A Garganta da Serpente
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O carteiro e o telegrafista

(Hélio Consolaro)

No filme “O Carteiro e o Poeta”, baseado no livro homônimo do escritor chileno Antônio Skármeta, dirigido por Michael Radford, a história se passa numa ilha do Mediterrâneo (Itália). O poeta Pablo Neruda (chileno) se exila nela por razões políticas, e acaba fazendo amizade com o carteiro Mario Ruoppolo, quase analfabeto.

Como o telegrafista era fã de Pablo Neruda, contratou um carteiro especial para levar-lhe as correspondências na sua casa, fora do núcleo urbano. É bom dizer que o funcionário do correio gostava do lado político do poeta, pois ambos eram comunistas. O telegrafista nunca discutia as poesias de Neruda com Mário Ruoppolo no local de trabalho.

E assim, destinatário e carteiro fazem uma grande amizade. Mário Ruoppolo precisava conquistar Beatrice, por isso queria aprender lições de poesia com o poeta. Dessa forma, começou pelas metáforas. Pablo Neruda tenta ajudar o carteiro a conquistar seu amor de verdade, ensinando-lhe poesia.

Numa discussão entre o telegrafista e o carteiro, surge a diferença entre a arte engajada, catequética, que tem como meta principal a transmissão de uma mensagem, e a arte pela arte, cujo escopo é a estética, o encantamento, a poesia.

O carteiro dizia que Pablo Neruda era o poeta das mulheres, do amor. O telegrafista retrucou de pronto: era o poeta do povo, dando-lhe um papel político.

Quando João Cabral escreveu “Morte e Vida Severina”, o texto foi encenado e usado muito em favor da reforma agrária nas décadas de 50 e 60. Indagado sobre isso, o autor afirmou que não era problema dele, como a dizer que não tinha controle sobre sua criatura. Não era esse o objetivo primeiro da obra.

A arte engajada tem prazo de validade, perde a sua universalidade, torna-se muito importante como documento histórico, porque seu autor sacrifica a estética pela ideologia. Jorge Amado, por exemplo, só virou escritor nacional e internacional a partir de “Gabriela, Cravo e Canela”, após se desvincular do Partido Comunista Brasileiro.

Caso queira escrever, caro leitor, não se esqueça de que a beleza de uma obra literária não está no seu conteúdo (esgotável), mas na sua forma (inesgotável), no jeito de trabalhar as palavras e os elementos da narrativa.

Pelo conteúdo, ninguém mais ouviria música brasileira de qualquer gênero, pois os temas se esgotam no número dos dedos das mãos, mas cada um canta de um jeito, compõe sua letra de forma particular. Lembre-se do livro Dom Casmurro, veja o que fez Machado de Assis de um caso de amor de fundo de quintal: um romance encantador.

O Carteiro e o Poeta
Il Postino
Direção: Michael Radford
Duração: 109 minutos
Ano: 2003

O Carteiro e o Poeta
Autor: Antonio Skármeta
Editora Bestbolso
126 páginas
2011



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