Quinta Beto jogou no macaco - milhar, centena e grupo. Deu camelo. Sexta repetiu
o palpite e duplicou as chances no burro. Camelo de novo.
Sábado quase meio-dia. Calor deveras. Mulheres lindas de poucos trajes
permeavam o centro do Rio em busca de mar. Beto bicava uma cerveja e planejava
o samba na laje ao poente, no que Resende apareceu:
- Fala tu. - de açoite.
- Qual é, fiel? Senta aí.
Abraço, copo e brinde. Lero:
- Zé da banca tá descarregando tudo que tem dois três grudados.
Soprou que depois de dois camelos vem a dupla de três metida no meio.
- Opa. Pera lá! Se geral sabe a letra, já era.
- Nada. Só eu. Foi à miúda. Outra: o lance é levar
adiante, mudando prá seis. Três, seis. - rodando polegar e indicador
- Entendeu? - agora polegar ereto - E pede boca de siri pro otário. Assim
a pilantragem tem assunto e se distrai. Vou carcar cem mangos. E tu?
- Formou. Vou dobrar!
- Mais uma, Jão. E duas mineiras douradas...
Veio então um cearense de pouca altura e extrema lábia. Atendente
de botequim e proliferador de boatos. Repôs a cerveja e despejou-lhes
dois martelos de cachaça velha. Salinas, Minas Gerais. Beto repassou
a barbada ao nordestino.
Brindaram e entornaram. Não antes de inspirado o aroma de carvalho.
- Ah, toda mineira merece uma praia... - declarou Beto.
- Bela definição. - concordou o sócio.
Cinco minutos de silêncio e Beto rompeu - com pancada na mesa e sorriso
de todos os dentes. Um clarão na negritude:
- Três, três, dois na pedra! Vão meter camelo de novo. É
por aí que eu vou. Metade da grana nessa e cercamos o resto... macaco,
burro e cachorro...
- Vamos juntos. Pega também cobra, trinta e três. Mais urso. -
dois segundos - Vaca e leão.
- Chega! Tive uma visão. Três, três, dois. Zero, três,
três, dois. - e começou a batucar.
- Domingo, eu vou ao Maracanã, vou torcer pro time que eu sou fã...
- ambos.
Percorreram a tarde nas bancas. Um pela Lapa, mais Catete e Glória.
Outro: Bairro de Fátima, Catumbi e Rio Vermelho. Um pouco em cada ponto.
Cerveja entre eles, prá não pingar no verão tórrido.
Seis horas encontraram-se no Zé - que só não comia as unhas
porque já as esgotara, então circulava e fumava sem parar. Como
vai, tudo bem e sumiram dali. Pernaram até a Cinelândia prá
saber ao natural. Lá sentaram prá receber o sereno.
- Duas tulipas e minduim. - ordenou Resende.
- Caraca, mermão. Hoje a laje vai tremer. Vai ter picanha e doze anos
com energético. - comentou Beto ao comparsa.
- Deus te ouça. Mas antes vamos marcar dez no Bola Preta. A gafieira
é sagrada.
- Perfeito.
Enquanto eram servidos, Resende tornou a abordar o garçom:
- Chega mais, simpatia. Providencia duas cachaças, daquelas amarelinhas,
de Minas. E assim que souber, traz o poste prá gente.
Concordância gestual de ambos.
Engoliram as pingas como de costume e discutiram o tira-gosto, definido no torresmo.
Já havia ansiedade e nos vinte minutos seguintes só falaram em
gastar dinheiro. Beto foi quem iniciou, com reforma no bangalô, cordões,
sapato branco, camisas de seda, perfume gringo, vestido prá mãe
e pernoite em motel com a loura dele. Resende foi além: viagem pro Recife,
carro usado, documento falso e cocaína. Fumaram e falaram coisas sem
sentido.
Daí chegou a anunciação. Um moleque que trocava cinzeiros
trouxe-lhes a resposta: zero, três, três, dois. Na cabeça.
Deu camelo no poste, pela terceira vez.
- Mais pinga! A garrafa. - bradou Resende.
- E charutos! Tem charutos? - Beto.
- Mulheres, mulheres... - às gargalhadas.
- Muitas.
Batucada. Caixa de fósforos.
- Bebeto subiu o morro gritando: ´fiz treze´, mandando a miséria
prá casa do chapéu... - dueto.
Na milhar, fizeram mais de cento e cincoenta mil. O resto não durou uma
semana, mas rendeu-lhes novos amigos, novas roupagens e muito prazer.
O Morro da Providência agradeceu. Os dois que nada prometiam, estabeleceram
uma panificadora e colocaram os seus a trabalhar. Logo outra, ficando uma prá
cada mãe.
E dispuseram-se a biscates, jogando no Zé e a beber no Jão.