A Garganta da Serpente

Camila Moura

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Vampiros

(Camila Moura)

Mais uma vez o manto negro da noite tinge céu da cidade como uma sombra viva. Suga as cores das ruas até que elas se tornem apenas manchas, tons esmaecidos. Lentamente transforma os contornos dos telhados em muros, dissolvidos num caos de linhas imprecisas... Traz a indagação, o silêncio, a suspeita. Da vida aos mais secretos desejos humanos e também às criaturas da noite...

Muitos já estão dormindo, outros se divertem, e alguns, apenas alguns estão sentindo o terror, pânico. Fugindo de algo que não sabem se é perigoso, real, ou só ilusão... O ultimo raio de sol foi engolido pelas sombras. A noite esfria... neblina nas vielas, pessoas estranhas passam por mim, as luzes irritam meus olhos, os faróis altos... me atormentam;

Andando sozinho na rua, parei em uma praça escura e deserta, sentei-me num banco para aguardar algo que não sabia o que era, nem se viria. No meio da praça havia uma igreja, velha e estranha. Parecia abandonada e estava com a porta entreaberta. Curioso, fui até as escadas que davam acesso à porta.Tentei ver algo dentro dela mas estava tudo escuro...apenas algumas velas que não eram suficientes, iluminavam o lugar. Subi mais alguns degraus e mesmo assim nada vi. Só pude sentir que o local estava quente e abafado. Uma variedade de cheiros... odores e fragrâncias desconhecidos. O medo me dominou e não me deixou entrar, então, atordoado com a energia daquele lugar, virei-me para ir embora e ao olhar para traz, as poucas velas tinham se apagado. Isso me deixou mais confuso ainda. Continuei andando e achei melhor pensar que tinha sido o vento.

Caminhando solitário percebi uma pessoa caminhando à minha frente, do outro lado da rua. Usava um sobretudo negro e por isso não pude distinguir se era homem e mulher. Parei um minuto para ascender um cigarro e quando levantei o rosto a pessoa tinha desaparecido. Continuei andando, sem rumo, sem destino.

Parei num bar pra tomar um café (aquela noite estava gélida), tomei rápido e sai. As luzes, o barulho dos bêbados...tudo estava me irritando, faziam eco em minha cabeça.

As coisas que estavam acontecendo naquela noite estavam me deixando cada vez mais perturbado. Estava ficando tarde e perigoso, mais algumas horas e o sol nasceria. Sendo assim , achei melhor voltar pra casa... eu e minha solidão.

À duas quadras do bar me deparei de frente com aquela pessoa. Agora posso ver seu rosto...e ouvir sua voz.

- Boa noite! (a pessoa me disse)

Respondi: Boa noite. (E agora a vejo mais claramente...)

Era uma garota. Linda. Cabelos negros e cacheados. O rosto estranhamente pálido que se iluminou com a luz da lua descoberta de nuvens e ficou estranhamente belo. Tinha uma personalidade magnética, uma aparência sedutora, agressiva, quase violenta... E um olhar selvagem, imponente de intenso brilho.

Hipnotizado por sua beleza, fiquei lhe observando até que ela me tirou do "transe" e me perguntou:

- O que faz caminhando sozinho à essa hora?

Respondi: - Procuro algo!

Ela me olhou com um ar de mistério e disse:

- Nessa noite tão sombria, você procurando algo e eu querendo fazer alguém feliz!

Não entendi o que ela quis dizer, mais dei continuidade à conversa...

- Numa noite tão fria, ruas desertas, não têm medo que algo possa lhe acontecer?

- Do mesmo jeito que você está aqui, eu estou...

De repente ela se virou e disse:

- Vou lhe dar um voto de misericórdia!

E saiu correndo por uma viela, não pude ficar parado e fui atrás dela... Como não sabia seu nome, corri em silêncio. A viela dava acesso à linha do trem, e no fim dela havia um matagal. Foi ali que ela parou, olhou pra mim com olhos de fogo e disse sorrindo, com seus dentes pontudos e afiados:

- Corra antes que seja tarde!

Nunca tinha visto nada igual, de repente ela se transformou num monstro.

Tentei correr eu estava paralisado de medo. Minhas pernas tinham travado, fiquei com a mente louca, desesperado... querendo correr e escutando sua voz, antes doce e sensual, agora rouca, medonha e cínica me mandando ir embora... dizendo:

- Corra, vá embora...não vou lhe dar a noite toda pra fugir!

Depois disso só me lembro dela pulando em cima de mim, inclinando minha cabeça e mordendo vorazmente meu pescoço.

Agora estou aqui, na mesma praça morrendo de sede e aguardando alguma coisa.

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