João Queiroz era um grande sonhador, sonhava acordado, lembrando das
bagunças feitas na infância e buscava na memória as férias
passadas no sitio dos avós. Sonhava poder ver novamente vaga-lumes piscando
após o sol se esconder. Mas, sabia que não podia mais encontrá-los,
pois, a profusão de luzes coloridas que hoje em dia clareiam a noite
e fazem-na brilhar como se ainda fosse dia, apagaram aquelas luzinhas que piscavam
bruxuleantes por sobre os campos floridos da primavera. Aliás, isto também
lhe deixava entristecido, pois também já não podia encontrar
com tanta facilidade campos floridos como os que em sua infância alegrava-lhe
os olhos. Ele podia perceber que as cidades haviam crescido e avançaram
sobre os campos, os mesmos campos onde outrora correra, como um potrinho afoito
numa busca intensa pelas brincadeiras que hoje seu filho nem sabia que um dia
existiram.
Ao cair da noite, quando estava lá no sitio, passando as suas férias,
ficava observando o céu e contava estrelas, naquela imensidão
que parecia não ter fim, e era como um grande quadro negro, salpicado
de giz.Algumas ainda ficavam piscando seu prateado, outras eram vermelhas e
muitas eram azuis e eram tantas que logo João perdia a conta.
Agora estava a imaginar, que talvez ainda existissem lugares como aonde passava
suas férias na infância, mas, as pessoas que hoje vivem lá,
já não querem contar estrelas, nem correr atrás dos vaga-lumes,
pois tem a TV, o vídeo-cassete ou o DVD, o forno de micro-ondas e então
preferem um filminho holliwoodiano que se aluga em uma locadora qualquer, estouram
umas pipocas no eletrodoméstico e já não tem nem mais tempo
para ouvir as assustadoras histórias de mulas-sem-cabeça, sacis-pererê
e das onças bravas das caçadas que o seu avô sempre tinham
para lhe contar.
Deitado em sua cama, no apartamento apertado daquela cidade barulhenta, fria
e tão concreta, se entregava a reminiscências, e sua memória
rebuscava os sabores de sua infância e imaginava que, provavelmente muitas
pessoas já nem se lembravam do sabor dos bolinhos de chuva lambuzados
de açúcar com canela, dos bolos de fubá com coco ralado,
doces e compotas e outras receitinhas de sua avó que ele às vezes
comia até mesmo quente, com uma gulodice que até queimava a língua.
E quando o sono já se aproximava, depois de tanto sonhar acordado, chegava
a triste conclusão que tudo aquilo não passava de divagação
e elucubrações de uma mente utópica, podia viver sem estas
coisas, afinal o progresso já havia se instalado e tinha que avançar
cada dia mais, pois o universo aguardava até ansioso , pronto para ser
conquistado e certamente no espaço sideral não haveria lugar para
o fogão de lenha da vovó e as onças bravas das histórias
de seu avô e muito menos para vaga-lumes que não conseguiam sequer
se manter acesos por uma noite inteira , e ficavam acendendo e apagando como
um sinal luminoso em uma esquina movimentada da cidade grande onde morava .