Na calçada imaginava o sentido da vida, não mais num bar, agora
sozinha a caminhar sob o sol, sacolas na mão, no peito; ainda um coração
batendo fininho entre pulsações de dor... Meu lilás sentido
obscurecido, percebo que me escorrem pelas orelhas esfomeados por outra massa
encefálica. Vertiginosos vermes, quão espertos se tornaram...
Cobram-me a igualdade de outros seres, ignorando a subjetividade... Colocam-me
na legião de fascistas, perdidos e raivosos de armas na mão, como
se este fosse o sentido...
Fico agora a digitar linhas mortas sobre a tela colorida falsa, de uma máquina
que suga almas e me transporta para o silêncio seguro de meu quarto. O
telefone toca, não, não quero o contato externo, fico aqui, por
horas a digitar, imaginando o silêncio de meu corpo, cálido, por
tantas voltas ao mundo, à noite logo chegará e poderei deitar-me
novamente em segurança, não quero a voz a cobrar-me àquilo
que não entendo, aquilo que em grupais se torna loucura, mas em noites
quentes se mostra desfigurado, uma falsidade de palavras poéticas contrárias
às atitudes rústicas e invertebrais, moles... Não, não
é para entender.
Não cozinho mais, as panelas não suportam a frieza de minhas mãos,
as ervas mágicas, que tanto me seduziam, perderam o encanto e me abandonaram,
não vingam em meu quintal... pois o sol está frio, não
quer vida nascendo.
Hoje no ápice da idade, espero a morte e não a quero, mas a quero...
Talvez um refúgio seguro, um abraço incondicional, uma atitude
coerente e expressa de um corpo calmo e solístico... Um silêncio
apaziguador...Não, a paz não, ela não combina comigo.
O homem bom de Nietzsche, guerreiro a suportar as dores reais da vida, com os
obstáculos inventados pelo homem; com a promessa de felicidade, de acalanto.
A covardia imposta pelos poderosos, criações de palavras manipuláveis
introjectadas por nossa cultura, a troca: SE FORES BOM, NÃO SOFRERÁS...
E assim, se for boa, não sofrerei, se não for estarei condenada
ao abandono...
Não mais me banharei em águas límpidas de rios poluídos
e coloridos de dejetos humanos. Como é bom pensar, lembrar janelas e
visões por elas me dada, luzes da cidade noturna, alguém a apreciar
minhas formas, não as externas... Um bom gole de conhaque vagabundo e
a fumaça do charuto desenhando no espaço, ocupado, só por
ela...
Encerro em mim os meus atos... A dramaturgia barata e corrosiva de teus atos.
Acendo um incenso, respiro o perfume cravado no ar, narinas convalescendo, um
breve toque de esperança.
Neste domingo dominado pela dor pungente de sangue escorrido em algum lugar,
neste exato momento... Quem será? Frases copiadas e desconexas deste
contexto... Girar, girar como alucinógenos cristais plantados há
100 anos.
Pausar dentro do próprio silêncio chama de um isqueiro, ascendo
à morte e a deposito no cinzeiro, pêlos, pêlos... Transfigurados
nascendo de volta ao corpo... inflamando a dor corroída de um simples
momento meu...
Genética pura dos idolatrados assassinos mundanos do lixo atômico
me vem com reservas do NADA... Talvez guerrearei com o exército de moinhos,
com Dom Quixote no desespero da mente insana...
Reticências, asas à imaginação...
Obs. Meus lábios cerrados estão cortados e sangrando
(15 e 16 de Setembro de 2007)