NOS DIAS DE HOJE, A HUMANIDADE ACREDITA cegamente que os mistérios da
terra já estão, indiscutivelmente, revelados; que essas pequenas
descobertas corriqueiras são apenas pontos mínimos que não
desdobram em nada nosso conhecimento.
Porém, sou testemunha de que muitos mistérios ocultos ainda escondem-se
nos cantos escuros e inacessíveis do nosso planeta.
Doravante, citarei o mar; não os oceanos usados como rota para frotas
navieiras - muito embora o fato extraordinário que presenciei se sucedeu
em uma praia - mas sim, as regiões abissais; as fendas que deslocam-se
fundo nas águas salgadas, longe demais da luz solar, onde a pressão
é insuportável ao corpo humano.
Cito também, que um antigo cientista russo chamado Aleksandr Oparin formulou
uma teoria que, para a época, foi desacreditada, porém, depois
do fato insólito que presenciei, torna-se uma das melhores explicações.
O fato é que Oparin apresentou à ciência, uma teoria chamada
"cosmozoários", onde alguns seres vivos que habitam
nosso planeta seriam oriundos de bactérias vindas do espaço. Uma
vez aqui, proliferaram-se, em harmonia com o clima e as condições
terrestres, e originaram as mais variadas espécies (a meu ver, de características
morfológicas estranhas) habitando os oceanos, visto que eram os lugares
mais propícios a vida na alvorada da pangeia.
No entanto, não quero perder tempo explicando velhas teorias. O leitor,
ao final de meu relato, verá o porque da menção dessa teoria.
Na região litorânea do Rio Grande do Sul - e do Brasil também
- existem várias praias, muitas delas, com forte movimento de turistas
no verão. Particularmente não gosto de praias onde haja fervor
de pessoas, então, quando o sol radiante parecia queimar a pele, optava
por praias mais desertas, onde poucas pessoas desfrutavam de mais tranquilidade.
Eu sempre banhava-me na região em que as dunas eram mais altas, pouco
movimento, onde pequenos grupos reuniam-se para o descanso. O lugar era tranquilo,
a única desavença era o pobre Noé, um velho marinheiro
que enlouquecera depois de anos em cima de um navio e agora andava de um lado
a outro, contando a mesma estória para as pessoas que frequentavam
o lugar.
Noé falava que, quando cruzava os mares com seu navio, falara com alguns
habitantes de uma ilha no meio do atlântico, que diziam vir do mar. Noé
jurava que suas peles eram azuis, que suas faces dispunham apenas de olhos e
algumas cavidades semelhantes a guelras no lugar onde deveria estar o nariz
e a boca. Os ouvintes dividiam-se em três grupos. Os que escorraçavam-no
por acharem tratar-se de um velho louco e ranzinza, que perdia horas contando
estórias fictícias; os que não davam atenção
aos seus relatos; e os mais velhos, que o conheciam desde suas navegações,
e juram que Noé enlouqueceu após voltar de uma viagem, quando
pela primeira vez contou a estória a todos. Esse último grupo
não acreditava nos seus relatos, mas sabiam que um homem lúcido
e confiante não enlouqueceria de vez, e desconfiavam que algo muito grave
aconteceu para que Noé ficasse com a mente abalada.
Os dias de calor transcorriam assim, com banhos tranquilos no mar, tendo
que ouvir as insistentes estórias de Noé sobre os "homens
azuis"; até aquele dia...
Dezenove de janeiro de 1987; a rotina na praia renovada; as pessoas começavam
a chegar por volta das dezessete horas, após saírem de seus respectivos
empregos. O pessoal mais velho - na maioria, aposentados - estranharam o comportamento
do velho Noé naquele dia. Não mais contava suas estórias,
apenas murmurava algo como:
- "meus amigos virão me buscar hoje"...
Um dos veteranos relatou-me que, a certa hora da tarde, Noé falou com
um menino que jogava futebol na areia. O menino ficou olhando-o perplexo até
que sua mãe o surpreendesse e o levasse embora, não antes de escorraçar
verbalmente o pobre velho. Segundo o veterano, o menino não falou o que
ele ouviu do marinheiro, apenas insistia para que sua mãe o levasse embora
dali, agindo estranhamente enquanto olhava, assustado, para o mar. A criança
não descansou enquanto não o levaram.
Noé não mais se aproximou para contar seus causos, ficando sentado,
bem afastado, em uma duna, olhando para o mar...
Naquele dia, a maré estava levemente revolta. As horas passavam, enquanto
as pessoas divertiam-se nas pequenas ondas que chocavam-se nas dunas. Noé,
ainda no seu lugar, na mesma posição, não movia nem um
músculo.
O dia poderia ter sido rotineiro e tranquilo se não fosse os aterradores
fatos que aconteceram nessa hora em diante...
Quando o sol tocou o horizonte, algo extraordinário demais emergiu das
águas; causando pânico e histeria nas pessoas. Tratava-se de uma
curiosa espécie humanóide, com diversas peculiaridades que o tornava
agressivo demais aos olhos humanos. Sua pele reluzia uma tonalidade azul-oceânica,
onde dificilmente distinguia-se onde era pele ou água. Em seus membros
superiores, havia barbatanas semelhantes a dos peixes, que ficavam entre os
dedos da mão e na parte posterior dos braços e antebraços.
Algas brancas e águas-vivas podiam ser vistas sobre o seu corpo, mas
pareciam não causar desconforto, como certamente ocorreria em contato
com pele humana. Uma grande barbatana era visível em suas costas, começando
do lugar onde deveria estar o osso "atlas", e terminando na região
da cintura, percorrendo toda a coluna vertebral. Nos membros inferiores, as
barbatanas destacavam-se nas panturrilhas, deslocando-se até o final
do Tendão de Aquiles. Neste primeiro momento, não pude ver seus
pés, pois ainda estavam submersos. O mais aterrador, sem dúvida,
era a face da criatura. Dois olhos de uma coloração verde luminosa,
ascendiam de complexos e distorcidos músculos orbitais; e uma espécie
de guelras - quatro, para ser mais exato - localizadas no lugar onde deveriam
estar o nariz e a boca. Uma criatura grotesca e repulsiva em todos os sentidos,
exatamente como Noé os descrevia...
Ela balançava-se de um lado para outro, como se procurasse o equilíbrio
para ficar em pé (isso deveria ser pelo fato da criatura estar acostumada
a nadar, e dificilmente locomovia-se em terra firme). O mais estranho porém
foi a atitude do velho Noé, que saiu apressadamente na direção
do monstro e o abraçou, como se fossem irmãos que há muito
não se viam. O monstro retribuiu o gesto, e logo depois apontou com o
dedo na direção do mar, onde algo muito mais desconcertante estava
por emergir...
Com o sol ainda visível, um reflexo quase cegador - como um metal que
reflete uma luz - fazia com que eu tivesse que transpor os braços na
frente dos olhos para evitar a dor.
Alguns segundos se passaram, até que novamente pude olhar. Antes tivesse
saído daquele lugar para não ter de presenciar tal visão
da loucura... Uma nave gigantesca, algo que assemelhava-se ao tamanho de um
estádio de futebol, sobrevoava o horizonte, fazendo com que toneladas
de água se deslocasse de volta ao mar devido a pressão que tamanho
objeto causava ao emergir.
Enquanto aquela aterradora nave - ou, como dizem os estudiosos, OSNI* - dirigia-se
para Noé e a criatura submarina, eu não conseguia mover um músculo,
imobilizado pelo medo perante aquela degradação da realidade.
Mais desconcertante ainda, era a parte inferior da nave. Enquanto a parte superior
projetava metais desconhecidos, escotilhas de materiais estranhos e projeções
que assemelhavam-se a antenas ou canhões, iluminando as nuvens refletindo
os derradeiros raios solares; a parte inferior era composta de matéria
puramente orgânica, parecendo uma imensa cavidade oral, arredondada, onde
dentes pontudos circundavam toda a extremidade da nave. No centro, um gigantesco
"olho" movia-se em várias direções, rapidamente,
na ponta do que sugeria ser uma "língua", como se procurasse
algo.
Quando a nave estava pairando acima de Noé e a criatura submarina, o
"olho" começou a iluminar-se e um raio - algo parecido com
luz fluorescente - atingiu os dois, fazendo com que se deslocassem verticalmente
em sua direção. Em toda a minha alma, um terror inominável
assomava a loucura sugerida. Nesse ínterim, apenas pude urdir que o velho
e o ser submarino foram, na verdade, transportados para dentro da nave através
daquele raio. Segundos depois, a mesma alçou voo rapidamente para
o céu, até parecer-se com uma estrela no firmamento e sumir na
imensidão do universo.
O sol já havia se posto no horizonte, quando voltei de meu estado catatônico.
Ao redor, constatei que não havia mais ninguém e, agora, o medo
de que aquela aberração alienígena voltasse para me abduzir
fez com que eu corresse em direção a comunidade mais próxima.
Não conseguia me conter. Não ousava olhar o mar nem as estrelas.
Obviamente, nunca descobri a origem daquelas aberrações. Poderia
tal fantástica civilização dividir espaço com a
humanidade no planeta, sem que essa última soubesse? Serão eles
hostis? E, em todo o seu ocultismo cósmico, seriam eles oriundos das
bactérias alienígenas sugeridas na teoria dos cosmozoários?
Certamente, é algo que não saberemos jamais, ou até o dia
em que a humanidade acordará do terrível sono "racional"
para descobrir que algo apocalíptico e sobrenatural está coabitando
este planeta.
Não ouso comentar com ninguém. Por hora, apenas permaneço
dentro de casa, procurando não olhar o mar, nem o céu estrelado,
pois o medo constante daquela aterradora visão domina a minha mente,
tornando me prisioneiro dessa terrível lembrança.