Lena sempre morou e viveu naquele porto, muito cobiçada pelos marinheiros,
nunca deu bola a nenhum deles. Logo descobriu que o mundo é bem maior
e que a vida e é feita de atalhos. O tempo passa depressa e nossa bagagem
deixa pedaços ao longo do caminho. Sempre se parte; chega-se nunca, porque
a busca é constante, enquanto a vida corre nas veias.
Foi nessa busca que se apaixonou por Sérgio. Ele não tinha porte
atlético, nem era musculoso, na verdade, tinha gestos de primata, um
certo quê feminino no excesso de educação, no jeito de tocar
seu corpo e beijar sua boca. Um homem sem exagerado odor de macho, que cantava
suaves canções ao pé do ouvido. Não demorou muito
tempo para que a semente de uma nova vida se depositasse naquele ventre,
vigilante e amante. Só entende de amar...amar e doar-se plenamente, viver
o momento. Passou a sonhar com seu menino, leve como passarinho, ansiava acalentá-lo
ao colo, alimentá-lo no peito.
Numa tarde, seus cabelos vermelhos e esvoaçantes se colaram à
face molhada de pranto. Vê seu homem partir, talvez para sempre. Aperta
as mãos sobre o ventre para ter a certeza de que ali reside ao menos
um pedacinho dele. Sérgio pede-lhe perdão, não sabe viver
enclausurado. Anseia por novos portos, novos amores. Parte com as mãos
manchadas de culpa, sente-se um monstro por fazer aquela mulher sofrer tanto.
Nos dedos leva as impressões vazias, sem resíduos das apalpações,
sem as lembranças do corpo tocado e desejado.
Meses depois, uma ternura imensa permeia aquele coração saudoso
e sofrido. O amor se manifesta outra vez, de forma diferente e intensa. Ela
descobre nos olhos da filha os do amado. O passado estará sempre presente
em sua vida.