Verão de quarenta graus na Cidade Maravilhosa. Como sempre, praia cheia,
corpos bronzeados e muito bem cuidados. Cada detalhe bem trabalhado para ser
exibido na vitrine do calçadão.
Os dois amigos ocupavam sempre a mesma mesa naquele bar da orla. Admiravam os
corpos esbelto, protegidos por minúsculos pedaços de pano, quando
surgiu uma forma perfeita caminhando na direção do bar, chamando
a atenção de todos por onde pisava. Cabelos cor de ouro, que causavam
inveja aos raios do sol, sua pele trazia o bronze que nem Salomão conseguiu
para ornar as colunas de seu templo. O corpo com certeza serviu de molde para
quem fez a Vênus. O calor ficou mais acentuado e o verão tornou-se
mais verão com a presença daquele corpo que desfilava entre a
praia e o calçadão.
Os amigos engoliam o chope como o enfartado o remédio para o coração,
e foi entre um copo e outro que um deles chamou a atenção para
o par de seios daquele corpo. Comentou que aquilo não era natural. Somente
poderia ser de silicone; esculpido em alguma mesa de cirurgia, por sinal muito
bem feito, uma verdadeira obra de arte.
O outro riu e falou que o parceiro nada entendia de mulher. Achando que o outro
queria diminuí-lo, ele quis saber por que ele achava que aqueles seios
eram naturais.
- Ora; respondeu seu interlocutor; qual mulher esclarecida, nos dias de hoje,
usaria este artifício, sabedora dos vários perigos que esse tipo
de prótese pode acarretar. Todos os dias os jornais noticiam acidentes
que ocorrem com os silicones implantados nos seios; casos de pessoas que ficaram
cegas, sobre cadeira de rodas, que tiveram parte de seu corpo paralisado; atrofias
nas partes genitais ou que perderam totalmente a sensibilidade para alcançar
o orgasmo.
Fez uma pausa para pedir ao garçom mais dois chopes e uma porção
de tira-gosto. Assim que foi municiado, voltou a discursar.
- Pois vou lhe contar que tudo isso que estou falando não é de
ouvir falar. Me baseio nos fatos que acompanhei pela imprensa e o marido da
prima da irmã do cunhado de meu irmão é médico,
que nos relatou diversos casos, inclusive o que aconteceu com a irmã
de um amigo seu: uma dessas bolsas tinha um micro furo e o líquido foi
vazando e penetrando em sua corrente sanguínea, acarretando sua
perda de visão e afetou sua fala. Hoje, ela não só está
arrependida, o que é mais que normal, como acha que não valeu
o preço para estar bonita como as mulheres da televisão e esses
modelos que vivem aparecendo nas revistas.
O amigo ouvia tudo atentamente, olhando para os olhos do outro.
- Pelo que vejo você é contra o uso do silicone.
- Claro! Respondeu amigo.
- O que você me diz das milhares de mulheres que, por terem seios pequenos
em relação ao corpo que possuem, fazem horas de análise,
gastando rios de dinheiro nos divãs, para aceitar o que a natureza lhes
deu. Que têm vergonha de despir-se na frente do homem que gostam, fingindo
não ver seus amados olharem os seios fartos que desfilam diante de seus
olhos. Que têm vergonha por não poder usar qualquer tipo de roupa;
ver toda propaganda voltada para os seios fartos, volumosos, tenros e macios
feito peito do peru assado no Natal. Você já viu os biquínis
e sutiãs expostos nas lojas de departamento feminino ou nas lojas voltadas
para este segmento? Com certeza que não. Pois eu vou te falar por experiência,
pois já fui casado com uma mulher de seios pequenos, e sei o quanto eles
contribuíram para minha separação, por ela se achar inferior
às outras. Cansei de ter que comprar sutiã, com ela, na seção
infantil das lojas, pois era o único lugar onde achávamos o seu
tamanho. À noite, fazer amor com a luz acessa era proibido. Acho que
estou muito bem qualificado para falar sobre seios, peitos, mamas ou tetas.
Porém, eles que estavam voltados para suas defesas a respeito do natural
ou artificial, quando lembraram do objeto de sua discussão, voltaram
os olhos para aquela forma perfeita e a viram entrar no banheiro masculino.
Olharam-se, pediram mais dois chopes, e voltaram os olhos para a praia.