Acabara de entrar quando percebeu que estava muito escuro. Nenhuma luz, nenhum
indício de ruído, de movimento. Estancou, tentando encontrar uma
explicação. Usava a lógica para buscar uma resposta, qualquer
que fosse. Mas... a lógica não lhe dava uma resposta. Talvez a
emoção, quem sabe? Esta começava a aflorar, pouco a pouco.
Já percebia a respiração mais rápida, uma dúvida
que se manifestava, o rosto pegajoso pelo suor acumulando-se a cada minuto que
ali permanecia. Que ambiente era aquele? Começou a dar alguns passos,
tateando aqui e ali, pareceu esbarrar em uma parede de terra, que chegava até
a sua cintura, tropeçou em algumas pedras e cascalhos e roçou
em umas plantas rasteiras. Foi caminhando bem devagar, e começou a ouvir
o ruído de uma corrente de água que passava não ao seu
lado, mas separada por um obstáculo, talvez um muro ou uma parede.
Tentava se lembrar dos últimos acontecimentos que o haviam conduzido
àquele ambiente e, pouco a pouco, surgiam algumas imagens em sua mente.
Laura, sim, Laura, encontrara-se com ela, não se lembrava exatamente
quando. Loura, olhos claros, com uma blusa listrada e uma calça larga,
de sandálias. Haviam conversado durante um bom tempo sobre diversos assuntos,
a situação econômica do país, os índices negativos,
o aumento no risco-Brasil, de acordo com certas agências estrangeiras.
A proximidade das eleições, a indefinição política,
em quem votar, a grande dúvida! Alguém conseguiria mudar de fato
as condições precárias, econômicas e sociais, em
que viviam? Havia alguma perspectiva? Não chegaram a nenhuma conclusão!...
Depois, elogiou a sua beleza e ela sorriu com uma alegria indisfarçada.
Como ele, também, havia terminado um relacionamento, com o seu coração
um pouco machucado, mas ainda vivo, à espera de novas emoções
e novos sentimentos. Sentiam-se atraídos, mas ainda eram amigos, apenas
amigos.
E depois, lembrava-se que andara por diversas ruas, observando pequenos detalhes
que lhe prendiam a atenção. Muitas pessoas com a camisa da seleção
brasileira, que traziam com orgulho! Afinal, a nossa seleção era
a única no mundo a conquistar o penta-campeonato de futebol! Pelo menos
nisso, havia um motivo para uma notável alegria! Porque, quanto ao "resto",
estávamos em uma situação que, a cada momento, trazia a
todos maiores motivos para uma justificada preocupação. E não
surgia nenhuma solução real, por parte de nenhum político
e de nenhum líder que trouxesse algum tipo de alívio para tantas
angústias, em que todos os cidadãos lúcidos estavam envolvidos!
Agora começava um declive e ele procurava se apoiar nas paredes úmidas,
que agora já alcançavam a sua altura e a ultrapassavam, para descer,
com muito cuidado, até onde? Não fazia a mínima ideia.
Mais a frente, se deparou com um poço negro, do qual não vislumbrava
o fundo, e dali retornou. Sentia que estava agora todo suado, e sentia que a
parede fazia um contorno, e agora caminhava em um terreno mais plano. Não
tinha a menor noção de tempo, minutos, horas?
Percebeu uma fraca luminosidade mais à frente e se encaminhou para lá.
Começou a perceber melhor os contornos das paredes e do teto, era imenso
o espaço, talvez uma gruta virgem ou abandonada. Mas como fora dar com
os costados ali? Não sabia.
Aproximando-se da luz, contornou a parede e se surpreendeu com o que viu! A
luz agora era muito mais intensa (pelo menos para ele, que viera de uma escuridão
abissal)! Custou a se acostumar com o novo ambiente, luminoso.
Após alguns minutos que pareceram horas, começou a divisar uma
imagem imensa, que irradiava luz! Mas não era uma luz artificial, ela
brotava naturalmente, como se viesse de cada poro daquele ser, que estava sentado
em um imenso lótus e que pelo seu rosto, trajes, biotipo, parecia um
monge budista. O local era circular, como se fora cavado há milhares
de anos, e exalava um perfume encantador. Haviam flores viçosas em torno
do ser e ele estava com os olhos fechados, em atitude de profunda meditação.
Ele caminhou com passos lentos, com receio de perturbá-lo e se aproximou
mais. Do ser emanava uma poderosa energia, que ele apenas sentia, mas não
conseguiria descrevê-la nas palavras do seu comum vocabulário.
Eram ondas que o envolviam de tal forma que cada músculo e célula
do seu próprio corpo respondia, à sua maneira. E todo o ambiente
daquele santuário, se é que se podia assim classificá-lo,
estava completamente imbuído daquela força indescritível.
Sentia que deveria se sentar, cruzando as suas pernas, assim como o ser silencioso
à sua frente. E assim fez. Sentou-se, como se uma ordem silenciosa houvesse
emanado daquele ser e, naturalmente, ele a houvesse obedecido. O silêncio
era absoluto. Gradualmente, aquelas energias poderosas foram impregnando todo
o seu corpo, e não apenas o seu corpo físico, mas o seu corpo
etéreo, o seu corpo anímico, o seu corpo emocional, o seu corpo
mental.
Em alguns minutos, perdeu inteiramente a consciência do local em que estava
e de todos aqueles pensamentos confusos que, ainda há pouco, dominavam
a sua mente. Havia apenas uma luz brilhante e inteligente que comungava com
o seu inconsciente, e de lá vinham vindo novas emoções,
novos sentimentos, novos pensamentos. Percebia a vida que havia na escuridão,
pela qual passara há pouco, a vida que havia naquelas paredes e no solo
de terra úmida, e naquela corrente de água que ouvira ainda há
pouco. E como toda essa vida irmanava com a vida que havia em seu próprio
ser, em seus diversos níveis de complexidade. E de como os acontecimentos
do passado se amalgamavam com os do presente, e os do futuro, tudo formando
uma unidade indivisível. Mas que nessa unidade indivisível, cada
componente tinha sua vida própria, sua individualidade, e se expressava
em sua própria língua. E de como era possível comungar
de uma imensa paz que existia em cada um deles e também no todo indivisível.
E de como esse aparente paradoxo, na verdade não era um paradoxo, naquele
nível unitário e completo. Era paradoxo apenas para a mente racional
que, a essa altura, estava bem calada e não dava nenhum palpite. E de
como aquela grande força se renovava a si mesma, a cada instante.
E de como todos aqueles problemas não existiam naquele nível,
nem políticos, nem econômicos, nem de poder ou de status. Pois
ela era imensa, unitária, total, abrangente, profunda e completa em si
mesma. Todos os seus estreitos conceitos foram-se naquele momento, as suas certezas
inabaláveis, os seus desejos confessos e inconfessos, a sua perplexidade
ante os mistérios do ser, do mundo, do universo.
Não havia necessidade de perguntas, pois todas já estavam respondidas
naquela unidade inteira, que o compreendia. Era uno com todo o universo, naquele
momento, e os inúmeros problemas da egoísta humanidade perdiam
completamente o seu significado, pois não pertenciam à unidade
que tudo compreende. Estavam fora, e só continuavam a existir porque
os seres humanos, principalmente, os seus líderes econômicos e
políticos estavam muito distantes da compreensão originária
da unidade completa em si, com a qual ele comungava naquele momento. Cada um
estava perdido na sua própria personalidade, que considerava completa
e perfeita... Quanta ilusão!
E ali ficou, comungando com aquela grande luz, até quando? Nem ele mesmo
sabia.