Diversas vezes ela se via à beira de um penhasco, prestes a pular mas
sem saber qual pé usar pra dar tal passo.
Mas enfim ela se joga, e mal sabe qual pé usou. Impulsionou o corpo pra
frente o máximo que pode, para não bater nas rochas.
O dia era nublado e a hora era por volta das 18. O vento era frio e lhe cortava
as maçãs do rosto sutilmente as corando. Chegava a ser agradável.
O tapa que sentiu quando bateu na água é que não foi. Era
como se seus ossos tivessem sido fragmentados. E depois, já envolvida
pela água, era como se sua pele fosse mármore e seu sangue tivesse
cansado de correr e parado nas veias. Os olhos olhos se fecham e o pesar que
se sente é de que todo o cansaço de uma vida está todo
em você naquele instante.
Um grito ecoa em sua alma.
"Respire!"
Mas o pulmão só encontra água. Um segundo na superfície.
A adrenalina dispara seu coração, mas a caimbra encontra suas
pernas,os braços doem, e a gravidade fica mais pesada ali e a puxa para
baixo quase que pelos cabelos.
Então escuta outro corpo que se atira nas águas geladas e escuras.
O mar tem medo desse outro corpo.
Ele não é fraco como o dela.
Não pense nisso como suicídio, ela sabia que alguém a iria
salvar de si mesma.
Ele a leva em seus braços para fora das águas turvas, manda o
vento parar e apenas com um toque lhe une os ossos, tirou a sua frieza de mármore,
dá cor e vida aos seus lábios pálidos e sopra fôlego
de vida novo em suas narinas.
E enquanto ela ainda tinha os olhos fechados Ele a abraça encostando
seu ouvido no coração dEle, e canta sussurrante incansáveis
vezes:
"Ah, meu pássaro falante... apesar de suas penas serem esfarrapadas
e enroladas eu amarei você por todos os seus dias até que seu fôlego
deixe sua delicada moldura."