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No sexto dia passado no cárcere foi acordado a golpes de vara.Reconheceu
entre os agressores um dos magistrados locais,pela primeira vez ficou verdadeiramente
espantado afinal o que alguém de tamanha importância estaria fazendo
ali?Sem poder comer ou mesmo lavar-se foi escoltado de volta à sua casa.Teria
de ir a pé com uma pesada pedra amarrada na cintura.Cansado de carregar
pois a arrastar como ordenaram seria pior tornando a marcha ainda mais lenta
ele a soltava ou a deixava simplesmente cair,os soldados embora soubessem ter
a obrigação de o livrar da carga ao perceber não ser ele
capaz de tal esforço ao invés de ajudar o lançavam ao chão.
Chegando Liu quase desfaleceu.As árvores haviam sido cortadas,o jardim
estava arruinado e até as gaiolas,portas e janelas da casa jaziam no
chão despedaçadas.Lá dentro não havia mais nada
tudo tinha sido roubado a não ser o rolo de linho e uma caixa onde ainda
restavam barbante e lápis surpreendentemente lhe permitiram os levar
consigo.
Somente agora soube que o acusavam da morte do filho de uma autoridade da região.Como
de forma inequívoca tudo depunha contra ele seria executado em poucos
dias.Foi levado de volta até ali apenas para um interrogatório,não
se tratava de um julgamento mas apenas de uma forma de se saborear a vingança.Nada
soube responder ao lhe perguntarem sobre as manchas de sangue no chão
e nas paredes caiadas.O jovem foi degolado e a arma do crime seria o velho facão
enferrujado encontrado num dos cantos da casa.Retornavam agora.Em redor logo
se formou um pequeno cortejo.Alguns curiosos,uns poucos a se lamentar e muitos
culpados.
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Naquela província havia um homem conhecido por sua crueldade para com os pobres era o cobrador de impostos para ele não importava a difícil situação dos camponeses,como ave de rapina se precipitava sobre todo o grão e toda a prata.Ora isso provocou o povo até o limite da sua resignação e cansados de serem tratados como animais passaram então a conspirar.Mas a pena pela acusação de tramar contra alguém tão poderoso desencorajava mesmo os mais valentes imagine então realizar tal intento.Um terror quase supersticioso tomava os corações daquela gente.Dentre todos eles o mais ardiloso,a intriga e a infâmia também prosperam entre os humildes,os convenceu a escolher outra vítima e para terem certeza da impunidade seria preciso eleger alguém como bode expiatório.Estava decidido então.Matariam o filho do seu inimigo,este costumava frequentar a casa de Liu cuja fama já se propagara muito além da pequena cidade.Vê-se agora, o seu dom foi a sua ruína.
* * * * *
Seriam executados na manhã seguinte,Liu simplesmente sorria ao ouvir
qualquer alusão a isto.Já Wang estava intrigado com a atitude
do amigo.
-Você é estranho,estamos para morrer e consegue sorrir assim sereno
como uma criança.
-Tem então alguma ideia?
-Não e nem você.Não há meio de escapar e criminosos
como nós nunca podem esperar por clemência.Desculpe Liu acredito
em sua inocência mas os fazer voltar atrás agora é inútil
como suplicar pela piedade de um tigre.
-Sabe como se dá caça aos tigres Wang?
Julgando Liu aflito a ponto de dizer coisas sem sentido ele preferiu o silêncio.
-Quando o Filho do Céu resolve tornar menos tediosos os seus dias sempre
tomados pelo cerimonial e pelo peso de tantas funções vai ao campo
levando consigo muitos homens,caçadores portando armas de fogo ou arcos
e ainda outros com tochas mas todos eles são inúteis sem os encarregados
pelos grandes rolos de linho.Os atiradores são apenas uma garantia contra
qualquer ataque súbito,matar presa tão rara e cobiçada
seria indigno e tão secundário quanto o destes é o papel
dos portadores das tochas.Os homens do linho tem à mão largas
e compridas faixas desse tecido especial e com ele tão logo encontram
local adequado,geralmente uma clareira,armam uma emboscada estirando quatro
delas no solo formam um grande quadrado ao qual se segue outro e outro e mais
outro.Enquanto isso os demais afugentam o tigre na direção dos
captores.A presa logo se aproxima,então usando de cordéis elevam
os lados da armadilha.A fera recua mas as faixas suspensas formam uma espécie
de caixa e a cada tentativa de se libertar consegue apenas se internar ainda
mais no labirinto.
Wang balançava a cabeça incrédulo e de lábios entreabertos
ameaçou dizer algo,Liu o impediu.
-Aí você me dirá que é apenas tecido quase tão
frágil como o papel.O tigre porém ignora a natureza das muralhas
e julga estar encerrado entre paredes espessas e intransponíveis,algumas
vezes tenta resistir rugindo ou rodopiando em torno de si mesmo desesperado
mas não ousa contudo se lançar contra as paredes que se aproximam
e o envolvem,assim derrotado se deixa apanhar facilmente.
-Liu...
-Me tomam por um velho incapaz...Serão surpreendidos como o homem ao
acordar no campo e que sozinho se depara com a morte,serão esfolados
sem poder oferecer a menor resistência.
* * * * *
Manhã.Assim como estavam foram levados para o pátio.A cela ficara
vazia a não ser pelo linho retalhado e pelo monte de palha.No cadafalso
os condenados trocaram um último olhar,todos na multidão esperavam
ouvi-los implorar isto geralmente os divertia e as chicotadas dos carrascos
empregadas para os fazer calar eram uma preliminar do espetáculo aguardado.Eles
nada disseram estavam firmes e Wang mais atrevido chegou mesmo a assobiar causando
temor em alguns por ser esse um mau presságio.
Súbito não sentiam mais o solo sob os seus pés e ao contrário
do costume logo que os corpos penderam presos nas cordas os carrascos pularam
em seus ombros num procedimento conhecido entre eles por cavalgada,os gritos
de euforia se faziam ouvir novamente.Agora no chão puxaram para trás
os longos cabelos das vítimas e cortaram as suas gargantas.Para impressionar
as autoridades presentes resolveram esquartejar os corpos ali mesmo,numa dança
macabra deceparam as cabeças dos prisioneiros com os facões e
os desmembravam.Mas logo ficaram assombrados com o fato de não haver
sangue,eram como os bonecos de argila feitos para as crianças e assim
como eles se transformaram em pó.O medo tomou a todos logo não
havia mais ninguém na praça de execuções.
Ainda maior foi o horror sentido pelos guardas da carceragem.Uma espessa e fétida
névoa negra tomou conta do local,viram então emergir da antiga
cela de Liu duas bestas com garras e presas enormes,chifres bifurcados e corpo
de serpente que fugiram rompendo as grades.
Logo a notícia se espalhou pela província,no princípio
sem muito crédito pois tais histórias eram tão comuns quanto
mentirosas.Restava apenas o inexplicável desaparecimento de várias
pessoas naquela e em outras cidades deixando aflitas muitas famílias.Não
se podia vislumbrar impunemente o terror provocado por aquelas duas nuvens negras
no céu mensageiras de vida e morte a pairar sobre os campos deixando
o seu rastro de sombra nos arrozais.