanta pergunta... Está parecendo um interrogatório! Fui
pra casa depois e ela me ligou, então ficamos relembrando os velhos tempos,
fui dormir depois, pensando em você. - Puxou-a mais para perto e se beijaram.
Ana comentou que a havia encontrado e o que ela havia dito.
Dona Clara havia piorado novamente, e junto com ela o humor de Ana, Marcos não
a via mais sorridente e brincalhona como antes e sentia medo, porque não
sabia como ajudar e tinha medo de a perder, pois Maysa estava deixando Ana louca
de ciúmes e ele não sabia mais o que fazer para convencê-la
que não havia nada entre Maysa e ele.
O Rafael ao ter notícias da mãe, voltou para casa e fez as pazes
com ela.
Alguns dias depois da volta de Rafael, Dona Clara faleceu. Ana ligou para Marcos
aos prantos. Ele ficou preocupado e resolveu ir até lá, mas ao
chegar Ana havia, saído, o Rafael estava lá, e alguns amigos de
dona Clara, mas ninguém sabia para onde ela havia ido. Ele falou com
Rafael e foi procurar por Ana, havia prometido ao Rafael que cuidaria bem de
Ana, e eles estavam em um momento que precisariam de muita força, principalmente
Ana.
Marcos rodou toda a cidade, passou nas casas das amigas de Ana, mas ela não
estava em lugar nenhum: "Parece que ela desapareceu. Ninguém
sabe dela, pelos céus, onde será que ela se meteu? - Uma ideia
lhe veio à cabeça. - A praia! É isso! "As ondas veem
e vão, e com elas nossos sentimentos, é como se sumíssemos
do mapa, no vai e vem das ondas. Nos sentimos vazios e ao mesmo tempo cheios
de vida.", foi ela quem me disse isso, é lá que ela está.".
Ana estava sentada na areia, perdida em pensamentos, seus olhos antes brilhantes
como a lua, traziam agora o medo profundo que o oceano emana das suas águas
escuras. Marcos chegou devagarzinho, e sentou-se ao seu lado, sem falar nada.
Ela encostou a cabeça nele e ele a abraçou. Ela chorou durante
horas, e Marcos não podia fazer nada.
A semana passou e, Ana ficou mais calma, mas continuava distante. A sala de
pintura fora fechada, ninguém mais havia entrado lá. Porém,
certa noite, Marcos ligou para Ana, e o telefone tocou e tocou. Ele resolveu
ir até lá. Bateu na porta, e ninguém atendeu, mas o silêncio
era tão grande que ele pôde ouvir um barulho, mas não conseguiu
identificar. Ficou preocupado e arrombou a porta. A sala de pintura estava aberta.
Ele chamou por Ana, mas ela não respondeu. Ouviu o barulho, novamente,
dessa vez vinha da sala de pintura. Aproximou-se devagar. Encontrou Ana sentada
no chão, ela chorava. A sala estava destruída.
- Ana, querida, o que houve aqui? O que aconteceu?
- Vou lhe contar o que aconteceu. Tudo isso que você vê, é
apenas o trabalho de uma vida que foi morta por uma doença horrível.
Tudo isso deveria estar enterrado com ela. E não aqui. Não para
mostrar o como a existência é cruel. Então destruí
tudo. Tudo que deveria ter sido enterrado com ela.
- Inclusive você? É isso que você quer? Ser enterrada também?
Só que você ainda está viva. Mas se quer ser enterrada viva,
tudo bem. Dona Clara não deve estar nada feliz em te ver assim. Seu irmão
e eu estamos preocupados e sentiríamos bastante a sua falta. E a sua
mãe deve ta achando que você não aprendeu nada. Você
não era assim. Você não é assim. Você precisa
reagir.
Ana começou a gritar:
- Saia daqui. Você não entende nada! Absolutamente nada. Não
sei o que está fazendo aqui. Por que não vai procurar SUA NAMORADA?
Maysa, é esse o nome dela não? Deixe-me em paz. Suma daqui.
- Ana, por favor, não faça isso...
- Sai daqui!
- Marcos, é melhor você ir. Eu cuido dela. - Rafael, havia chegado
e ouvido o fim da conversa. Ana gritava e chorava. - Depois ligo para você
e te digo como ela está.
- Não, você não vai dizer nada. Você não tem
que dar satisfação a ele.
Rafael se aproximou dela e a abraçou.
- Tudo bem! Eu não vou ligar pra ele. Você tem razão, calma,
calma. Melhor você ir.
Marcos foi para casa arrasado. Ao chegar em casa, deu de cara com Maysa, que
foi logo se insinuando para ele.
- Olha, Maysa, não estou bem. E acho melhor você ir embora.
- E por que você não me deixa cuidar de você?
- Tchau! - Entrou em casa, e fechou a porta. Maysa ficou irritada, mas não
iria desistir.
O telefone tocou, Marcos atendeu, ainda meio sonolento.
- Alô?
- Marcos, desculpa. Você me desculpa?
- Ana? É você?
- Humhum. Você me desculpa?
- Desculpar pelo que?
- Por ter gritado com você logo cedo.
- Claro, Ana, sem nenhum problema, você está passando por um momento
difícil, eu entendo, mas eu quero que você me deixe ajudar. Se
você se isolar será bem pior.
- Tudo bem. Eu acho que sei disso, mas eu sinto tanta falta dela. Droga! Eu só
queria tê-la mais perto de mim, entende?
- Acho que posso entender.
- Ela era tão alegre, tão cheia de vida, não merecia isso.
Eu só me pergunto o por quê, ela não fez nada, ela cuidava
de seus filhos e amava por demais a vida, foi uma covardia o que fizeram com
ela.
- Ana, ela está tão perto de você. É só você
a deixar se aproximar. Lembre-se dos momentos felizes que tiveram, guarde o
sorriso dela em sua memória e continue vivendo, Dona Clara não
gostaria de ver a filha dela vivendo como uma morta viva.
Ana deu uma risada e respondeu:
- Eu não estou vivendo como uma morta viva, eu só preciso de um
tempo para me recuperar, para poder superar essa dor.
- Tudo bem. Você terá o tempo necessário. - Falou Marcos
rindo. A conversa se prolongou por uma hora e meia. E tudo foi entrando nos
seus eixos à medida que o tempo foi passando.
Ana estava novamente no melhor da sua trajetória, sorria e estava a disposição
de todos que precisassem de uma ajuda, mas por dentro ela estava a um passo
do desmoronamento e nem o seu irmão e nem o seu namorado, as duas pessoas
mais íntimas, depois da morte de Clara, perceberam.
Marcos estava feliz, mas Maysa ainda o atormentava. Não havia nada que
ele dissesse ou fizesse que a convencesse de que ele não estava disposto
a voltar com ela. Certa noite, ela apareceu no apartamento de Marcos, com um
vestido preto colado ao corpo, como se tivesse sido feito em seu próprio
corpo.
- Boa noite, Maysa. Como vai? Entre. - Marcos falou, enquanto pensava: "O
que será que a Maysa veio fazer aqui? Será que ela não
desiste. Uau!! E que vestido."
- Boa noite, Marquinhos. - Respondeu ela entrando, e enquanto falava numa voz
arrastada, passou as costas da mão pelo rosto do Marcos, que fez um gesto
rápido afastando a cabeça. Ela soltou uma risada, e num tom irônico
acrescentou - Eu estou bem, como você pode ver.
- E o que você veio fazer aqui? - Perguntou Marcos num tom ríspido.
- Ora, mas é tão lógico! Vim ver se você já
tinha enjoado daquela magricela da Ana.- Enquanto falava procurava um CD, achou
o que queria, e pôs para tocar. - Você lembra dessa música?
- Maysa, será que você ainda não percebeu que eu não
enjoei da Ana? Se foi só isso que você veio fazer aqui, acho que
já pode se retirar.
- Ave, Marcos! Onde está a sua educação? Até isso
a magricela te tirou foi? Além de perder o bom senso, você perdeu
a educação. Eu fiz uma pergunta e você não respondeu,
e além do que não se trata uma visita assim, principalmente quando
ela é uma velha amiga, ou namorada, como queira. - Marcos suspirou, mas
teve que aguentar a Maysa. Na verdade, ele tinha medo do que ela poderia
fazer. A maysa muito cheia de artimanhas poderia lhe pôr em sérios
perigos mais tarde. Mas nem esse receio, fez com que ele escapasse da armadilha.
- Você lembra dessa música?
- Lógico que lembro, Maysa.
- Hum! - Resmungou ela, meio bruscamente.- Pelo menos disso você não
esqueceu. Foi uma bela noite não foi? Você concorda comigo, que
aquela noite estava realmente linda? Parecia que tinha sido feita especialmente
para aquela ocasião.-Enquanto falava, aproximou-se de Marcos e colocou
o braço em volta do pescoço dele.- Dança comigo?
Marcos não pôde resistir, Maysa sempre havia sido boa na arte de
seduzir, e ele sabia disso, mas caiu em sua dança, e acabou com ela na
cama. Ao acordar, na manhã seguinte, toda a noite anterior veio a sua
mente e, um calar-frio percorreu-lhe a espinha. Procurou por Maysa, mas só
havia um bilhete em cima do travesseiro:
"Querido Marcos,
Obrigada, pela noite maravilhosa que tive ao seu lado.
Eu tinha certeza que você sentia a minha falta. Sabe como me encontrar.
Fique sabendo que eu posso lhe dar bem mais carinho
e atenção, do que aquela insossa da Ana."
"Droga! Mas o que eu fui fazer!" -Pensou Marcos ao acabar de
ler o bilhete. - "Aquela louca, vai pegar mais ainda no meu pé.
É seu idiota, você agora vai ter um trabalhão pra desfazer
essa bagunça, e vai ter que ter muito cuidado para não perde a
Ana." Estava atrasado e foi pro colégio correndo, ao chegar
lá, teve que falar com Ana, e quase não conseguia falar com ela.
Ao saírem do colégio Marcos convidou Ana para ir na sua casa,
tinha algo lá que ele gostaria de dar a ela, uma surpresa.
- Entra aí, pode sentar, sinta-se à vontade. Eu já volto,
vou buscar algo pra você.
- Um presente? Qual a ocasião?
- Não posso querer presentear a pessoa que eu amo?
Ana sorriu e falou:
- Realmente, você tem uma linda paisagem com essa janela aqui, deve ser
legal dormir olhando pro mar e pra lua, e as estrelas também não
vamos esquecer delas.
- É sim. Eu já volto. - Marcos foi buscar a surpresa, e Ana deitou-se
na cama esperando por ele - Pronto, voltei. Não se mexa! Deixa-me tirar
uma foto?
Ana desatou a rir e respondeu que sim com a cabeça. Marcos tirou a foto,
e sentou-se ao seu lado, Ana apanhou a cabeça no cotovelo, virando-se
pra ele e sorrindo.
- Você está linda. - Ele empurrou um pacotinho todo colorido para
ela. - Abra.
- O que é isso? - Ana desembrulhou e abriu a caixa, um colar de conchas
e pedras talhadas em forma de lua deslizou para a cama. - É lindo!
- Fui eu quem fiz especialmente para você. - Ele pegou o colar e aproximou-se
dela para pô-lo em seu pescoço, seus rostos tão perto e
a alegria e mágica que circulava pelo quarto fez com que o inesperado
acontecesse, ele a beijou, e a abraçou mais forte, Ana também
não hesitou e deixou-se levar para as profundezas do amor...
Quando Ana acordou já era noite alta, Marcos dormia ao seu lado com um
sorriso bobo no rosto, ela passou alguns segundos contemplando-lhe o semblante,
olhou para a janela para aproveitar aquela linda vista e agradecer por ter Marcos
em sua vida. Levantou-se e foi até a cômoda, iria embora sem acordar
Marcos, afinal, morava a uma quadra dali, olhou-se no espelho e viu que o cabelo
estava muito despenteado, procurou por uma escova, pegou a escova deixando cair
um pequeno papel, apanhou-se para pegar e sem querer leu algumas palavras: "
...você sentia minha falta...". Ana não entendeu e
abriu o pequeno papel para ler o que tinha nele... Não acreditou ficou
branca de raiva e constrangimento, as lágrimas escorregam pela sua face,
ela não acreditava, não queria acreditar, olhou para Marcos, que
parecia tão feliz ao seu lado, uma armação? Teria sido
enganada? Não importava, ela estava arrasada, aquele acontecimento era
a gota d'água. Tudo estava acabado. Marcos se mexeu na cama, ela olhou
para ele e enxugou as lágrimas, ele estava acordando.
- Ana? - Procurou-a na cama, mas notou que ela havia se levantado, ajeitou-se
na cama e a viu junto à cômoda. - Volta pra cá. Está
tão frio aqui sem você.
- É? Então, por que você não chama a Maysa pra esquentar?
Está tudo acabado, eu não quero te ver nunca mais. - Ana desatou
a correr para fora da casa, enquanto Marcos atônito lembrava do bilhete
em cima da cômoda.
Alguns dias depois Marcos encontrou-se com Rafael e perguntou por Ana.
- Meu amigo, te considero muito, e adorava ver você com minha irmã,
mas sua atitude para com ela foi ridícula, patética, pense que
você fosse fazer bem a ela. Ela está depressiva, mas não
suporta ouvir teu nome. Ela é forte, e estava num momento muito frágil
e você simplesmente tirou a segurança que ela tinha em você.
Minha irmã está desmoronando e eu estou de mãos atadas.
- Desculpa! Vacilei feio. Eu a amo, e gostaria de ajudar, mas... O que eu faço?
- Mantenha distância. Vou te contar, poucas pessoas sabem disso, eu e Ana
estamos de mudança. Vamos morar com uma tia nossa, irmã da mamãe,
ela é psicóloga e pode ajudar um pouco a Ana superar essa fase.
Não a procure. Ela não quer te ver.
- Mas...
- Nada de "mas", meu amigo, vou sentir sua falta... Faz parte, até
mais, preciso ir.
Marcos ficou parada, observando o amigo e ir embora, chorando em silêncio
por ter perdido o amor de sua vida, e era tudo culpa sua.
- Ana... Oh! Ana... Vamos! O caminhão já saiu, precisamos ir. Não
quero pegar a estrada de noite. Vamos... - Chamava Rafael.
- Já estou indo. - Ana estava à beira-mar, vendo pela última
vez seu grande amigo oceano, para onde iria, não havia praia e ela sentiria
muita falta dele. Olhou para ele dando adeus, e lembrou-se da tarde que conhecera
Marcos, o colar que ele havia lhe dado pendia em suas mãos, ela virou-se
e olhou para sua casa, lembrando-se da mãe e despedindo-se de suas lembranças,
era hora de recomeçar. Marcos estava na janela, ela podia vê-lo,
mas não perdoa-lo. Deixou o colar ir caindo devagarzinho, enquanto as
lágrimas corriam de sua face, foi andando para o carro, enquanto o vento
tratava de cobrir o colar com areia e o mar de levar suas lembranças
e guardá-las nas suas águas escuras.
- Vamos, Ana, já está tarde.
- Vamos, meu irmão, vamos... - Entrou no carro, enquanto Rafael dava um
aceno para seu amigo Marcos.
Rafael entrou no carro e perguntou:
- Pronta para uma nova vida?
- Claro, vamos lá... - Dando uma última olhada pelo retrovisor,
e entre lágrimas e sorrisos se despedia de toda uma vida...
Alguns anos depois Ana e Marcos reencontraram-se nos corredores de um supermercado.
Ana já não possuía o brilho nos olhos, a mágica
havia acabado, ela nunca superou a morte da mãe, mas sobrevivia. Marcos
estava mais belo do que nunca, seus olhos tinham um brilho especial, ao ver
Ana ele se culpou por não ter a ajudado, e sim, ter piorado o seu estado.
Ele parou para falar com ela, depois de tanto tempo ela não podia deixar
de dizer-lhe apenas uma boa tarde.
- Ana... Sei que você não deve ter me perdoado... Só queria
te dizer, obrigado. Obrigado por ter me ensinado. Obrigado por ter me amado,
sou o que sou hoje por sua causa. Eu te amei um dia, e ainda te amo. Estou casado
e tenho uma filha com o seu nome, uma homenagem para alguém que eu não
consegui ajudar e que tanto me ajudou.
Ana ouviu tudo calada. Deu um meio sorriso e respondeu
- Boa tarde, Marcos. Fico grata por isso, mas eu preciso ir. Não se culpe
por erros do passado, o passado sempre fica no passado. Também te amei
um dia, mas não posso dizer que ainda te amo. - Mesmo sabendo no fundo
do peito que isso não era verdade, era só isso que ela podia lhe
dizer.
Uma criança loira de cabelos esvoaçantes veio correndo e jogou-se
nos braços de Marcos...
- Papai, papai... Compra pra mim?
- Adeus, Marcos. Linda filha! Que ela seja feliz, muito feliz... - Ana foi andando
pelo corredor, e Marcos ficou olhando mais uma vez ela partir.
- Quem era papai? Papai?
Marcos olhou para sua filha que estava lambuzada de chocolate e sorrindo para
ele.
- Apenas uma amiga... Uma moça que papai conheceu no passado... Vamos,
mamãe está nos esperando.
- Vamos...
A mágica agora renascia nos olhos de uma criança loira, Marcos
podia ver enquanto sua filha crescia que ela possuía o mesmo brilho nos
olhos que um dia o seu grande amor possuíra.