A Garganta da Serpente
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Desencanto

(Geraldo Crespo)

O diminuto vasa expande a grandeza de flor Ainda ontem minhas lágrimas forcei sobre suas pétalas A água que esvai sobre a terra talvez não seja tanta. Como poderei aguar minhas flores? Até quando terei lágrimas para matar a sede? Até onde poderei seguir quando o sol queimar minha pele e não houver sombra para o meu conforta. O meu desencanto parece uma erosão em meu peito.

Quisera eu que a beleza da lua, a grandeza das estrelas ofuscassem a soberba tirania dos homens. Quanta fumaça ainda poderei ver? De quantos pulmões vou precisar? Navego num rio a na imprecisão das encostas não sei se verei o mar. Meu pequeno barco encalha e entre garrafas pet, me arrasto sobre restos de sofá das Casas Bahia. Na certa foi minha tia, ainda penso.

Devo assar o piau que agoniza dentro da carcaça do wolksvagen brasília? Talvez meu rio não chegue ao mar. Meu canto sofrido ecoa entre fumaça, fuligem e chaminés que vomitam a gana de homens vis. Se meu rio não tem mais água para choramingar, talvez devamos chorar até que as lágrimas o encha. Em Iímpidas paragens quero pescar meu peixe, o suficiente pra saciar minha fome. Mas a fome é tanta...

A suprema destreza da vida parece não suportar a ganância. O que era belo, tornou-se um mar de flagelo. A minha retina dói. Não tenho a força dos heróis. Vou preciar de você. Talvez você vá precisar de mais alguém e este alguém... Ainda não aprendi a acreditar nos homens de bem. Acho que sou um homem de mal. De mal com tudo, pois meus olhos inflamam, a minha garganta aperta por tanta mentira na cara da oligarquia.

Me falaram de um dia melhor. Me falaram de um alvarecer esmeraldas. Mas quando acardo, parece ser o mesmo dia. As nuvens me parecem negras. Este ar me sufoca. Não lembro do canto dos pássaros que em minha janela eu via. Onde eles estarão? Se não retornarem, talvez eu morra de tédio. Não vejo televisão. Vou singrar por este mar de solidão. Será que meu rio secou por tanta água que gastei para lavar a maçã do hortifruti? Quem sabe o milho que comi era transgênico. Essa dor em meu peito, deve ser pesticida...

Sinto na boca um gosto de tungstênio. Uma ânsia de energia me recobra os sentidos e até penso que vou sobreviver. Por um lapso do tempo, ganho forças e já não fraquejo tanto. Quero soerguer?me a ponto de tocar as estrelas. Quem sabe eu possa voar e encantrar os pássaros. Quem sabe eu possa rever meu rio e navegar até o mais límpido e azul oceano dos meus sonhos...

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