Sebastião, mulato cabelos sarará bem enroladinhos, ex-presidiário,
prático de farmácia num hospital de doentes mentais, costumava
comercializar anfetaminas subtraídas de seu local de trabalho. Casado
com Dinalva, servidora no mesmo hospital, morena muito bonita andava de caso
com um seu colega de serviço. Seu marido nem desconfiava, pois saia do
trabalho e ia beber suas pingas pelos botequins locais onde fazia seu comércio
clandestino de pílulas. Tinha porte atlético e podia-se dizer
que era um belo mulato. Tocava violão o que atraía a mulherada
com muita facilidade. Vez por outra se via o casal de braços dados, sempre
sorridentes, demonstrando ser um casal muito feliz.
Tertuliano, amante de Dinalva, era franzino e feio e não se entendia
o que a atraía naquele ser tão raquítico. Dizia-se que
nem mesmo era bem dotado, porém, pelo andar da carruagem, era o que seu
médico lhe havia receitado para seus prazeres.
Certo dia, já no crepúsculo, Sebastião adiantou-se na chegada
ao lar surpreendendo Dinalva e Tertuliano em sua cama na maior das sacanagens.
Acotovelou-se no batente da porta do quarto aguardando o final do coito como
a assistir a um filme pornô. O casal na cama, tão envolvido nos
seus prazeres nem se deu conta de que havia assistência.
Ao término daquele gozo, sem dar tempo ao natural relaxamento quiçá
para um recomeço, Sebastião se mostrou presente empunhando um
revolver cano longo, deixando os apaixonados trêmulos pelo pavor da morte
que provavelmente viria. Completamente nus, apavorados, sem saber o que fazer
ou por onde fugir de vez que a porta estava impedida, os dois aguardavam a reação
do marido traído que lhes apontava a arma de fogo.
Sebastião, com toda frieza esboçando leve sorriso de mofa, manteve-se
em silêncio por alguns minutos. Em seguida, com seu linguajar de farmacêutico,
quebrou aquele silêncio: já tomaram suas doses? O remédio
surtiu o efeito desejado? Gozaram bastante?
Dirigindo a palavra direta e especificamente a Tertuliano disse-lhe:
- como você gozou com o que me pertencia terá que pagar pelo uso
e gozo. Não dou nada de graça pra ninguém. Ninguém
usa o que é meu e sai impunemente. Vai me pagar por isso.
Mais alguns minutos de silêncio. Tertuliano ridiculamente protegia sua
joia mais preciosa com as mãos entrelaçadas abaixo do umbigo
tremendo sem vestes como se estivesse num rigoroso inverno. Dinalva procurava
esconder sua vergonha com um amontoado de lençol à sua frente.
Ambos tremiam diante da presença da morte que com certeza esperavam.
Fosse uma comédia italiana certamente haveria muitas gargalhadas na plateia.
Porém o caso era sério e de se esperar uma grande tragédia.
O marido traído rompe outra vez aquele silêncio de sepulcro:
- meu preço pelo uso é de dez mil em dinheiro vivo. Depois de
pagar terá que levar consigo o material usado, pois não o quero
mais. Pode escolher entre pagar ou morrer...
Tertuliano assinou um cheque ali mesmo.Depois, envergonhado e ainda assustado
deixou a casa com o objeto de seus desejos. Sua bela adúltera!
Com o dinheiro arrecadado, Sebastião fez uma boa reforma na casa e a
decorou do seu gosto. Dias depois passou a residir nela com uma bela loira que
exibia com orgulho dizendo-se satisfeito pela realização de um
ótimo negócio.
Dinalva foi viver com seu amante noutro lugar. Ninguém matou! Ninguém
morreu!
Todos ficaram felizes!...