Ele não abandonava o brinquedo, em casa, na sala de aula, em todos os lugares; os amigos zombavam e a professora até o repreendeu
Em algum lugar e não há muito tempo, um menino sonhador e altivo
brincava com seu brinquedo. Felizes, os olhos do pequeno André brilhavam
enquanto tinha em mãos o seu estranho, desbotado e pequeno avião.
Com a cabeça voltada para as nuvens, braço esticado e o aviãozinho
na ponta dos dedos, André parecia empreender todos os esforços
possíveis para erguer o brinquedo, o mais perto do céu possível.
O menino imaginava-se dentro do próprio avião e pensava em cruzar
os ares de todos os países. Ingenuidade de criança, André
queria fazer contato com as autoridades dos países em guerra, a fim de
buscar o tão esperado cessar-fogo.
Os colegas da escola zombavam do menino e do seu encanto pelo aviãozinho
de plástico. Enquanto a maioria da garotada gostava de correr atrás
de uma bola, André, inerte, fazia manobras ousadas com o seu caça,
no intervalo do colégio.
Apesar de apresentar notas boas, certo dia André recebeu uma reprimenda
da professora. Ela se sentiu incomodada com o vislumbro do menino àquele
brinquedo sem graça. A professora queria explicações.
Chamando o garoto pra conversar, a professora acabou sendo desarmada e passou
a entender porque o avião era tão importante para André.
A professora descobriu que o aviãozinho fazia o menino lembrar do pai,
morto depois de um assalto. O pai de André perdeu a vida após
reagir à investida de dois criminosos, que queriam a sua carteira. Desempregado
e sem perspectivas, o pai do menino não quis entregar tão facilmente
o dinheiro que ganhara no último bico, garantia de um pedaço de
carne para o jantar, após semanas de extrema míngua.
André ganhara aquele brinquedo do pai dias antes de perdê-lo.
Fazer o avião de plástico alçar voos era uma espécie
de lenitivo para a dor. Em algumas das incursões, André ia até
o Céu, pedia a Deus que deixasse o pai viajar com ele e sempre contava
com uma resposta positiva do Criador, que, para ele, tinha a cara do velhinho
que vendia sorvetes.
Boquiaberta, a professora derramou água dos olhos, enquanto abraçava
fortemente o menino, que observava de soslaio o seu avião, por ora, aterrissado
na mesa.