Tânia era uma mulher que vivia há muitos anos ao lado de um homem
sem formar com ele uma dupla, um conjunto, ou um par.
Após trinta anos de casamento, filhos casados, ela era um containers
de ressentimentos e mascarava suas carências caramelizando-as com calda
de chocolate e se empanturrando de doces e bolos, como se isso preenchesse o
vazio de sua vida.
Ao descobrir-se traída, segurou-se para não escorregar no limbo
de sua autopiedade. Engordou quase quarenta quilos. Chegou à obesidade
mórbida. Escondia seus atrativos físicos, que outrora chamaram
tanto a atenção masculina , com quilos e mais quilos de tecido
adiposo e peles caídas. Os braços se encurtaram e se arredondaram.
Não dava para definir onde acabava o queixo e começava o pescoço.
era um papo só.
Não sabe como, mas colocando o dedo na ferida, buscou a cura.. O seu,
era um casamento sem cumplicidade, sem carinho, sem choque de pele ao contato,
sem beijo na boca.. O sentimento de rejeição passou a ser um incentivo
para trilhar novos caminhos. Mergulhou fundo numa nova mulher, que aos poucos
foi surgindo das profundezas de um poço que parecia não ter fim
e chegou à tona.
Encontrou duas grandes companheiras nessa jornada: O seu próprio "eu",
a sua autoestima e sua médica ortomolecular, doutora Eloísa,
que a incentivou e ajudou. Começou a operação resgate,
transpassou a cortina de lágrimas e desamor em que vivera por tantos
anos.
Também surgiu um oásis no deserto da sua vida, um alguém
que a valorizou como mulher sem nunca tê-la visto. Tânia colocava
suas desditas e amarguras nos poemas que escrevia para vários sites da
internet. Seus sonhos, dores e anseios de ser amada, suas carências de
carinho.
Curiosamente, Paulo também sofria de solidão., também
escrevia e a temática de ambos era a mesma, as mesmas carências
, afinidades inúmeras.
Ele era viúvo, perdeu a mulher com câncer e sobrevivera ao sofrimento
por ter como meta principal o encaminhamento das filhas menores. Ele assumia
os dois papéis com inusitado amor , o de pai e o de mãe, não
aceitava substitutos . O amor homem-mulher foi esquecido por anos.
Duas almas sedentas e carentes, que não pediram, mas tiveram seus caminhos
cruzados pela tecnologia (ou por Deus?).
Com um espaço físico que os tornava tão distantes, Rio
e Brasília, e um monitor de computador que os aproximava tanto a ponto
de conseguirem vislumbrar no imaginário o brilho nos olhos, o toque de
mãos e bocas ardentes..
Só percebiam que não era tão longa a distância porque
podiam contemplar a mesma lua, as mesmas estrelas....
A venenosa autoestima de Tânia recebeu esse antídoto: as palavras
de afeto de Paulo, sua atenção e carinho, excelentes combustíveis
para um ser tão desmotivado.
A perspectiva de um encontro um dia, fez com que Tânia se esmerasse nos
cuidados com os cabelos, com a pele, com o corpo, já que a alma começava
aos poucos a se renovar e se preparar para amar novamente..
Ela se percebia a cada dia melhor, pois o assédio e elogio dos homens
era um sinal. Olhos mais atentos ou mais sensíveis descobriam nela a
beleza interior. Mesmo o homem sendo puro visual, deixando-se levar pela sugestão
do que seus olhos contemplam, alguns viam algo mais nela, talvez uma sensualidade
contida e pronta para explodir, ou sua capacidade imensa de dar carinho e amor.
As vezes se revoltava. Quanto tempo perdido! Muito de sua celulite foi produto
de abandono, sexualidade estagnada, esquecida. Chegou aos cinquenta anos
assim... Passou pela vida...não viveu.
Em tempo, jogou sua dor na lata do lixo, passou a dar mais atenção
à elastina que segura sua pele e aos poderosos aminoácidos que
rejuvenescem. Aprendeu a comer comedidamente. Não esquecia as recomendações
da doutora Eloísa: "Só água não tem calorias".