Apenas um olhar, é o bastante. Uma simples sugestão é
faísca suficiente para deflagrar o fogo que consumirá todos os
limites e barreiras. A situação mais inocente é capaz de
desencadear pensamentos lúbricos e acontecimentos tórridos. A
tentação é serpente insidiosa que ronda incessantemente,
acompanhando cada passo da presa, à espreita do menor sinal de fraqueza.
O desejo subjacente deixa o ar eletrizado e incita ao pecado. O proibido acena
sinuoso com promessas de concupiscência morna e sedutora. O momento decisivo
é imperceptível, a presa nunca estaca em considerações
sobre ainda ser possível retroceder - até porque, a esta altura,
daria qualquer coisa para finalmente transgredir. Não há como
perceber o momento exato em que a guarda é baixada e é dado o
primeiro passo em direção ao abismo. A ruína chega como
picada de inseto venéfico: silenciosa, veloz e urticante, e apenas o
princípio do sofrimento. Aparentemente inofensiva, não atrai maiores
atenções, nem suscita maiores cuidados, enquanto instala a devastação.
Lentamente toma conta de cada veia e cada pensamento, imperiosa, insaciável.
Os sintomas são insopitáveis, enlouquecedores. O sono é
acompanhado de suores profusos e delírios turbulentos, a vigília
é dominada por intensa consumição. Corpo e mente ardem
por algo pouco definido, mas imprescindível, que corrói o juízo
e pulsa vertiginosamente no peito. Algo que coça, inflama, prolifera
por toda parte. Agonia vibrante e entorpecente, fustigando a pele e a entranha,
assanhando as fantasias. Uma dor gostosa, clara escura, doce amarga, quente
fria. Um oxímoro incandescente e enregelante. Feitiço voluptuoso
que aprisiona o pecador e o afunda em embriaguez viscosa e salaz. Dura momentos
eternos e inebriantes, mas, o que é quase paradisíaco e quase
infernal, se converte em desgraça completa quando a transgressão
é revelada. Por mais que o desafio tenha sido suculento e tenha provocado
as mais sublimes sensações, a perdição é
o destino daqueles que mordem a maçã.