... e a menina vivia enfurnada num castelo de silêncios e as presenças
contínuas se confundiam nas pausas onde os ruídos perturbavam
um inaudível solilóquio.
As atenções se voltavam para os eventos como se a dinâmica
fosse à alma das substancias e tudo só existisse em movimento.
Aquela menina habitava um universo de silêncios, seus olhos investigavam
os brinquedos com efêmera curiosidade e circundavam o ambiente num exercício
de reconhecimento.
Buscava um ponto discreto e se voltava a observar formigas ou coisa que o valha.
Seus olhos não evitavam os olhares apenas transpassavam-nos como se as
pessoas fossem translúcidas e seu interesse se localizasse adiante.
Algumas pessoas se recordam de ter flagrado algum sorriso quase sempre associado
a jogos com pedras e bonecas inertes, que sequer possuíam nomes, como
das meninas na sua idade.
Ela vivia uma existência secreta que escapava das atenções
e remetia a interesses inatingíveis e indevassáveis.
Assim sem muito alvoroço a menina desapareceu e levou com ela toda reverencia
por um silencio que trazia em si. Ficou evidente toda a solidão que aquele
alarido sem medida trazia para aquela casa. Os olhos procuravam-na nos seus
cantos preferidos, enfim perceberam a ausência das bonecas e a rota das
formigas que agora habitavam a casa sem governo.
As pessoas conversavam mais alto como se o volume de suas vozes pudesse sufocar
a força aterradora daquele silencio. A televisão rugia num transe
lisérgico e inundava a sala com sua solidão pasteurizada, imitava
um pretenso dialogo que no fim da noite apenas deprimia e não estancava
a agonia.
Todos seguiam condenados pela força daquela ausência e viviam esta
falta com a retidão de justa sentença, era necessário que
houvesse justiça e a paz era o retrato da menina sobre o criado mudo
aos quatro anos - duas semanas antes de partir.