A Garganta da Serpente
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O Medo e o Sapo

(Armando Sousa)

Na pujança da juventude quando o homem deseja mostrar sua valentia, também existia o medo não confessado... afinal o medo, e coisas ruins, era a conversa de todos os rapazes da aldeia nas noites amenas do Outono, quando se juntavam depois da ceia, era o único entretenimento nas aldeias dessa época depois da noite chegar, isto se não houvesse uma desfolhada nas redondezas... gostávamos de ajudar; mais pelas mocas e uma pinga de água pé, uma sardinha e naco de pão.

Na época, meio do século 20; todos gostavam de contar sua peripécia e como foi vencido o medo que lhes pôs os cabelos em pé como um (ouriço cacheiro)... a verdade, é que toda a gente, sempre falava de ver fantasmas nos lugares mais desertos e sombrios.

Mulheres que estivessem do parto... isto era nos trinta dias depois do parto, cruzavam umas calcas do marido sobre os ombros para as livrar dos maus-olhados, e dos maus ares da noite...

Enfim; nossa mente era bombardeada com a existência de maus espíritos a todos os instantes... ainda para agravar, para não parecer mal, tínhamos de ir à missa do domingo; e cerca do fim da missa, o padre pedia para rezarmos um pai-nosso para que deus nos livres dos espíritos malignos que andam pelo mundo para perdição das almas... isto agravava e confirmava os medos.

Falava-se de bruxas e bruxedos, de maus olhares e feitiçarias.

Estávamos de cabeça lavada como esses homens bombas, esperando as 75 virgens depois de se arrebentarem...

Eu na verdade pouco acreditava nessas coisas... mas coisas naturais me fizeram estremecer diversas vezes...

Esta que vos vou contar, foi uma das vezes que tive medo.

Namorava com a que hoje é minha esposa, mãe de seis filhos, meu sangue também.

A distância que separava nossas aldeias era grande; não, eu não tinha bicicleta, a pobreza não me dava possibilidades para adquirir uma... caminhava, e o amor pode ultrapassar todas as dificuldades...

Nessa noite cercas das dez horas atravessava quilhas e carreiros o caminho mais perto para casa, mas em cada esquina se falava de ser visto bruxas e espíritos que assombravam; eu assim caminhava entre a dúvida e o medo, apesar de não ser um verdadeiro crente dessas coisas... mas sozinho e de noite dava tempo para pensar em tudo.

Nesse tempo, não havia luz em parte alguma, noite era noite... luar era nosso melhor amigo, mas por vezes combinava com o medo e fazia sombras criadas na nossa mente crescerem descomunalmente, a mente era capaz de ouvir vozes que não existiam, e o medo crescia.

Lá vinha eu por um carreiro de um campo de milho que suas folhas já secas rugiam com a aragem... mas isso era natural não tinha medo.

Estava a desembocar no caminho quando me pareceu ouvir vozes no lavadouro.

Estranhei naquela hora haver alguém a lavar... me aproximava, as vozes diminuíam, cerca de dez metros do lavadouro as vozes se extinguiram...

Atirei a pedra que trazia sempre comigo para a água do lavadouro...

Vi por entre lucernas do luar a água saltar e fiquei aliviado... mais uma vez reconheci que nossa mente e criadora do impossível, das mais complicadas historias de medo ou das maiores fortunas, das mocas mais lindas ou da diabruras dos vizinhos.

Então compreendi, que deveríamos procurar ser verdadeiros como escudo a estas alucinações.

A verdade e que 50 metros a diante sai-me um cão gigante a ladrar ferozmente... eu já não tinha pedra, então procurei na berma do caminho por uma pedra para atirar ao cão... e o que me veio a mão foi uma coisa movediça e mole... era um sapo que principiou a chiar...

Com o medo, atire-o ao cão que lhe acertou em cheio...

Este desapareceu pelo buraco do esgotamento das águas temporais... ganindo.

Então mais aliviado ri sozinho... pensando que ate um sapo serve para arremessar ao medo.

Meus netos hoje não acreditam como os antigos eram tanto ingénuos, e como as religiões viviam dos medos, e os santos eram a maneira dos padres serem riquíssimos e poderosos e suas famílias...

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