"A VINGANÇA É UM TIPO DE JUSTIÇA SELVAGEM"
F. BACON. ( FILOSOFO INGLES 1561- 1626).
(Dedicado a Edgar Allan Poe)
A cama estava confortável, macia até demais, sentiu que não
era o leito dela, alguma coisa estava errada. Abriu os olhos em uma tentativa
de que o que pensava não fosse verdade, mas era. Não estava em
seu quarto! Levanta num sobressalto e olha ao redor, o cômodo é
circular, o teto oval, parecia um daqueles cenários americano de mau
gosto e incrivelmente artificial.
A cama era de ferro trabalhado, azul claro, a coberta era vermelha, bem vermelha,
o lençol cor de rosa, choque, o travesseiro era branco mármore,
estava usando um pijama com desenhos infantis, Turma da Mônica, uma penteadeira
com um espelho e com poucas coisas sobre ela: um pente, uma escova, alguns perfumes,
um banquinho para se sentar e só. Uma cômoda de madeira de lei
muita bem polida, com quatro gavetas, uma escrivaninha simples, com uma gaveta
em cada lado, com uma cadeira igualmente simples. As paredes estavam cobertas
com papel de parede com orquídeas amarelas, e no fundo uma janela de
madeira ampla e fechada, atrás dela um cenário falso de um sol
com uma planície que da para algumas montanhas. Na frente da cama uma
porta vermelha de madeira fechada. Nada era o que parecia ser. Tudo era falso!
Levanta. Calça as sandálias de ursinho. Vai até a porta.
Trancada, como supunha! Tenta uma, duas, três vezes até que desiste.
Fica encostada nela por algum tempo, começa a fazer o reconhecimento
do quarto. Cama, de cima em baixo, nada de mais. Penteadeira, nada! Cômoda,
nada! Escrivaninha, nada! Janela, nada! Parecia que estava em uma cela. Tentou
a janela mais uma vez, estava bem trancada. Era forte de uma madeira bem resistente.
Sentou na cama, levou as mãos à cabeça e começou
um pequeno choro, não imaginava que tudo isto iria acontecer de novo.
Não com ela, não de novo. Alçou a cabeça, viu que
nada tinha saído do lugar, sabia que ele estava observando em algum lugar
de alguma forma, mas onde? Por que estava fazendo aquilo de novo, por que? Antes
tinha conseguido se livrar tinha vencido, mas ninguém acreditou em sua
história, ninguém! Estava gora novamente presa por um homem com
problemas, mas será que era o mesmo. Era outro, um grupo de maníacos,
quem?
Uma armadilha era uma cilada que tinha uma saída, tinha encontrado antes
encontraria agora. Uma questão de tempo até ela encontrar, o seu
erro foi tê-la subestimado antes, ele com certeza iria cometer o mesmo
erro de novo. Tempo, era uma questão de tempo! Ela teria este tempo?
Enquanto meditava, um envelope branco foi atirado por debaixo da porta. Levantou-se
rapidamente e foi pegá-lo, verificou primeiro se tinha alguma inscrição
do lado de fora, nada. Abriu-o, um bilhete dentro escrito: ESTAVA COM SAUDADES.
Baixou os braços desfalecida depois de ter lido o conteúdo, sabia
que era ele. Tinha certeza! Agora realmente era uma questão de tempo.
Estava atirada em cima da escrivaninha, pensando em alguma coisa para fazer,
o sol, artificial, já começava a ser substituído por uma
lua também artificial. Parecia um daqueles teatros mambembes em que o
cenário é feito com cuspi e muita criatividade. As cores eram
berrantes, extraordinariamente berrantes, de maneira a aparecer com os filmes
antigos da Tecnicolor. Tentava montar o quebra-cabeça que se encontrava
a sua vida, de como era antes, de como tudo começou. Ela tinha ficado
em uma casa de campo, ou melhor, ele montou um cenário para que parecesse
que era uma casa de campo, na verdade ela estava em um prédio afastado
do centro. Nunca ficou sabendo ao certo o que ele queria dela, nem sabe direito
se era ele ou eles. Agora ela acorda em um quarto que parece que foi feito para
uma criança. O que ele queria desta vez? Mexer com a sua mente? Com o
seu corpo? Com os dois? O que queria de verdade? Sua divagação
não a fez notar imediatamente mais um envelope branco atirado por debaixo
da porta, quando notou foi direto pegá-lo, abriu estava escrito: primeira
gaveta da cômoda. Olhou para o móvel desconfiada. Como ele pode
se ela não saiu dali momento algum, não dormiu, não viu
nada? Como?
Pulou em direção a cômoda. Abriu a primeira gaveta. Encontrou.
Uma boneca de porcelana antiga que pertencera a sua irmã. Ficou olhando
detidamente para a boneca, sabia que era de sua irmã, mas como ele conseguiu
por as mãos na boneca. Um pregador chinês disse certa ocasião
que os objetos são sombras que a realidade se encontra no mundo espiritual,
que o que temos e tocamos não são a realidade, a realidade é
o espírito. Sombras demonstram um conteúdo, algo reflete a luz
por ser alguma coisa, assim, aquela boneca remeteu a mente dela para um passado
distante, tão distante que demorou em se estabelecer. Uma imensa sombra
a cobriu fazendo com que chorasse, imagens foram passando pela sua visão
como em uma tela. Pai, mãe, irmã, família todos eram uma
peça em um jogo que se desenrolava de maneira a fazer com que se sentisse
culpada, mas ela não era culpada, não queria fazer aquilo, não
foi culpa dela, por que a condenaram. Sentou na cama e ficou por algum tempo
chorando e meditando, fazia tanto tempo que não via aquele brinquedo
que não sabia se sentia alegria ou tristeza. Não sabia o que fazer
com os seus sentimentos.
- Não foi culpa minha, não foi, não queria fazer aquilo,
foi ela que decidiu. Não fizemos o planejado, ela que queria entrar naquela
casa eu não queria ir, ela me forçou. Oh! Meu Deus quando vão
me perdoar, eu não queria aquilo.
Sentimentos são como água que quando arrebentam os diques feitos
por uma sociedade hipócrita e machista arrastam tudo que esta diante
de si, foi isto que aconteceu com ela, às lágrimas deram lugar
a uma grande choradeira que durou por muito tempo. O som do choro foi à
única coisa que fez companhia àquela menina, pois o sol já
tinha sido substituído totalmente por uma lua cheia que de brilhante
que era só refletia algo que ela estava se esquecendo no momento: o tempo
não pára!
Os olhos estavam abertos, não conseguia pegar no sono, as luzes não
eram apagadas nunca, já imaginava isto, o silêncio era sepulcral.
A imagem na janela era como um quadro em que a pintura enjoa as vistas. Nada
muda. Muda nada!
Abre os olhos. Está nua em cima da cama! Totalmente sem uma peça
de roupa. Fica espantada, tenta entender o que houve. Coloca a mão sobre
o seu sexo, limpo. Em seu cabelo, úmido. Os lençóis, trocado.
O que ele fez? Levanta a procura das suas roupas, com uma mão protege
o sexo, com a outra os seios. Vai de um canto ao outro do quarto, não
encontra nada. A cômoda tenta todas as gavetas até que chega a
última, lá está o pijama com as figuras infantis. Pega-o
rapidamente e coloca com mais rapidez ainda de maneira que fica tropeçando
em seus próprios pés. Cai uma vez, levanta, vai de novo na tentativa
de coloca a roupa. Pensa que ele pode esta observando, em algum lugar. Vestes-se
cai ao chão com um choro abafado, fica ali em frente à cômoda
como um guerreiro derrotado. Ouve um barulho. Olha. Mais um bilhete. Vai engatinhando
para pegá-lo, abre-o, lê, está escrito: Você é
deliciosa!
Tem um rompante de fúria, levanta e começa a esmurrar a porta,
grita, xinga, fala, amaldiçoa. A porta continua intacta. Para por um
momento, exausta, fica com a cabeça encostada na porta. Ouve. No inicio
bem baixa, até que vai aumentando. Ouve uma sonora e grande gargalhada.
Vinda como se fosse do mais profundo abismo como o prelúdio de uma ampla
cascata de desprezo. Sentiu o desejo imenso de exterminar uma vida, que por
sinal não era a sua.
Sentada diante do espelho, fica a admirar a sua imagem refletida, os dias já
estão passando de maneira que não consegue mais saber quanto tempo
se encontra presa. Um dia, para ela, parece um dia mais o sol artificial como
a lua já desceu e subiu tantas vezes que não sabe se já
se passou um dia ou uma semana. Como saber? Mais nada aconteceu depois daquele
incidente, nada que ela possa ter notado. Começa a sentir o corpo fraco,
não sabe se é por causa dos dias sem comer, ou por que não
tem mais animo para continuar a procurar uma saída. Ouve alguma coisa.
No inicio baixo quase inaudível, mas depois foi subindo e alcançando
os seus ouvidos, como o balido de ovelhas alcançou os do profeta Samuel,
uma musica que foi invadindo todo o aposento. Reconheceu! O Trenzinho Caipira
de Villa Lobos!
Não demorou em perceber o envelope que foi jogado, como em um ritual
em que todos fazem a mesma coisa para que nenhum Deus, ou homem possam ficar
furiosos, ela se esgueirou para apanhá-lo abrindo-o e lendo mais um bilhete:
DANCE! Amassou e jogou fora. Foi para o lugar de onde tinha saído. Novo
envelope. Mesma rotina. Abre. Escrito: DANCE! Faz a mesma coisa com o novo bilhete.
Volta para o lugar. Novo bilhete jogado. Rotina, escrito: DANCE OU ENTÃO...
Faz a mesma coisa com esse bilhete. Volta para o lugar de antes. Bilhete sem
envelope jogado. Acha estranho que a rotina tenha sido quebrada. Levanta, ressabiada,
pega o bilhete e lê: DANCE OU ENTÃO EU FAÇO TUDO DE NOVO!
Grita, xinga, esperneia e tenta de todas as formas abrir e esmurrar a porta.
Cede! Vai para o meio do quarto e começa um movimento sem ritmo e vida,
tentando seguir o mover da musica, vai de um lado e do outro, como uma marionete
que tem seus fios ligados em dedos sem amor à arte, seus braços
vão para um lado, suas pernas para outro, em cada canto que vai, nota-se
a falta de vontade, de força. Novo bilhete sem envelope. Pegá-o
e lê: DANCE DE VERDADE!
Respira fundo, vai para o centro do cômodo, e vai como o mover das águas
indo de um lado para o outro, com o ritmo da musica, como se fosse em um bale
em que as damas que encenam uma peça do Teatro Municipal têm a
grande chance de mostrarem os seus dotes, ela vai sendo levada pela melodia
de tal maneira que todo o ambiente é um grande cenário para sua
apresentação, por um momento ela se esquece das tribulações,
dificuldades, maldades e atropelos da vida e se deixa levar pelo ritmo e pelas
passadas de uma arte em desuso. Esquece-se de tudo, simplesmente se esquece.
A musica vai se esvaindo da mesma forma que começou, com o som diminuindo
de tal maneira que com o tempo há única coisa que existe é
o silêncio. Nada mais que o silêncio.
O tempo passa de maneira insólita, como se a ocasião não
fosse gerida por Cronos, mas por um usurpador que deitem as chaves de um cofre
em que a vida humana é simplesmente um detalhe. Sentada em sua cama ela
tenta entender o por que de tudo acontecer de maneira que a faz duvidar da própria
vida, da própria essência. Olha para a penteadeira, vê uns
grampos de cabelos, imagina uma saída para aquele pesadelo, nunca tentou
antes mas não seria tão difícil assim, se arrastou até
lá, pegou os grampos, encurvou uma das pontas de um enfiou os dois na
fechadura da porta, tinha visto muitos filmes e já tinha lido livros
onde era explicada a forma de fazer tal coisa, com o grampo encurvado pressionava
para baixo e com o outro para cima de maneira a fazer a fechadura girar. Tentou
uma, duas, três, vezes até que começou a achar que não
tinha jeito para isto, quando as nuvens do desanimo já começavam
a encobrir o sol da esperança um som, clak! A fez lançar um grito
de alegria, a porta estava aberta!
Calmamente foi abrindo, com receio que ele estivesse do outro lado, mas qualquer
coisa era melhor que ficar ali naquela morte gradual. A saída foi se
abrindo como as água do mar vermelho para o povo de Israel, para revelar
não a liberdade, mas sim uma parede de tijolos vermelhos. Ficou estupefata,
deveras estupefata, de tal maneira que não acreditou em quanto não
tocou na parede, bateu, socou, mas era a mais pura realidade, a parede estava
ali impenetrável e totalmente feita para deter qualquer coisa e qualquer
um! Jogou-se ao chão sem força, e ficou ali sem ainda acreditar
direito no que via, não tinha ouvido nenhum som, nenhum barulho, nada
que demonstrasse que estivesse trabalhando, nada! No inicio foi baixo, até
que se tornou mais alto cada vez mais alto, de maneira grotesca uma risada foi
se alastrando por todo o aposento, fria, rítmica, como de um demônio
que tinha feito mais uma vitima entre os neófitos, entre os sãos.
Como uma chuva de verão que vem com todo ímpeto e intensidade
a risada veio e invadiu mente, vontade e emoção dela. Sentiu vontade
novamente de exterminar uma vida, que por sinal não era a dela!
A escrivaninha era simples daquelas que se encontra em qualquer lugar, a cadeira
era de madeira de lei, bem polida, as gavetas eram sem nenhum tipo de atração,
eram gavetas e nada mais. Estava sentada diante dela escrevendo uma carta, o
papel creme com os caracteres pretos feito com cuidado, com uma caneta bico
de pena, para que ficasse registrado os últimos momentos daquela que
tinha tomado a decisão, finalmente uma decisão. As forças
já estavam se esvaindo como um fluir ininterrupto dos mananciais que
formam as fontes que dão em ribeiros que correm para o mar, e o mar nunca
se enche. Já não suportava a cena que sempre se repetia das luas
e sois que iam e viam naquele mesmo cenário. Não sabia quanto
tempo já tinha se passado, um, dois, três, quatro, quantos dias
sem água e nem comida, com a luz sempre acesa e com a expectativa que
ele entrasse e fizesse tudo de novo com ela. Seus nervos já tinham sido
esticados ao extremo, já não suportava mais!
Começou a notar um aroma, foi tomando todo o aposento, invadindo lentamente
suas narinas e chegando até o seu cérebro, tocando em lembranças
que se encontravam adormecidas. Sua mãe! Era o perfume que ela usava
quando tinha algum encontro especial, só mais tarde que ela veio a descobrir
o que significava os encontros ditos especiais que a mãe fazia sem o
conhecimento do pai. Era leve, como uma pena, mas marcante como uma palavra
dita no ouvido por uma voz roca e querida. Ficava no ar como as preces dos amantes
de um deus que deseja o prazer a qualquer custo. Lágrimas brotaram dos
seus olhos, de maneira tão natural que não sentiu quando o papel
já se encontrava molhado pela grande quantidade que saiam de seus olhos,
não tentou detê-las, deixou que elas seguissem seu curso. Baixou
a cabeça entre os braços e chorou compulsivamente como se fosse
uma menina que tinha sido pega em fragrante fazendo alguma coisa de errado.
Mais um envelope atirado por debaixo da porta, ela já não achava
mais nada estranho naquele lugar. Correu para ela, tentou abri-la, mas estava
trancada. Forçou com a pouca força que tinha, mas nada aconteceu.
Desistiu. Pegou o envelope, abriu, leu, lançou a cabeça para trás
em demonstração que não acreditava ou não aceitava
o que tinha lido, jogou-o no chão, foi novamente para a escrivaninha,
sentou, chorou mais ainda. No chão o bilhete só dizia: ela está
morta!
Olhava a paisagem pintada como se estivesse sendo hipnotizada por um prestidigitador,
fitava um ponto na pintura tentando entender o que estava acontecendo. Quem
poderia está fazendo aquilo com ela? Quem? Seu pai, sua irmã,
seu irmão todos mortos. Sua mãe pelo que sabia tinha se juntado
a eles. Como poderia alguém ter voltado da morte para condená-la!
Como! Quanto mais ela tentava compreender as coisas mais ela chegava à
conclusão de que as coisas não poderiam estar acontecendo. Era
tudo irreal, o quarto, a porta, como ele entrava e colocava as coisas sem ela
vê e nem notar, como se fosse um espírito, vagando entre uma dimensão
e outra. Na primeira vez ele tentou entrar em sua mente, desfazer as coisas
que ela aprendeu, desconstrui-la, fazer com que chegasse a beira da loucura,
foi nesse exato momento em que ela viu que tinha pouco tempo para fazer alguma
coisa, e fez. Encontrou uma saída. Venceu. Porem agora ela não
via nenhuma saída daquele pesadelo, só uma e foi esta que ela
decidiu seguir. Ela não ficaria a mercê de uma pessoa louca que
lhe tirava a vida em gotas homeopáticas. De repente ela notou algo que
não tinha observado antes, uma tênue linha, bem pequena quase invisível,
no horizonte da pintura entre as montanhas. Quatro linhas que divisavam uma
porta era uma abertura, só podia ser uma passagem, tinha que ser um caminho!
Investigou a janela, de ponta a ponta, mas nada. Foi ver os vidros notou que
não eram tão fortes assim, se tivesse alguma coisa com que quebrá-los
podia sair livre, mesmo que viesse a se machucar na tentativa era a única
coisa a ser feita, tinha que sair daquela prisão, ou morrer tentando!
Vasculhou todo o cômodo, seus olhos caíram na cama, de metal armado,
era uma boa forma de fazer algum tipo de coisa para quebrar os vidros, juntando
o resto de força que tinha nos músculos, investiu contra o leito,
quebrando-a de cima em baixo, desmontando-a totalmente. Parte por parte foi
caindo no chão, e quanto mais ela fazia isto, mas ela sentia as forças
voltarem junto com a esperança em uma fuga com êxito.
Blak! Clak! Blak! Clak! Não se importava com os sons que fazia para
ela a única forma de sair daquela situação era esta e iria
até o fim custe o que custar! Blaft! Clak! O som dos vidros quebrando
foram como uma deixa para que ela usasse toda a força que ainda dispunha
nos membros. Mas a janela não se partiu, os vidros estavam quebrados
no chão como despojos de guerra, entretanto a janela continuava firme
em seu propósito de não permitir a saída da mulher. Jogou
o ferro no chão, seus olhos estavam desfigurados, sua respiração
rápida, suas mãos cerradas, imagens passaram em sua cabeça,
com uma velocidade incrível, as humilhações, a fome, o
medo, o pavor de não saber o que viria depois, qual o próximo
ato, arrebentou de suas entranhas um grito tão forte que parecia um brado
de guerra de um guerreiro africano em busca de sua liberdade. Andou por todo
o quarto como se tivesse possuída, olhou a escrivaninha e se arremessou
contra ela, a arrastou e com um força que não se sabe de onde
tirou, avançou contra a janela usado o móvel como um aríete
e... blaf! A janela se partiu! Caiu como as muralhas de Jerico permitindo a
fuga da jovem. Quando ela tombou do outro lado não conseguiu acreditar
direito que tinha conseguido, foi em busca do que tinha visto antes. Encontrou,
as linhas. De fato era uma saída! Enfiou as unhas por entre as frestas
em com um pouco de força conseguiu abrir, sentiu uma emoção
como se tivesse encontrado um oásis em pleno deserto. Entrou pela abertura
e notou que estava escuro do outro lado, demorou um tempo para se acostumar
com a falta de luz. Viu que estava em um lugar parecido com uma casa de maquinas,
tudo a sua volta era de ferro, os tubos, as escadas, o corrimão, as passagens,
tudo.
Foi se aprofundando naquele labirinto de tal maneira que já não
sabia onde estava, parecia que estava andando em círculos, para todo
o lugar que se virava parecia que já tinha estado lá, quanto mais
andava mais ela via que as coisas não mudavam. Foi quando começou
a ouvir passos. Alguém a estava seguindo! Como um rato que tenta fugir
do gato que a caça tenazmente, ela foi de um lado para o outro na tentativa
de despistar o seu algoz. Mas, os passos a seguiam como se fosse uma sombra,
cada vez mais próximo, cada vez mais perto. Juntou os últimos
resquícios de coragem e se posicionou em um canto aguardando o advento
daquele que a tinha torturado por tanto tempo, queria ver seu rosto, olhar dentro
de seus olhos, queria saber que era ele! Os passos foram se aproximando, cada
vez mais, um passo de cada vez, como o batimento cardíaco, o som deles
foram indo em direção à mulher que encolhida em um canto
se preparava para o seu Apocalipse.
Os passos pararam, o silencio imperou, a única coisa que se ouvia era
o som da respiração dela que coincidia com a dele, se de fato
era ele, uma sombra foi se projetando finalmente ela saberia quem era o seu
carrasco. Apareceu, seu rosto não escondia o seu susto, não poderia
ser, não ele, não poderia ser. Conseguiu reconhecer mesmo desfigurado
conseguiu reconhecer, mas não podia ser ele, não podia. Levantou
foi se afastando, o choque foi tanto que ela não podia ficar ali, tinha
que dizer que foi um acidente, não queria ter feito aquilo, não
queria. Esbarrou em alguma coisa, quando se virou viu diante de si o rosto de
uma pessoa que ela nunca imaginaria que ainda estaria viva, não ela!
Da mesma forma que ele estava desfigurada, contudo ela sabia que era ela. Estavam
todos ali, juntos para infernizá-la, julgá-la, condená-la,
e o que mais?
- Não, por favor, eu não queria fazer isto eu não queria,
foi um acidente foi um acidente, eu não queria fazer tal coisa, foi um
acidente, vocês não fizeram o que combinamos não fizeram!
Tentei ajudar corri para trazer ajuda, foi o que tentei fazer mas ninguém
acreditou em mim, ninguém. Por favor, não façam isto, eu
não quero que façam isto, por favor, não façam isto!
Gritava com os olhos em lágrimas, tentado de todas as formas persuadir
as figuras que se encontravam diante dela.
O som que se ouviu depois foi de um liquido sendo jogado e depois de um som
de palito de fósforo sendo riscado, e, em seguida, um grito que percorreu
todo aquele lugar, as escadas de ferro, os tubos, os cantos mais lucubres e
escuros, chegando até o quarto oval. Frio! Já disseram que a vingança
é um prato que tem que ser servido frio!