Bil Barros, árbitro de futebol, verdugo apitando, a exercer o poder com
gestos operescos. A mãe, coitada, é de todas, a mais xingada,
só porque o filho sopra ventos de fatalidade com aquele apito, que confirma
ou elimina o gol.
Em casa, tudo diferente. Ele dança conforme a música. Sua palavra
é sempre a última, somente para dizer "sim, senhora"
para Marinete, sua companheira há cinco anos. Se no campo, ninguém
corre mais que ele, em casa também. Basta que a mulher encontre respingos
na tampa do vaso sanitário.
No campo, responde com insultos às vaias, pedradas e maldições...em
casa, o pisar de mansinho, as palavras molhadas de carinho para ,na noite de
sábado, merecer desfrutar dos beijos de Marinete, de afagá-la
e dormir exausto entre suas coxas.
Raras vezes, sua vontade coincide com a do torcedor. Ele é o álibi
perfeito para todos os erros, todas as desgraças.
Aquele era um jogo especial. A final de um grande torneio. O árbitro
estava eufórico. Queria ser notado, que falassem mal, mas falassem dele,
queria sair no noticiário de esportes. Estava feliz. As malas já
estavam prontas. Sairia de férias com Marinete.Um mês nas praias
de Fortaleza!
Mais que nunca, Bil levanta as cores da condenação. Sacode-se
com cartões amarelos para os dois times. Um gol do Custódio! Que
vontade de anular! Não dá! Todos viram que ele fez mesmo o gol
e foi até bonito.Esse jogadorzinho,
careca e dentuço mora no seu prédio, mas vive de olhares atravessados
para as pernas da Marinete.
Em dado momento da partida, Custódio dá uma rasteira num jogador
do time adversário. Bil, não reluta e apita, saculejando o cartão
vermelho. O jogador sai do campo, mas não sem antes enviar ao árbitro
um olhar debochado e sarcástico.
Bil chega em casa feliz. Basta pegar sua mulata e pé na estrada. Silêncio.
Tudo escuro. Sobre a mesa, um cartão vermelho: "Cansei de você.
Viajarei com o Custódio. Vê se me esquece!"
No dia seguinte, a foto em todos os jornais, primeira página: Tentou
jogar-se do
vão central da ponte Rio-Niterói e foi salvo pelos bombeiros.