A Garganta da Serpente

Poeta_Assassino

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(Poeta_Assassino)

Acordou. Olhou para o lado da cama, agora vazio. Estava só. Só, perdido no mundo, perdido na Vida... Uma lágrima escorreu pela sua face. Sentiu frio. Medo. Raiva. Tinha abraçado o mundo, acolhido uma vida na sua triste e infeliz existência... Tornou-se feliz, descobrira o sentido, a sua razão de ser... Agora... Agora é como o Sol sem a Lua, o céu sem as estrelas, é um pedaço de carvão, vazio, sem alma... Pobre e só... Abandonado na corrida da Vida, abandonado num mundo que não o aceita, abandonado, sem ninguém, sem si próprio... Perdeu a sua chama, perdeu-se a si mesmo... Está perdido nos bosques profundos e obscuros dos recantos do seu interior... Antes, tinha tudo... Agora não tem nada... Sem certezas, sem razões... Na vã esperança de a encontrar outra vez decide pôr termo à sua própria vida... Decide acabar com este ciclo perpétuo, doloroso, triste... Ergue a faca num tom desesperado, lágrimas soltando-se dos olhos presos em memórias do passado... Fecha-os, tenta esquecer... Sabe que dentro em pouco tudo terminara... Não mais terá de sofrer, não mais passará horas sozinho no seu quarto antes cheio de vida e de alegria... Será apaziguado... Esse ardor na garganta, essa dor que o engole e que o leva a sítios a que não quer ir... Tudo passará... Tudo... O fim da sua tristeza... O seu fim... O fim de sonhos, de prazeres, o fim da Vida... Diz adeus ao quarto vazio, adeus à Terra que antes o acolhera e que agora o expulsava... Sem laços que o prendam a este globo azul, sabe que não fará falta a ninguém... Será mais um número nas estatísticas, mais um traço a riscar... A faca desliza pela sua pele até encontrar um caminho. "Já está" , diz, cuspindo o sangue que lhe chegava à boca... Cai na sua cama, esgotando-se em si a força que o faz viver... Decidiu morrer... Decidiu soltar-se das pesadas correntes da Vida... Alcançou a Morte... Descanso eterno... Sente uma dor... Uma dor que vai aumentando... Abre os olhos esperando encontrar algo novo, mas não... Vê novamente o seu quarto, a sua cama onde está deitado, a morrer... Olha os lençóis ensanguentados, encarnados no seu próprio sangue... Sabe que vai morrer... Sente um ligeiro arrependimento... "E se eu esperasse... E se eu ficasse..." diz para si mesmo... Tarde de mais... É tarde de mais... Tenta conformar-se com a sua escolha... E então, a dor que não parava de aumentar, a dor que se alastrava por todo o corpo cessa, pára... Não sente mais nada... Está livre... Soltou-se da sua Vida terrena... Prepara-se para o que vem... Solta a sua mente de estúpidos pensamentos e deixa-se levar pela brisa... Já não está Só... Simplesmente É...

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