Era uma ensolarada tarde de domingo quando resolvi contemplar uma velha, porém
indispensável, caixa, conhecida por ser o meu baú de lembranças.
Corri em direção ao armário onde ela encontrava-se e ao
pegá-la, fugaz, soprei sua tampa completamente revestida por poeira.
Rapidamente abri-a, encontrando nada menos do que o meu primeiro caderno, se
sobrepondo aos outros itens ali presentes. Peguei-o cautelosa, e delicadamente
o abri. Surpreendi-me ao me deparar com um relato das minhas férias de
Janeiro de 2000, narrado por quem vos escreve. Apesar dos inúmeros erros
de escrita e de concordância, dei maior ênfase à uma frase
específica de minha narrativa, na qual afirmava que "eu me sentia
a pessoa mais feliz do mundo, pois aquelas férias foram as melhores de
toda a minha vida".
Como de relance, cenas daquelas e de outras férias de verão passaram
à emergir-se em minha mente. Lembrei-me de quando construía castelos
na areia, e instantaneamente o mar os desfazia, antes mesmo de terminá-los.
"Eu não desistia de formá-los até o final", pensei.
Recordei-me também dos meus finais de semana, nos quais eu seguia uma
rotina imutável. Todo domingo - ensolarado como o que eu presenciava
no exato momento - andava de bicicleta acompanhada de meu pai, enquanto ele
descrevia histórias de sua infância. Costumávamos também
ir sempre à biblioteca para alugar livros clássicos de Monteiro
Lobato, como por exemplo, "Emília no País da Gramática",
"Reinações de Narizinho", "Caçadas de Pedrinho",
entre vários outros que ao chegar em casa, minha mãe sempre me
ajudara à ler. "Agora posso entender essa paixão veemente
pela leitura", pensei sentindo-me agradecida à minha família
por terem me mostrado desde criança o caminho para a felicidade - os
livros.
Como em um ato aparentemente lógico, abri os olhos, e só assim
pude voltar à minha verdadeira realidade: Ali estava eu, aos 14 anos,
ajoelhada sobre o piso de madeira, apoiando-me em uma caixa, e desejando voltar
à 9 anos atrás. Em um estranho movimento, totalmente irracional,
pus-me a chorar. Uma lágrima atingiu em cheio a primeira folha do caderno,
e apertei-o bruscamente sobre meu peito. "Eu ainda sou feliz", pensei.
"Todos nós somos eternas crianças, tendo isso como consequência
por carregarmos sempre um baú de recordações dentro de
nós mesmos".