Professor Rogério era um homem sério. Estudara muito, lera os
grandes clássicos literários e em suas aulas dava interpretações
e incorporava personagens numa verdadeira performance teatral. Para toda e qualquer
situação, o professor dava um exemplo de um escritor e do fato
em questão dentro da obra. Eu não o conhecia, até o feito
ocorrido que nos aproximou. Eu sempre fui um homem ignorante nessas coisas de
literatura, achava até que fosse coisa de afeminado, de viado mesmo.
Entretanto aprendi durante o decorrer do tempo que a vida dá voltas.
É um eterno retorno. Na verdade sempre fui rude, não me lembro
de qualquer oportunidade que fizesse melhorar meu intelecto, pelo contrário,
sempre estive às voltas com o inadequado, com o indecente e até
com a marginália. Durante alguns anos da minha vida, principalmente na
adolescência, fumei e vendi maconha, ficava sentado em cima de uma árvore,
na rua perto onde morava com minha mãe, esperando os viciados filhinhos
de papai. Calma, não se assuste é só para ter uma ideia
por onde eu andei. Não sou tão mal assim hoje em dia. Professor
Rogério passou a morar na nossa rua a cerca de quatro ou cinco anos.
Como já disse, era muito sério e de poucas palavras. No entanto
era uma serenidade sem ser sisuda, tinha uma expressão plácida
no rosto. Acho que o professor não parava de pensar. Não sei porque
me chamou a atenção aquele homem, um dia flagrei-me observando
tudo o que ele fazia. Estava aposentado e sentia um vazio imenso na alma, parecia
que a vida havia me atropelado, faltava algo que não sei explicar, contudo
aquele homem iria saciar minha sede desconhecida e eu morreria feliz. Finalmente
eu participaria de algo significativo, mesmo que fosse para dar prazer a outro.
Nossa rua ficava num bairro central de Salvador, nas imediações
de Brotas. Era uma encruzilhada muito perigosa tanto para motoristas como para
pedestres. Havia numa das esquinas da encruzilhada uma padaria que era também
um bar. A cerveja saía estupidamente gelada e ali se sentavam alguns
ilustres do bairro. A maioria velhos iguais a mim, outros poucos jovens e alguns
profissionais que trabalhavam naquele pedaço. O guarda de transito, o
vendedor de gás, varredores de rua e camelôs ambulantes. Quando
passei a observá-lo, já havia duas ou três semanas que o
professor Rogério alojava-se na mesa do lado de fora do estabelecimento
sempre com as vistas voltadas para uma das ruas da encruzilhada. Sentava-se
e sorvia tranquilamente sua cerveja, sempre sério e pensativo. A
minha aposentadoria não dava para muita coisa, recebia pouco mais que
um salário. Entretanto minha mãe havia deixado duas casas de aluguel
e era como eu salvava minha pele do mundo cruel e globalizado que nada entendo.
Portanto de posse dessa ninharia, fazia sempre a mesma coisa. Jogava na loteria
esportiva que de vez em quando tirava uma pontinha. Bebia café e fumava
cigarro. E o resto do dia sentava em uma das mesas vazias da padaria e jogava
conversa fora. Tive muitas mulheres, morei com seis delas e tive um filho com
cada uma com que morei. Tive também muitas amantes, fui um homem que
chamou a atenção das mulheres, nunca precisei fazer muito esforço
para tê-las. Na verdade eu conversava mentindo e elas gostavam. Falava
de amor sem acreditar nele, as mulheres gostam disso, são muito românticas
e gostam dessa baboseira de poesia, palavras bonitas. Engraçado sempre
tive essa nuance linguística naturalmente e nunca dei valor. Não
gostava dessa tal de literatura. Mas de mulher definitivamente eu entendo. Pena
que elas são todas problemáticas. Todos os dias o assunto era
o mesmo com seu Antonio: futebol, novela e nossas conquistas amorosas. Voltando
ao professor, de vez em quando notava que gesticulava e falava consigo próprio.
De repente parava e desandava a falar sozinho. Foi assim que soube que ele era
professor de literatura e escritor. Seu Antonio o conhecia e confessou-me, cevando
por instantes minha curiosidade a respeito daquele homem. Às vezes quando
chegava em casa à noite para assistir a novela, intrigava comigo mesmo.
Que diabos aquele homem tinha haver comigo para olhá-lo e observá-lo
durante todas as tardes? Entretanto a resposta estava a caminho.
Angustiado com tamanho imã energético, acordei numa manhã
disposto a encontrar o professor Rogério e conhece-lo. No fim de tarde,
como todos os dias, lá estava a cerveja na mesa e ele refestelado na
cadeira com os olhos fechados. Parecia dormir, mas...
- "Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que eu penso do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso".
- (???)
- (risos) Fernando Pessoa, ou melhor, Alberto Caeiro em "O Guardador de
Rebanhos...".
Balancei a cabeça cordialmente. Um pouco assustado, descrente e sem nada
entender. Contudo ele prosseguiu.
- Por que as coisas da vida tendem a ser difíceis, caro amigo?
Ainda assustado respondi.
- Sinceramente não sei, se há uma pessoa no mundo que não
entende nada da vida sou eu...
De repente percebi os olhos do professor Rogério crescerem e brilharem.
- Pois eu entendo tudo da vida e vou lhe explicar...
Tive vontade de sair correndo, mas uma força me segurou ali. Também
não ficaria bem um velho como eu levantar de uma cadeira em um bar e
sair correndo pela rua gritando que o cara era maluco. O maluco passaria a ser
eu. Resolvi ficar e ouvir um pouco mais, provavelmente eu era o primeiro a ouvir
a voz do professor Rogério.
- Escute, o senhor aparenta ser mais velho do que eu, mas não tem problema,
independente da idade, todos não sabem o que vieram fazer no mundo...
O senhor, por exemplo, sabe?
Ainda meio confuso e agora um pouco amedrontado respondi balançando a
cabeça negativamente.
- Pois é, esse é o segredo da vida.
Falou isso secamente e depois parou, cruzou os braços e retomou sua elucubração
egoísta. Entretanto não me dei por satisfeito, quem ele pensava
que era? Começa a dizer umas palavras que tirou de um tal Fernando Caeiro
e ainda me faz de idiota, falando que não sei quem sou.
- E por acaso o "mestre" sabe o que veio fazer no mundo?
- Sei.
- Então me diga.
- Não vejo motivo para dizer ao senhor qual a minha missão no
mundo...
- Claro que há motivo (pausa indignada)... O senhor começa falando
umas palavras aí de um tal Alberto Pessoa e depois me diz que ninguém
sabe quem é quem ou quem é o que...
- Fernando Pessoa é Alberto Caeiro, meu caro senhor, o maior escritor
da Língua portuguesa...
Senti um despeito tomando minha alma por dentro. Ele estava ali todo altivo,
todo prosa, só porque sabia quem era o tal do Fernando... Alberto...
Fernando... Pessoa. Contive-me pois já estava com raiva dele e de mim
mesmo, mas a minha curiosidade em torno dele continuava.
- ...claro que sei quem sou e o que estou fazendo aqui... Tenho a missão
de levar conhecimento aos asininos...
- Aos burros, o senhor quer dizer...
- Muito bem! Vejo que conhece a semântica... Pois o que eu disse é
que a dúvida que corrói todo o ser humano é mais comum
do que se pensa...
- Como assim?
- Já lhe disse... Ninguém sabe realmente qual o real sentido da
vida e o que faz aqui...
- Eu acho que o sentido da vida é vivê-la de acordo a sua condição,
pelo menos é o que Deus quer...
- Deus? Quem é Deus?
- É o manda-chuva daqui... Sabe muito mais do que o senhor.
Fiquei surpreso com a minha resposta, não era, nem nunca fui religioso.
Mas naquele momento senti uma força estranha rondando nosso espaço
e participando da nossa conversa.
- Ora, meu caro senhor, toma-me como uma gente simples que inventa entidades
para justificar as coisas... Não, não senhor... Pergunto-lhe novamente,
quem é Deus? O que ele faz? Onde ele mora?...(Risos) Certa vez, um cidadão
chamado Cebes disse algo que impressionou muito a Sócrates e que Platão
escreveu, ele disse: "... o que não me parece certo é que
os deuses cuidem dos homens e que os homens sejam posse dos deuses...",
então? O que achas, senhor?
Como estava surpreso com aquela multidão de palavras que se aglomerava
entre nós, fiquei um pouco perdido e não consegui responder de
imediato ao professor. Ele riu e apresentou-se. Disse que tinha gostado de mim
e que conversaríamos em outra oportunidade. Virou o copo goela abaixo,
arrotou e antes de ir embora, mandou que eu fosse à biblioteca ver Fernando
Pessoa. Naquele dia uma agonia renitente tomou conta de mim. Nunca havia sentido
aquela ebulição que me assaltava borbulhante. Nunca pensei em
conversar essas coisas com ninguém. O sentido da vida? O que eu estou
fazendo aqui? Agora já velho essas coisas aparecem. De qualquer forma,
gostei. O professor despertou isso em mim. E o tal do Fernando Pessoa?
No dia seguinte acordei com as cargas faiscando. Levantei mais cedo do que de
costume. Tomei um cafezinho, acendi o cigarro e rumei para a biblioteca. Procurei
e achei uma antologia poética do tal Fernando Pessoa. Era a primeira
vez em que eu abria um livro literário. Para mim literatura continuava
sendo coisa de viado. Mas ao fazer a leitura, senti uma coisa diferente. Entendi
e percebi o despeito que havia sentido do professor em dado momento da nossa
conversa. Gostei do tal Fernando Pessoa. Entreti-me a ler. Fiquei sabendo que
o tal do Fernando se dividia em quatro, pelo menos. Achei esquisito, mas me
lembrei de uma mulher que tive. Ela costumava dizer que se virava em quatro,
cinco para me agradar. A Rita Reiwolf. Isso mesmo, uma homenagem a uma das divas
do cinema, entretanto me parece que a mãe dela exagerou no nome. Passei
todo o dia na biblioteca, apesar de enferrujado com a idade, não havia
perdido o prazer em conhecer coisas diferente. Por instantes entristeci, quanto
tempo joguei fora da minha vida. Naquele mesmo dia li toda a antologia e fiquei
tinindo para o professor. Até decorei alguns versos. Contudo quando cheguei
na padaria ele não apareceu. Fiz o mesmo no outro dia e nada do professor
Rogério. No entanto, lá estava ele sentado em sua mesa do canto
no terceiro dia. Eis que me aproximei.
- Aprendi que Fernando Pessoa são quatro...
- É verdade, quatro diferentes em um só...
- Às vezes a gente se sente assim...
- Dá uma sensação de multiplicidade...São os sentimentos
que afloram...
- Como assim?
- Ora, às vezes o senhor sente raiva ou ódio daquela pessoa, deseja-lhe
que um caminhão passe por cima dela, entretanto mais tarde ao se lembrar
do seu desejo de outrora o senhor se desconhece "Meu Deus! Que coisa feia
desejar aquilo para aquele homem"... Eu acho que é assim...
- Sem dúvida... É assim mesmo... Tive uma mulher que desejei dar
cabo dela, era muito encrenqueira, também era muito jovem e não
conhecia as mulheres... Hoje eu sei que todas são assim...
- Encrenqueiras?
- Sim.
O professor me olhou com um olhar perdido no espaço. Depois como se voltasse
de um pensamento longínquo, olhou-me envergonhado de soslaio que não
entendi direito. Isso deveria ter me chamado à atenção
de imediato, talvez se fosse outra pessoa. Algum outro aposentado que ficava
comigo jogando conversa fora, eu teria notado. Seu Antonio, por exemplo. Uma
vez seo Antonio ficou muito bravo com um taxista que fazia ponto em frente à
padaria. O velho ficou mudo e enfumaçado, eu logo percebi e perguntei
o que havia de errado. Ele me contou que deu vontade de dar um murro no tal
taxista. Eu insisti. Resultado; o tal disse para ele e para quem estava na padaria
ouvir que ele, seu Antonio, estava saindo mais cedo porque ia lavar as calçolas
da mulher. Isso não é coisa que se diga a um velho daquele. Portanto
logo percebi o desconforto no velho Antonio. Mas no professor não. Ele
ficou meio pensativo, mas nada que eu pudesse supor. Eu também estava
entusiasmado com a literatura e Fernando Pessoa que deitei falação
sobre o português poeta. Nada como a própria vida para nos dar
uma lição. Nunca imaginei que eu fosse sentar num bar para discutir
literatura. Boiolagem que nada. A literatura é um refresco para a alma.
E ali estava o professor a me passar informações. Só que
num dado momento, propositalmente e com muita astúcia do professor, a
conversa pegou novo atalho.
- Há um outro poeta que também me fascina...
- Quem é?
- Vinícius de Moraes.
- Aaah, esse eu conheço! É muito bom, o cara era romântico,
teve muita mulher, parece comigo...
- Pois é, os poemas de amor são fantásticos...Mas às
vezes dá dor de cotovelo...
- Dor de cotovelo? Não, nada disso, aquelas músicas do Vinícius
são para ser ouvidas com uma mulher ao lado só isso...
- Então...
- Então, o que?
- E quem não tem mulher... Ou tem e não tem ao mesmo tempo...Ou
que tem a mulher que passa do outro lado da rua e deseja-a, esperando-a passar
todos os dias...
- Tem razão, eu já fui assim, mas hoje as mulheres são
tão fáceis... Até eu nessa idade,aposentado se quiser consigo
um mulherão...
- Pagando.
- Não... Tem um monte de mulher carente aí, professor, da mesma
forma que o número de cafajeste e de boiola aumentaram...
- Mesmo? O senhor está esquecendo de uma classe que não é
nem cafajeste nem... Nem boiola, como o senhor diz.
- Ah é? E qual é?
- Os tímidos e sensíveis.
- Sensíveis?
Conversamos sobre mulher até a padaria fechar. Naquele dia senti o professor
mais poético e pensativo do que de costume. Achei que estava apaixonado,
entretanto nada me disse, nem me falou sobre a suposta criatura apaixonante.
Fui para casa e voltei a ler Alberto Caeiro e seu "Guardador de Rebanhos".
Ao longo da minha vida lia somente as páginas policial, de esportes e
falecimentos do jornal. De repente lembrei-me de Vinícius de Moraes e
"Um grande amor". Lembrei-me do rosto lívido e do olhar perdido
do professor Rogério, algo de estranho havia acontecido que não
tinha me dado conta. E resolvi observar. Contudo soube no outro dia que o professor
postava-se às seis e meia da manhã em ponto, todos os dias na
mesma mesa do canto com o olhar duro e fixo para o fim da rua. Ficava inquieto,
muxoxando e olhando o relógio.
Como sou o autor, tenho direito de meter o bedelho na história. Não
presunçosamente, mas para clarear e o fato tornar-se límpido a
você, caro leitor. Também não estou menosprezando a capacidade
do senhor leitor em interpretar, entretanto gostaria somente de dar uma dica.
A relação faustiana do professor e do aposentado foi tornando-se
uma válvula de escape aos dois. Não que o professor tivesse feito
pacto demoníaco, ou que o aposentado fosse o diabo a quatro. Contudo
Mefistófeles na pele do aposentado agia intuitivamente exarcebando o
raciocínio lógico e sincrônico ao mesmo tempo em que saboreava
o prazer de emocionar-se com o rebanho de Caeiro. Já o Fausto contido
no professor Rogério, enfastiado e enfadado da algaravia acadêmica,
ressurgiria da sua razão pensativa e experimentaria a sensação
emotiva do prazer mundano. Uma verdadeira enantiodromia. Um pouco arrevesado,
entretanto são opostos que se identificaram completando-se um ao outro.
O rio corre para o mar como o homem corre para os braços da mulher amada.
O amor é um sentimento nobre, porém igual a todos os outros. Confuso
e claudicante.
Dois ou três meses se passaram e continuamos nossa conversa intelectual
eu e o professor Rogério. Tentei várias vezes acordar cedo e ir
espioná-lo as seis e meia da manhã. Mas na minha idade o corpo
reclama cama e o mais cedo que consegui levantar foi às sete e quinze.
Corri desesperadamente, mas quando cheguei lá os rapazes que trabalham
na padaria me disseram que ele já havia ido. Um deles, o menino que corta
o queijo, que também tira dúvidas escolares com o professor, foi
quem me alertou para esse pormenor. Combinamos de nós dois ficarmos de
olho, contudo eu não conseguia acordar e ele, atarantado pelo movimento
da manhã na padaria, não poderia ficar somente espreitando a vida
do professor. Mas eu gostaria de que ficasse registrado nesse meu fim de vida
que esse meu encontro com o professor estava resgatando meu intelecto perdido.
Sentia-me como seu velho pupilo, ou pupilo velho, como queiram. Era inacreditável
que com uma simples leitura de um escritor tão profundo, fizesse com
que a porta da minha percepção se abrisse e aquele frisson que
me consumia fosse tão prazeroso como uma gozada em uma vagina desejada.
Em poucos dias o professor me enlevou a uma catarse que certamente mesmo depois
de morto eu não esqueceria.
Percebi que estava trilhando o mesmo caminho do professor numa manhã
despretensiosa como todas da minha vida. Estava com seu Antonio e outros aposentados
a conversar sobre as jogadas de Didi, o folha seca, de Zizinho que não
foi melhor do que Pelé, como dizem, e do próprio rei, quando de
repente surgiu a dona Sônia. Como já disse sempre tive excelentes
relacionamentos com a mulherada. Mentindo, conversando, fazendo-as rir, galante
e brejeiro. Dona Sônia era uma estupidez de mulher, torneada, morena,
cabelos castanhos, tipo channel e um olhar arrebatador. Tinha as carnes duras,
seios redondos e duros, com o bico grosso e arrebitado. Por instantes lembrei-me
de quando era viril, agora não sou mais. No entanto, enquanto ela se
aproximava meu coração acelerava, minha saliva secou e comecei
a engolir em seco. Como iria satisfazer aquela mulher de mil talheres? Se eu
montasse era capaz de morrer em cima dela, mas a minha presunção
arrefeceu quando ela dirigiu-se a mim e me chamou com aquela voz de travesseiro.
- O senhor estará com o professor hoje?
Digo-lhes com a pureza da alma, minha perna tremia e meu coração
disparou, pensei que teria um AVC. A mulher era espetacularmente linda, nunca
havia reparado tão de perto como naquela manhã despretensiosa.
Não sei o que respondi, lembro-me que ela riu, um pouco assustada e foi
embora. Demorei uns cinco minutos para aterrisar. Sim, porque ela não
falava com ninguém, todos a olhavam, soltavam piadas, mas ela seguia
seu caminho e não dava trela. Subitamente ela dirigi-se a mim e solta
aquela voz sussurrante, hipnotizadora, melíflua e untuosa. Sorri e vai
embora. Fiquei realmente extasiado e minha virilidade deu sinais de restabelecimento.
Com uma ansiedade e uma angústia terrível, esperei toda à
tarde pelo professor Rogério. Agora sabia o motivo daqueles olhos marejados
há alguns dias quando conversávamos sobre mulheres. Mas ele não
me disse nada, perguntou diversas vezes como eu fazia para se aproximar de uma
mulher que eu não conhecia, que eu via passar na rua. Então era
isso, ou melhor, era a dona Sônia. O danado sabe escolher. Entretanto
uma vez ele me falou de Shakespeare, esse eu conheço, ou melhor, ouço
sempre falarem dele. Falou de Romeu e Julieta, do amor proibido dos dois jovens,
mas isso não tem nada haver com o professor Rogério e a dona Sônia.
Pelo que eu saiba Romeu e Julieta não chegaram às vias de fato
sexual por causa das famílias inimigas. Professor Rogério e dona
Sônia, pelo que eu sei, malmente se conhecem, aliás, ela deixou
perceber uma queda pelo docente. Bem, coloquei na cabeça que iria aproximar
os dois. Quando já estava quase desistindo de esperar o professor, eis
que ele chega meio esbaforido.
- Onde andaste, homem? Estou aqui desde cedo te esperando...
- O senhor não tem o que fazer não?
- Não, não tenho nada o que fazer, sou aposentado e fico aqui
todos os dias, o dia todo a espionar a vida alheia... Mas que azedume para um
cidadão que lhe traz boas novas...
- Boas novas? Que boas novas?
- A dona Sônia, seu sonho de consumo sexual...
Não esperava a reação do professor. O homem ficou vermelho,
arregalou os olhos e começou uma suadeira dos diabos.
- Quem?
- Ora quem! A dona Sônia...Ela perguntou por você...
Ele me olhou descrente e soltou.
- É mentira!
- Como mentira? Todos viram quando ela deliciosamente dirigiu-se ao nosso grupo
e perguntou por você... Eu pensei que ia ter um troço, aquela mulher
é demais, pensei que ela estava me dando trela, gostoso como sempre fui...
Achei que era comigo que ela... Sei lá...
- E o que você disse a ela sobre mim?
- Nem sei... Quase tive um troço, é verdade, ela de perto parece
ser mais bonita ainda, uma deusa...
Novamente percebi os olhos marejados do professor Rogério, dessa vez
não deixei passar e perguntei-lhe de açoite.
- O que há professor? Toda vez que falamos de mulheres, ou melhor, de
dona Sônia precisamente, o senhor muda de uma forma para outra diversas
vezes... Primeiro os seus olhos brilham, como se estivesse enxergando um baú
de tesouro, a felicidade dos deuses... E depois, logo em seguida seu rosto adquiri
uma forma triste, magoada, não dá para entender...
- Nada, nada, nada de importante... É que eu tenho muitas lembranças,
muitas cenas veem à minha cabeça, às vezes estou
escrevendo um texto novo, uma crônica e as cenas aparecem do nada e eu
mesmo me emociono...
- É assim que os escritores são? Não parece...
- Por que não parece? Todo escritor tem que se emocionar e guardar aquele
momento, fotografar aquilo pelo qual ele viu ou passou para depois escrever...
- Não parece, professor... Outro dia assisti na televisão a entrevista
de um cabra desse aí...
- Então...?
- O cara era muito metido, parecia que só ele sabia das coisas... Eu
sei, aliás, estou aprendendo com o senhor que os escritores tem infinitos
pontos de vista, sobre um mesmo assunto, mas eu acho que não é
necessário aquele ar pedante que vi na televisão...
- O senhor tem razão, alguns tem essa necessidade de tornar-se mito,
não sei pra que...
- Mas então me diga, o que houve com o seu pensamento quando falei que
dona Sônia perguntou pelo senhor?
Sinceramente amigo às vezes eu mesmo me desconheço falando assim.
Acho que a intelectualidade do professor é contagiosa. Nunca soube que
tivesse esse vocabulário todo. Contudo ele não se abriu definitivamente,
senti, entretanto que isso seria questão de tempo. Pois ele mesmo estava
sufocado, algo o angustiava seriamente, além do fato de ter aquele monumento
feminino às suas barbas.
- Nada que o senhor possa resolver, a vida ao mesmo tempo em que é generosa
e sedutora, é também misteriosa, complicada e cruel...
- O que isso tem haver com a mulherada, professor?
- Nada, nada em especial, as mulheres são seres humanos também
e dessa forma pensam diferentes como cada um de nós...
- O senhor me perdoe, mas lhe direi uma coisa que vi e aprendi durante sete
décadas de existência...(Pausa reflexiva e riso irônico)
Toda mulher é igual professor, algumas mais, outras menos, mas todas,
todas elas são problemáticas, nervosas ao extremo e algumas são
altamente escandalosas...(Pausa e um balanço de cabeça negativo)...
Portanto não sei se vale a pena lhe dizer isso, mas, não fique
devorando dona Sônia apenas no olhar ou no pensamento, chegue junto com
pegada, ela vai gostar, toda mulher gosta...
O professor me olhou pensativo, em instantes seus olhos começaram a brilhar
novamente, esboçou um leve sorriso e me abraçou. Pediu uma cerveja
para ele e um refrigerante para mim e fez questão de brindar comigo.
Desculpou-se do azedume que lhe acompanhava, encheu-se de coragem e me contou
uma história escabrosa.
- Meu velho, meu velho... Nos conhecemos há uns poucos meses e me parece
que toda a sua experiência passou para mim... Sou muito grato com as palavras
que o senhor dispensa...
- Mas o professor aqui é o senhor, e sou eu que tenho aprendido... Para
mim, antes de conhecê-lo, literatura era coisa de mulher e de viado...
O professor riu e continuou.
- Pois se não fosse a literatura na minha vida eu estava perdido...(Pausa
reflexiva e suspiro magoado, seguido de um muxoxo) Vou lhe contar uma breve
história... Hoje eu tenho quarenta e seis anos, sou um homem bem sucedido
na minha profissão, sou requisitado pelos grandes faculdades de Letras
do estado, ensino nas quatro maiores, sou só um pouco frustrado porque
não consegui ainda lançar um livro, gostaria de tornar-me escritor...
Mas é muito difícil e demorado... Para ser escritor o indivíduo
tem que se ocupar somente de ler e escrever, além de observar é
claro, então entre uma coisa e outra, optei pelo retorno financeiro imediato...
Mas há vinte e sete anos eu não era assim, claro que não...
Era um adolescente em meu segundo ano de faculdade, estudando Letras... Comecei
então a dar aulas com turmas de quinta série a oitava num colégio
religioso que apesar de ser dirigido por padres, só estudavam meninas,
achei estranho aquilo... Minha mãe conseguiu esse emprego para mim, ela
era beata devota, falou com o padre da paróquia e lá estava eu
dando aulas num convento feminino... Então tive as mesmas alunas durante
sete anos seguidos, os quatro anos de quinta a oitava e mais três do segundo
grau... Quando essa turma chegou ao primeiro ano do segundo grau, resolvi fazer
leituras mais clássicas, já que fora eu mesmo quem preparara as
meninas e sabia do potencial literário de cada uma delas... Comecei então
com Shakespeare, lemos a comédia "Muito barulho por nada" e
três tragédias "Otelo", "Hamlet" e "Romeu
e Julieta..." Fiz isso para despertar propositalmente o pensamento crítico
e para desnudar o olhar cerimonioso que os religiosos da escola submetiam as
meninas em relação à vida no geral... As leituras de Shakespeare
foram aprovadas pelos padres e isso me entusiasmou muito... Contudo não
me dei conta de que estava indo muito além, as respostas não poderiam
ser melhores do que as que estava obtendo e, note o senhor a minha falta de
maturidade e o paradoxo ao qual eu mesmo criei, sem perceber o verdadeiro olhar
de cada uma delas, continuei fazendo leituras que os padres consideravam abomináveis
para os bons costumes e a falsa moral... Em seguida li com as meninas "O
nome da Rosa", um romance que aborda que nem sempre o demônio é
descrente de Deus, aí começaram os problemas, quando estávamos
quase no fim do livro dois padres souberam dessa leitura e me repreenderam,
mas consegui terminar a leitura com a cumplicidade das meninas, lemos toda a
obra de Machado de Assis e deveria ter parado por aí...Mas junto com
as duas últimas leituras, toda a emoção das meninas começou
a emergir e me deparei com um fato que não consegui administrar nem resolver
pela minha pouca idade e imaturidade... Comecei a ter um relacionamento com
uma das alunas, me apaixonei de verdade, ela era muito, mas muito linda e delicada...
Não contava que poderia haver outras paixões encubadas, na época
não me passava pela cabeça que aluna se apaixona fácil
por professor e não diz, não revela... Resultado mais da metade
da sala estava apaixonada por mim. Duas meninas chegaram ao extremo quando souberam
do meu relacionamento com a qual eu estava apaixonado e começaram a fazer
chantagem, foi uma fase terrível, me vi totalmente encurralado... Mas
aconteceu uma coisa absurda e inusitada, somente em filmes, romances ou em contos
ocorrem coisas desse tipo.
- Mas o que houve homem de Deus?
- Nós, eu e a garota que namorava, estávamos tendo uma derradeira
conversa num espécie de porão da escola, poucas pessoas ou quase
nenhuma ia até ali, só algum criado quando cumpria ordens de algum
padre...Eu tentava me afastar, os boatos estavam cada vez mais próximos
aos padres diretores, algumas meninas estavam revoltadas comigo por se sentirem
rejeitadas e com ela, a garota, por se sentirem traídas... Tentava dissuadi-la,
pelo menos naquele momento, para garantir meu emprego e até minha carreira...
Queria que ela entendesse, mas o senhor sabe como é cabeça de
adolescente, é uma teimosia renitente e ela não aceitava... De
repente num dado momento flagramos e fomos flagrados...
- Mas o que houve, homem? O que houve?
- Lá estavam, dois padres e uma menina amordaçada... Eles estavam
bolinando a menina que já estava nua da cintura para baixo... Eu e minha
garota ficamos estarrecidos e os padres quando nos viram, transformaram-se em
verdadeiros demônios, começaram a recitar um dialeto estranho e
em seguida me colocaram para fora junto com a minha namorada, aquilo me deixou
angustiado e fiquei pensando na garota que estava sendo abusada, em seguida
aconteceu o que nunca pude imaginar...(reflexão e lágrimas nos
olhos).
- O que foi homem? O que foi homem?
- Cerca de dois ou três dias depois fui demitido e tive que prestar depoimento
com um delegado que apareceu no convento... Fui acusado de estupro pelas duas
meninas, a minha namorada e a garota que estava com os padres pedófilos...
- Isso é um absurdo, isso é uma estupidez... Ta vendo? Ta vendo?
Sempre disse que padre não vale nada, sempre disse que padre não
vale nada...
- Me acusaram de corromper toda a turma com o romance "O crime do padre
Amaro"... Até hoje não entendi...Aliás, entendi, soube
que as famílias, tanto a da minha namorada e a da outra garota tinham
"rabo preso" com os padres, problemas com a justiça, a minha
namorada estudava de bolsa naquele colégio, os pais trabalhavam para
os padres dentro do colégio e a outra garota, pela minha suspeita já
havia sido vendida àqueles dois padres, ouvi uma conversa que os pais
dessa garota haviam sumido, vítimas da ditadura, e ela, coitada, estava
sozinha no mundo...
- Mais ninguém soube disso? Os jornais, a televisão...
- Que nada, estávamos na década de setenta, alta ditadura, havia
alguns padres que colaboravam com os militares e tudo era abafado... O senhor
deve saber disso muito bem, até melhor do que eu...
- É verdade... Mas, mas e o que tudo isso tem haver com dona Sônia?
- Porque era ela a minha namorada... Eu não sabia que ela era filha da
moça da recepção e do rapaz que fazia serviços gerais,
acho que foi obrigada a testemunhar contra mim...
- Naturalmente, professor, naturalmente... Mas que história horripilante!
E agora? Ela está de novo no seu caminho...
- Eu não gostaria de tê-la reencontrado, levei esses anos todos
trabalhando isso na minha cabeça, fui perseguido durante todo aquele
tempo covarde, pensava muito nela, fiquei revoltado e furioso até descobri
o que houvera realmente, isso só aconteceu depois de quinze anos, até
pouco tempo chorava todas as noites e só me conformei aos poucos... Só
vim ter outra mulher depois que descobri tudo e mesmo assim com problemas de
ereção...
Toda aquela mixórdia me provocou ânsia de vomito. Se já
não via com bons olhos todo esse povo que prega a religiosidade, julgando
e dando penitências encobertos na palavra de Deus, agora eu estava realmente
muito revoltado. Lembrei-me de que certa vez conversávamos sobre qualquer
coisa de hipocrisia, não sei ao certo qual era o tema. Mas o professor
disse-me algo de um tal Dante Alighieri. Esse italiano entendia de inferno como
ninguém e segundo ele os hipócritas são condenados a vestir
umas túnicas de chumbo dourado, carregarão esse fardo pelas suas
palavras doces que tentam esconder a vilania da mentira. Todos eles deveriam
ser penalizados pelo rei Minos, lá no segundo ciclo do inferno, os condenados
da carne.
No dia seguinte esperava agora por dona Sônia, teria que saber algo dela.
O que ela queria com o professor, na verdade não acreditava que quisesse
voltar a magoá-lo. Tinha a impressão de que os dois ainda se gostavam
e precisavam de um empurrãozinho. Era o mínimo que deveria fazer
por um amigo que em tão pouco tempo fez meu pensamento, até então
adormecido, emergir e me conscientizar, me situar na vida através da
literatura. Quando me lembro do tempo que perdi envergonho-me. E ela despontava
no fim da rua, linda, maravilhosa e perfumada. Deixei que se aproximasse mais
para abordar. Ela me olhava de um jeito estranho, desconfiado. Esbocei um sorriso
e percebi que a tensão quebrara-se...
- A senhora me perguntou pelo professor ontem...
Ainda meio sem jeito e desconfiada, respondeu.
- Perguntei...Vejo ele sempre com o senhor... Mesmo ele se escondendo, eu sei
que ele vem me ver todos os dias... Decidi falar com ele.
- Só falar, dona Sônia?
- Sim, só falar, deveria fazer algo mais?
- Essa é uma pergunta que a senhora deve fazer para a senhora mesma...
- Talvez devesse sentar e conversar...
- Só isso?
- Só...
- Dona Sônia o tempo não se guarda, uma vez ele me contou uma história
de um retrato... Um homem que guardava seu envelhecimento num retrato, não
aceitava o tempo e suas cicatrizes... Contudo teve um fim trágico...
Felizmente isso é só uma história de um escritor, uma história
que ensina a nos aceitar de forma mais fácil... Pode parecer estranho,
mas só estou falando nisso porque não gostaria que toda a sua
graça se esvaísse quando viesse a ter o professor novamente...
Já disse que certas frases que falo desde que conheço e converso
com o professor me espantam, não sei de onde tiro um vocabulário
tão rico. Mas depois que eu falei isso ela entregou os pontos...
- Mas que atrevido o senhor é...
- Não senhora...
- Andou conversando com ele... Ele contou tudo (muito aborrecida e envergonhada)...
Contou, não contou?
- Só contou depois de muita insistência minha...
- Pois saiba o senhor e ele que eu, que eu (chorando amiúde, lamuriando-se)
que eu... Que eu ainda amo ele muito, sabia, amo muito sabia?
Pronto tudo resolvido, nada sobrevive no caminho do verdadeiro amor. Digo isso,
apesar de ter amado várias mulheres, mas nunca senti aquele frisson bombeando
o coração como sentem os verdadeiros amantes. Combinei com dona
Sônia que promoveria o reencontro dos dois. Não sei como eu persuadiria
o professor, mas sentia que naquele momento eu fui designado pelos deuses e
orixás para ser Hermes, ou Exu, e trazer até aquele casal o Deus
Eros. Quando mais novo aprendi a convencer os outros garotos da minha idade
a fazer o que era interessante para mim, possuía uma retórica
poderosa e só fiz uso para futilidades. Tinha agora a chance de provar
a mim mesmo que continuava bom de prosa e o que é mais interessante,
estava munido de boas informações que o próprio professor
me dera. Pedi dois dias a dona Sônia, prometi a ela que levaria o professor
para uma pizzaria que havia ali perto. Era bem discreta e não ficariam
expostos como na padaria em que o professor e eu costumávamos a ficar.
Comecei a pensar como levar o professor até lá. De súbito
lembrei-me de uma coisa que o professor havia me falado há tempos. Na
época eu não fazia ideia de que a pessoa que ele tanto
falava era dona Sônia e fui à pizzaria combinar com o dono o que
fazer. E, como combinado, dois dias depois eu convenci o professor de ir até
a pizzaria comigo.
- Mas o que o senhor quer que eu vá fazer na pizzaria? Nem de pizza eu
gosto...
- Vamos lá... Eu estava conversando com o dono e ele me disse uma coisa
que o senhor vai gostar de ouvir...
- O que eu vou gostar de ouvir? Não, não vou... Quero tomar minha
cerveja em paz... O senhor não é mole viu... Em alguns meses fez
me emocionar como há muito não sentia...
- Ora deixe de rabugice, homem, até parece que quem tem setenta anos
aqui é você... Deixe de conversa e me acompanhe...
- Só vou se me disser o que é...
- Está bem... O dono daquela pizzaria também é fã
de Vinícius de Moraes, tem todos os cd's. É isso, só queria
fazer uma surpresa...
- Odeio surpresas!
- Vamos, você mata a saudade daquela pessoa, ouvindo "Para viver
um grande amor", não era essa música que vocês ouviam
e o senhor recitava para ela?
- Era sim, era essa música e outra chamada "Eu sei que vou te amar".
De alguma forma, produzindo esse reencontro eu senti que essa era a minha missão
na vida. Não sei dizer ao certo, ou ser prático, mas tinha certeza
que fui ao mundo só para unir duas pessoas que sempre se amaram e foram
separadas pela estupidez do ser humano. Foi a cena mais emocionante que presenciei
em toda a minha existência. A dona Sônia estava mais do que linda,
estava deslumbrante e só apareceu na sala principal da pizzaria quando
Vinícius de Moraes recitava apaixonadamente "Eu sei que vou te amar".
O professor Rogério não segurou as lágrimas e correu desesperado
para os braços da amada. Hoje, daqui do céu, eu pude lhes contar
essa história. Sou muito feliz, trabalho no departamento das curas de
amor, é uma sala no mesmo corredor do escritório de Santo Antonio...