O lixo permanecia ali, fermentando, remoendo, esparramado.
Sua estrutura desarrumada criava seu corpo. Mas, estava sempre se renovando,
se vestindo de novo. Decoração rebuscada, barroca.
Em sua diversidade, mantinha, entretanto, sua personalidade.
-Olha lá o lixo! - dizia alguém.
Assim, o lixo tinha existência na vida. Era reconhecido, respeitado, temido
- O que sairá dali?
O lixo não era o fim da vida, mas o seu recomeço. Ele parecia
demonstrar que a vida não tem fim. O lixo nunca era o fim. Dali a vida
recomeçava, organizava-se novamente.
O lixo era uma usina a germinar vida!
Ratos, vermes, pés humanos, todos brotavam do lixo. E, o lixo, envaidecido,
sorria sarcasticamente para os homens.
-Eu te aguardo! Eu te aguardo!
Nele, o que era enterrado era o orgulho, a prepotência e o conservadorismo.
Assim, o lixo mostrava sua força viva, seu poder e seu acolhimento. Isso!
O lixo nunca era preconceituoso, discriminador. O lixo era democrático.
Para ele não existia diferença entre o pobre e o rico. Todos eram
futuros lixos. Ele estava ali, paciente, mas voraz.
Tinha uma estética diferente, exótica, livre. O lixo
era livre, franco, aberto. Porém, implacável.
Era também sensível, mutante e eclético. Ele não
consumia os homens, não destruía a vida, não acabava com
a beleza. Antes, o lixo ressuscitava os homens, aninhava vida, criava nova ética,
novas formas.
Sua existência era como um aviso bondoso: a esperança existe! Basta
ir fundo!