Mais uma banana?! Pensava indignado o macaco. Encostado à grade observava
como as pessoas riam dele, enquanto ele não achava graça alguma
nisso - e o pior é que não podia falar, mas... Podia defender-se.
Cansado de bananas e amendoins começou a revidar os insultos simiescos
e após descascar as bananas e deixar o público hipnotizado, num
movimento teatral jogava as bananas de volta estatelando-as na cara dos incautos.
Não funcionou, porque o povo ria mais ainda.
À noite, quando o vigia trocava de turno e não passava por lá,
o macaco planejava sua fuga escavando um túnel sob a cela. Destemido
cavava com as próprias mãos - afinal estava só - seu último
companheiro de prisão morrera de saudades da sua terra. Ah! Que saudades
da floresta africana de onde fora roubado. Sem falar na doce Chiquinha, que
morreu comendo uma banana envenenada, que algum infeliz lhe deu.
Teobaldo, um chimpanzé negro azulado, não teria esse fim - ele
era muito forte e não descansaria até voltar para sua casa. Ele
era muito esperto - o veterinário costumava dizer que seu Q.I. era acima
do normal, por isso, Teobaldo sabia que ninguém o tiraria de lá
a não ser para torturá-lo em experiências de laboratórios,
como já suspeitava há algum tempo.
Triste, questionava a simiesca necessidade de um humano (completamente feio
e pelado - pareciam-lhe peixes lisos) em divertir-se com a sua prisão
e desgraça. Ele lera algo sobre Dante - portanto: aquilo era dantesco
- até crianças eram ensinadas e rirem da desgraça alheia.
Hum, pensou, queria ver se fosse ao contrário...
Num dia de tempestade em que a energia falhou, Teobaldo se enfiou pelo túnel
e se libertou. Furtivamente esgueirou-se pelas beiradas indo parar na rua. Sequer
ligaram para ele - era tarde da noite e alguns bêbados e drogados achavam
que era alucinação.
Correu como nunca - sabia do risco de vida - e chegou ao aeroporto internacional
quase morto e esfomeado. Mesmo assim, não esmoreceu.
Nosso herói enfiou-se no setor de carga animal dentro de uma caixinha
de viagem própria para transporte de bichos e segurou a respiração
até sentir que era carregado pelas esteiras até o avião
com destino à África.
Teobaldo desmaiou de fome e cansaço e quase foi dado como defunto pelo
homem, que estava na mesma situação em que ele e o sacudia com
curiosidade. Abriu os olhos e achou que estava morto - tinha um homem magro
e triste olhando com piedade para ele. Oh! Pensou, ninguém o olhara com
respeito e pena até agora. O homem, que deveria estar sofrendo muito
porque estava passando frio extremo e fome no setor de carga animal, partiu
o que seria seu único alimento: um pão velho e repartiu-o com
Teobaldo.
O homem chorava e lhe contou sua história: era um fugitivo da prisão
que cumpria pena por algo que não fizera - fora usado como bode expiatório
e ridicularizado atrás das grades - tendo servido de palhaço numa
história de roubo, sem direito a defender-se, porque ninguém acreditava
nele. Aí, cavou um túnel e fugiu enfiando-se naquele avião
como clandestino...
Chegando ao destino, Teobaldo achou um jeito de escaparem juntos, pois aquele
aeroporto parecia mais um descampado do que outra coisa. O macaco levou o homem
para sua casa na selva.
Não dá para imaginar a felicidade dos pais de Teobaldo e da menina
Chica, agora uma moça feita, que lhe fora prometida em casamento. O homem
que agora estava impedido de voltar a viver na sociedade tão humana,
foi agregado à família dos seus ancestrais e ajudou a plantar
mais bananeiras, numa forma de retribuir-lhes o amor e a amizade entre as espécies
por mais diferentes que fossem.
Teobaldo, agora macaco velho, contava essa história para os netos catando
piolhos debaixo de uma bananeira dourada e lhes falava da lenda de um homem
que um dia fora humano.