Na mocidade, experimentou de tudo. Foi rei e plebeu, foi guerreiro e herói.Carregou
estandarte em passeata, apanhou de militar, se expôs a perigos, teve o
corpo esfolado, a cabeça raspada, a vida ameaçada. Conheceu sãos
e insanos, teve amigos e inimigos,amou e foi amado, cicatrizou feridas, muitas
dores causou, fumou, bebeu, dançou...foi dançado.
Chegou o amor arrebatador, deixou a boemia. Levou marmita no trem superlotado,
esqueceu do violão e da cuíca. Chegava à noite, cheio de
cansaço, sua vida era trabalho, criança esgoelando, mulher esbravejando
de insatisfação.Tudo o que restou da mocidade, eram as lembranças
das rodas de samba e das mulatas gostosas, que o chamavam de bamba.
Setenta anos. À frente, muitas garrafas de cerveja vazias. No radinho
do bar, um belo samba dos anos idos. Todos ainda o cantam; foi sucesso nacional.
Só não lembram dele...o compositor.
Pôs-se a cantar bem alto...e bebia. Bebeu tristezas, a vida perdida, bebeu
o salário minguado, a modesta moradia, que era tudo...menos um lar. Bebeu
pelo suor, pela velhice, pelo tempo implacável, que não nos espera.
Lembrou a mãe morta, bebeu a defunta, bebeu ao mesmo tempo, o passado
e o presente.
Aquele homem jogou todos os trunfos com o destino. Perdeu tudo, até mesmo
a dama de espadas. Depois, jogou as garrafas vazias longe, deitou sobre os braços,
bebeu lágrimas, cerrou os olhos.
A morte bebeu o homem...