A Garganta da Serpente
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Sorriso de Ana
(Janaína Behling)

Eu Fico com Thomas Mann, mas, sobressai 'Pelas Mãos de Alice' e não Ana, a dos enfermos. Acho e perco a Literatura no meio da gente. Assim mesmo, com letra maiúscula. Estranhos os literatos. Mesmo que eu soubesse o que quer que acreditem, não sei, tudo é linguagem e para os mais rasos bastante mesmo, basta chamar de 'comunicação'. A lágrima é desejada. Teorias.

Eis que a sandália ficou deixando marcas no pé. A manteiga perguntava se cheguei há muito tempo, pão doce na mesa. Outros pães. Aqueles que não comíamos , e sabíamos que estavam frescos, recém chegados da padaria, da esquina, da casa, do lar. Importante é o lar. Todas elas dizem o mesmo.

Você quer o quê? Uma história? Um conto? Uma provocação? Uma das minhas?

Então ela abre um sorriso largo.

As frutas e as verduras já estavam todas em época de cheia, de colheita, e era perturbador ter uma plantação de abóboras e não dizer que, de fato, mesmo numa fazenda virtual, o colorido das hortas é uma coisa magnífica, magnífica mesmo. Ela queria uma história, me pedia, pedia para que eu lesse e relesse e contasse sua história, isso e aquilo, porque eu pedia que me pedisse. Os modos de ganhar presentes, tais como cercas, árvores com frutas lindas, porque a internet é sem graça você não acha? Frutas lindas fazem toda a diferença. Incrível os modos de se ganhar e receber presentes.

E eu não sentia o cheiro de nada. Só imaginando. Facebook. Farmville. Essas coisas. Pensava no quanto fazia falta a água. Como não inventam água em mundos virtuais? Regar, ver a terra ficar preta, cheia de água? Sequer colocaram regador na lista de pedidos para o futuro, como as carriolas, as casinhas, os bangalôs? E nada daquilo me fazia falta, até que vi o alaranjado das abóboras e a mistura com as cores de pés de berinjela, e as árvores, e os coelhos e os cavalos dos vizinhos. Ela ri de meu recado para Susan e o Thomas Mann diria o seguinte: estão todos doentes, todos.

O sorriso também é virtual e agora? Sem mais nem menos, Letícia puxa essa pergunta da cintura.

Eu digo que beleza é beleza em qualquer lugar, a resposta e dois isqueiros na mesa, perto das xícaras modestas de café sem o pão matinal prometido pela cozinha hoje cedo. A Lê sabia mais de mim que a minha mãe, coitada, a última a saber. A Letícia sabia o quanto. Sem mais nem menos, esfrega na minha cara as fragilidades do corpo e as palavras soltas e os arremessos de parcerias pela janela e os corredores franquiados da imaginação que ri de mim.

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