A Garganta da Serpente
  • aumentar a fonte
  • diminuir a fonte
  • versão para impressão
  • recomende esta página

Sangue

(André Knewitz)

Descendo velozmente pela Avenida Juquiá. Um, dois, quatro, vermelhos, cinzas, passates, fiates, vrum, vrum. O carneiro é pendurado num galho alto, a peixeira do catingueiro desce num corte vertical e tripas sujam de vermelho o sertão. Pedofauna que aflora do asfalto. O cavalo não está mais no meio da sala, mas agora puxa carroça na avenida, causando tanto horror quanto, pois desvia daqui, desvia dali e não se pode coletar papel a uma hora dessas! Que absurdo! Onde estão as leis, a polícia!? E prenderam o assassino da menina enrolada em plástico? Tão bonita, loira, rica (drogada). Foi o anão que dançava em frente à cortina vermelha? Ou foi o cavalo? Não, moço, obrigado, mas que diabos eu vou fazer com tiras grossas de couro de carneiro? Venda para aquele velho careca de boné ali, óó! Depois é só tirar o pelego... Passar sal... E pendurar para secar ao sol. O couro é vendido no sul, madame. E quanto lhe pagam? Uma ninharia. E o senhor tem filhos ? Tive onze, nove vingaram. Mas o que mais me orgulha é o Jair. Meteu a cara, foi pra São Paulo e engrandeceu. Ele dá duro, trabalha com vendas. "Ceará é preso em Perdizes. Traficante fazia alegria dos playboizinhos." (notícia na capa de um tablóide encontrado no chão por Homero, mendigo-local. Homero sabia ler muito bem.). E do que o senhor vive? Farinha com água e a bênção do bom Deus. E o senhor é feliz? (lágrimas). Horas intermináveis amarrado violentamente na cadeira de um gabinete bolorento com suásticas e bandeiras e Hitlers e livros por toda a parte. Os livros de autoria dele caprichosamente empilhados em frente a um espelho onde pôde ler NASIVERT. Então era isso! A Vertente Nazista! Ele é o líder! Possíveis mensagens subliminares em seus textos, a polaquinha como supremacia ariana e o vampiro incitando o derramamento de sangue! Vrum, um, dois, cinco, vrum, apenas escutava o zunido, pois os pequenos quadrados de couro o fazem apenas olhar para frente, Pra Frente Brasil! Nos tapetes furados pelo salto agulha ou nas luvas pretas que seguram as rédeas, há algo de podre no reino das máquinas. Uma tira só... E bem larga eu quero, seu cabeça chata! Vichh... Curitibano Neurastênico! E o buraco aberto na Avenida Juquiá pela NET é para solucionar os problemas do Pay-per-View, já Pay, agora querendo ser View. Pois senão o consumidor vai no Procon, reclama. E a tira se quebra, madame. Suíno fascista, capivara imunda, me tire daqui! Mas equinos não olham Net, nem TV, nem mesmo para os lados. E sem querer cai no buraco. A sala agora jaz vazia e o plástico é inútil. O filme começa, até que enfim! Basta uma faca afiada, peixeira alguém grita. E fósforos. Papelão tem aqui, ó, de monte. Espetos, alguém tem? Um, dois, quatro, vrum, vrum, vermelho, vermelho, vermelho. Insurgente fascista, cronista insulso! Para que essa tira larga? Vai me amordaçar? Socorro, socorro! E a madame sabe o que curitibano faz quando pega a esposa na cama com outro? O que? Nada, curitibano não fala com estranho. Esqueça a pizza, esqueça os vídeos não entregues. Encoste o carro mais pra frente, aí, aí! Bem cuidado! Humm, tá bom o churrasquinho! Mas é carne de quê mesmo?

menu
Lista dos 2201 contos em ordem alfabética por:
Prenome do autor:
Título do conto:

Últimos contos inseridos:
Copyright © 1999-2020 - A Garganta da Serpente
http://www.gargantadaserpente.com.br